Aculturação

O fenômeno da aculturação se dá pelo contato de culturas diferentes e pela adoção mútua de costumes pertencentes à cultura diferente.
O futebol trazido pelos europeus foi absorvido por inúmeras cultuas diferentes *

É fato que todos nós possuímos aspectos de nossa vida que são ancorados na cultura que compartilhamos, em partes, com o meio social em que nos desenvolvemos. A cultura é parte do que somos e responsável por como vemos e entendemos o mundo em que existimos, de modo que interfere como nos apresentamos aos outros indivíduos e como assimilamos a imagem dos demais integrantes de nossa sociedade. Essa cultura que constituímos manifesta-se em nossa aparência, na forma como nos vestimos e até em nossas refeições diárias, na culinária que adotamos como usual. Mas esse aspecto tão amplo de nossas vidas não é estático ou imutável, muito pelo contrário. Nossa cultura está em constante processo de modelagem. Ao adotarmos costumes, valores ou mesmo símbolos diferentes, modificamos, por exemplo, hábitos culturalmente construídos, de modo que os parâmetros culturais que absorvemos de nossa família se alteram tanto no decorrer de nossa convivência social que dificilmente serão exatamente os mesmos que transmitiremos aos nossos filhos.

Esse processo de “modelagem” pela qual nossa cultura passa é resultante do fenômeno da aculturação. A aculturação é o nome dado ao processo de troca entre culturas diferentes a partir de sua convivência, de forma que a cultura de um sofre ou exerce influência sobre a construção cultural do outro.

Esse processo, porém, não deve ser confundido com outros fenômenos da interação entre culturas diferentes, como a assimilação cultural, processo em que um grupo cultural assimila ou adota costumes e hábitos de uma outra cultura em detrimento da sua. Nesse processo, a cultura “original” de um grupo é gradualmente substituída e se perde no decorrer do tempo. Embora possa ser um catalizador para essa assimilação, nem toda adoção de traços culturais diferentes resulta na substituição ou no abandono de outro aspecto cultural.

Como já vimos, a cultura não é imutável, mas o processo de aculturação não é equivalente à mudança cultural, na medida em que a adoção de certas características culturais, como por exemplo a mudança ou a adoção de uma forma diferente de se vestir, não necessariamente implicará no abandono ou na mudança de outro aspecto cultural. Como exemplo peguemos o caso da culinária oriental, que é amplamente apreciada ao redor do mundo, passando a ser consumida por diversos indivíduos de culturas diferentes sem que, no entanto, modifique seus hábitos ou a forma como pensam acerca de um ou outro aspecto de seu mundo.

Aculturação equivale à destruição de outra cultura?

De fato, o processo de aculturação é visto por muitos como responsável pela destruição ou o desgaste de culturas vistas como “originais”. Como a ideia inicial de Franz Boas (1858-1942), um dos mais importantes autores na área de estudos culturais, que pautava o fenômeno da aculturação pelo processo de mudança da cultura original. No entanto, autores como o antropólogo brasileiro Gilberto Freyre, trabalhavam com a ideia de que o processo de aculturação não é unilateral, de forma que as duas estruturas culturais que estão envolvidas no processo estão sujeitas a absorver um ou outro aspecto da cultura diferente de forma mútua, mesmo não sendo um processo simétrico.

Uma das maiores preocupações da antropologia brasileira é justamente a possibilidade da destruição das culturas indígenas que ainda resistem, em certa medida, no país. O processo de aculturação, que de várias maneiras culminou na mudança cultural e na assimilação dessas culturas indígenas, em certos aspectos pode ser visto na mudança da forma como se vestem, na construção de suas casas ou no gradual abandono de suas línguas. Mas a nossa sociedade urbanizada, por outro lado, adotou palavras das línguas indígenas que hoje usamos comumente, ainda mantém costumes culinários como o preparo de pratos como a tapioca e a mandioca, conhecimentos populares sobre medicina natural, como uso de plantas medicinais (a Copaíba e o guaraná são alguns exemplos).

Por esse motivo, a total destruição da cultura de um grupo só ocorreria em situações extremas, como por exemplo na instauração de um regime que priorize o genocídio cultural de uma etnia específica, e em um enorme período de tempo. Em seu processo “natural”, a aculturação se dá nos termos do grupo em questão, de acordo com suas necessidades. Levando em conta ainda que o processo de aculturação se dá de forma mútua, onde as duas partes adotam características culturais uma da outra, de forma que haverá sempre traços de outra cultura em sociedades que a diversidade e o contato entre grupos de culturas diferentes estejam presentes.

Créditos da imagem: sunsinger / Shutterstock.com

Publicado por Lucas de Oliveira Rodrigues
Química
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