Virgens Vestais
Uma das construções arquitetônicas mais antigas da cidade de Roma é a do Atrium Vestae, ou Templo de Vesta, que leva o nome da deusa para a qual foi edificado. Esse templo está localizado na região do Fórum Romano, um dos lugares mais importantes de Roma na Idade Antiga. As sacerdotisas que eram encarregadas de zelar pelo templo de Vesta eram conhecidas como vestais e, em razão do exercício da castidade, convencionou-se denominá-las de virgens vestais.
No Fórum Romano, ainda hoje também se encontram as ruínas de templos dedicados a outros deuses, como o Templo de Saturno e de Vulcano. Além disso, era no Fórum que se reuniam os senadores para deliberarem sobre alguns assuntos relativos à cidade-estado e era lá também que ocorria uma série de espetáculos públicos. Nesse sentido, o Templo de Vesta estava em uma posição singular da cidade, sobretudo por guardar, segundo a tradição mitológica romana, o fogo garantidor da paz de Roma ou a pax romana.
O Templo de Vesta possuía um formato circular. Em seu centro, encontrava-se o fogo, símbolo da deusa. Se a chama desse fogo se extinguisse, isso era considerado sinal de maus augúrios para a cidade de Roma, como pestes, guerras e invasões. A figura das virgens vestais estava diretamente relacionada com esse afastamento da violência por meio do interdito sexual. Em várias sociedades e culturas, o exercício do sacerdócio – principalmente o feminino – estava associado à garantia contra uma crise social. Havia uma forte intuição nas religiões arcaicas de que a atividade sexual era uma das “portas de entrada” da violência na sociedade. Para tanto, o exercício de alguns ritos deveria exigir a privação sexual. Essa tese foi defendida por autores como Walter Burkert e René Girard.
A própria narrativa mitológica que conta a história de Vesta indica essa associação entre a privação sexual e a garantia da paz social. Vesta é a assimilação romana da deusa grega Héstia, assim como Júpiter é a assimilação de Zeus. Em textos como os do poeta Hesíodo, é possível ler que Héstia era uma das deusas filhas do titã Cronos com Reia. Foi a primeira filha a ser devorada pelo pai e a última a ser salva por Zeus, seu irmão, que travou uma luta contra os Titãs.
Conta-se que, após ser salva, Héstia (Vesta) pediu ao irmão Zeus que nunca lhe fosse permitido tirar a virgindade, de modo que, permanecendo virgem, ela não geraria a disputa e a guerra entre os outros deuses para desposá-la. Zeus atendeu ao pedido da irmã e, então, reservou um lugar para ela no centro das cidades e dos lares como forma de agradecimento pela paz entre os deuses. Por isso, a representação de Héstia está associada ao fogo, sobretudo o fogo das lareiras dos lares, que agrega e aquece a todos.
Outra representação especificamente romana de Vesta é o burro ou asno. Essa representação também está associada a uma narrativa mitológica relacionada ao sexo. Na lenda, após uma festividade de Cybele, Vesta descansava no campo e foi avistada pelo deus Príapo, que a confundiu com uma ninfa e tentou conceber uma relação sexual com ela. Vesta foi alertada da presença de Príapo por um burro, conseguindo assim fugir e preservar sua virgindade.
As virgens vestais preservavam em seus rituais essas antigas concepções. Isso podia ser verificado nas festividades realizadas no mês de julho, nas quais ocorria uma seção de cerimônias dedicadas à Vesta, chamada Vestalia, como bem explicita a pesquisadora Luísa Stella Silva:
“As cerimônias festivas relacionadas a deusa Vesta, a Vestalia, começavam desde o dia 9 e iam até o dia 15 de junho e eram dias considerados religiosos. O dia 15 de junho era o dia de limpeza anual do Templo de Vesta, quando stercus delatum fas. A água que limpava o templo vinha de uma fonte especial e esse dia era considerado feriado. Os burros eram enfeitados com guirlandas e grãos eram distribuídos para a formação de uma nova colheita. O Penus Vestae era aberto para as matronas.” [1]
NOTAS:
[1]: SILVA, Luísa Stella de O. C. Mulheres na Roma Antiga: as virgens vestais no Direito Romano. Revista de História do Direito e do Pensamento Político. n. 3, 2012. p. 195.