Integração comercial da África no mercado capitalista
A integração comercial da África com os demais continentes do mundo ampliou-se a partir do século XV, com as grandes navegações portuguesas, que passaram a explorar economicamente a costa do continente. Porém, a partir dos séculos seguintes, a ligação comercial estreitou-se ainda mais com o tráfico internacional de escravos, no comércio triangular que unia África, América e Europa.
Mas as ações pela abolição da escravidão e do tráfico de escravos iriam fazer com que o comércio da Europa com o continente africano iniciasse uma alteração, inserindo-se de forma mais integrada ao modo de produção capitalista que se desenvolvia. Essa alteração iniciou-se principalmente a partir da segunda metade do século XVIII.
O oferecimento de escravos como objeto de luxo era o que garantia o comércio dessas pessoas até o momento em que as lavouras do continente americano passaram a necessitar de um contingente de força de trabalho numeroso e constante. O oferecimento do escravo como objeto de luxo deu lugar à produção do escravo para a venda no comércio triangular, passando os traficantes africanos a procurar cada vez mais no interior do continente pessoas para trabalhar compulsoriamente na América.
De acordo com o sociólogo Immanuel Wallerstein, os escravos passaram de artigo de luxo a artigo de primeira necessidade com a ampliação do tráfico no comércio triangular. O sociólogo afirma ainda que ao passar para o segundo termo, o tráfico de escravos inseriu algumas regiões da África na economia-mundo capitalista (termo que indica uma concepção de sistema econômico, social e espacial integrado, que supera os limites de um dado país), e a produção do escravo passou a ser pensada em decorrência de seus custos.
O que contava nesse momento eram os mecanismos produtivos presentes no modo de produção capitalista, como o tempo de reprodução dos escravos e os gastos para essa reprodução, bem como os benefícios para o sistema capitalista que o trabalho do escravo geraria com seu trabalho, decorrentes também de sua produtividade.
Porém, as demais partes da África somente seriam inseridas à economia-mundo capitalista após o período de 1730-1750, junto a outras regiões do planeta, como a Rússia e a Turquia. Essa inserção estava ligada à exploração agrícola de novas culturas e ao início de uma nova divisão social do trabalho no continente.
No entanto, para que essa inserção fosse possível, foi necessário criar novas estruturas coloniais, principalmente políticas, para que houvesse uma adequação à integração econômica que se iniciava. Isso ocorreu de diversas formas, fazendo com que as organizações políticas tradicionais das tribos e reinos africanos adequassem-se às necessidades econômicas do mercado capitalista.
Ainda de acordo com Wallerstein, houve quatro processos de mudanças na ação de integração do continente africano no sistema capitalista mundial: uma produção de mercadorias de primeira necessidade, uma produção orientada para o mercado, o recrutamento de trabalhadores e novas estruturas de fornecimento de mão de obra e a criação de benefícios aos que dominavam a produção no plano local.
Até o momento da integração no século XVIII, o comércio intercontinental em que estava inserida a África restringia-se ao tráfico de escravos. Porém, após esse século, a situação alterou-se, pois houve a produção de outras mercadorias para serem comercializadas. Novos produtos foram produzidos em regiões que antes não estavam ligadas ao comércio capitalista: no Egito, passou-se a produzir o algodão para as indústrias europeias. Na África Ocidental, o óleo de palma, o amendoim e o látex tornaram-se importantes mercadorias para serem comercializadas.
Esses produtos de primeira necessidade passaram a ter sua produção orientada para o mercado consumidor europeu. Tais produções alteravam a estrutura produtiva nos locais em que ocorriam, já que as estruturas de produção antiga deram lugar a uma divisão do trabalho similar à capitalista, com a crescente especialidade de funções. Estratos sociais mais elevados das sociedades africanas passaram a controlar as ações dessa força de trabalho.
Por outro lado, os europeus passaram ainda a controlar o comércio nos portos, função antes exercida por intermediários africanos. Ao mesmo tempo, o aumento da exportação desses novos produtos foi acompanhado do aumento da importação de mercadorias europeias, principalmente de produtos manufaturados. Essas trocas comerciais tornavam mais fortes os laços que ligavam os continentes europeu e africano.
A exceção nesse caso foi a África Oriental, que se manteve mais afastada da economia-mundo capitalista, sendo que no século XIX ela ainda era fonte de oferecimento de mão de obra escrava.
Nesse sentido, as alterações nas estruturas de organização política interna nos países africanos, posteriores ao século XVIII, foram decorrentes tanto das pressões econômicas externas de integração na economia-mundo quanto pela atuação de agentes internos interessados no desenvolvimento dessas novas relações produtivas e comerciais, quando as estruturas existentes não auxiliavam a execução desses interesses. Estas seriam algumas características da forma com que algumas regiões do continente africano passaram a ter laços comerciais e produtivos com a economia capitalista europeia.