Chica da Silva

Chica da Silva é uma das mulheres mais conhecidas do período em que o Brasil era uma colônia dos portugueses. Filha de um homem branco e uma negra escravizada, Chica da Silva conquistou sua liberdade na idade adulta e tornou-se uma das mulheres mais ricas do Brasil ao relacionar-se com o contratador de diamantes da cidade de Diamantina. Esse relacionamento permitiu Chica ascender socialmente e integrar-se à elite colonial.

Os historiadores analisam a forma como ela foi representada e como uma mulher negra ter ascendido socialmente era um incômodo para as elites brancas do Brasil. Chica da Silva é, acima de tudo, um flagrante caso de como o racismo no Brasil sempre esteve presente nas maneiras mais sutis.

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Origens de Chica da Silva

Chica da Silva foi uma das mulheres negras mais famosas da história do Brasil e foi representada no cinema e na televisão.[1]

O nome real de Chica da Silva era Francisca da Silva de Oliveira e ela era filha de um militar branco chamado Antônio Caetano de Sá e de Maria da Costa, uma africana trazida de Costa da Mina e escrava de Antônio. O nascimento de Chica da Silva aconteceu no Arraial do Milho Verde, onde atualmente fica a cidade de Serro, interior de Minas Gerais. O ano de nascimento de Chica é controverso, mas acredita-se ser entre 1731 e 1735.

Como era comum naquela época, Chica da Silva, foi o fruto de um abuso sexual. No período em que a escravidão existia no Brasil, era bastante comum que escravas fossem abusadas sexualmente por seus senhores. A escritora Ana Miranda alega que, como consequência disso, as escravas que ficavam grávidas, frequentemente, abortavam seus filhos ou então recorriam ao infanticídio por não quererem que seus filhos fossem escravizados.

O destino de Chica da Silva, conforme ela ia crescendo, não foi outro além da escravidão. Seu pai não alforriou sua filha, pelo contrário, já que anos depois a vendeu para um médico, Manuel Pires Sardinha, que residia em Diamantina, na época chamado Arraial do Tijuco.

Manuel Pires abusou de Chica da Silva, ato o que causou a gravidez dela e, meses depois, o nascimento de Simão Pires Sardinha. O filho de Chica não teve o nome do pai em seu registro, mas acabou herdando parte dos bens dele e alguns historiadores afirmam que ele assumiu cargos importantes.

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Ascensão de Chica da Silva

Quando Chica tinha aproximadamente 20 anos, chegou a Diamantina. Em 1753, João Fernandes de Oliveira, contratador de diamantes (responsável pela exploração da pedra preciosa) e, portanto, um homem riquíssimo, comprou Chica da Silva de seu antigo dono pelo valor de 800 mil-réis. Pouco depois de ter sido comprada, ela foi alforriada e os dois assumiram uma relação pública, porém, nunca foram casados.

Foi essa relação que garantiu a ascensão social de Chica da Silva e fez com que se tornasse uma das mulheres mais ricas e importantes do Brasil Colônia. Até 1770, Chica e João Fernandes mantiveram uma relação estável que lhes rendeu o total de treze filhos, o que manteve Chica da Silva grávida durante grande parte do seu relacionamento com o contratador de diamantes.

Por se relacionar com um homem influente, Chica procurou, nas formas da época, integrar-se socialmente aos círculos da elite colonial. Como todo membro da classe dos mais ricos em Minas Gerais, ela possuía inúmeras propriedades e muitos escravos, dos quais poucos foram alforriados. Ela também participava de irmandades religiosas, pois o envolvimento com ações da Igreja eram parte do protocolo social das mulheres da época.

A respeito dos filhos de Chica que foram concebidos no relacionamento com João Fernandes, os quatro homens foram educados na cidade de Coimbra, em Portugal. Eles foram levados pelo pai para lá, em 1770, ano em que o contratador teve de retornar para sua terra natal por conta do falecimento de seu pai. Isso, inclusive, marcou o fim do relacionamento de Chica e João Fernandes.

As filhas de Chica e de João Fernandes permaneceram em Diamantina e foram educadas no melhor educandário da região e que recebiam as filhas da elite mineira. Isso só foi possível, porque João Fernandes deixou recursos suficientes para manter Chica e suas filhas com uma vida bastante confortável.

Morte

A morte de Chica da Silva aconteceu em 15 de fevereiro de 1796 e os historiadores não sabem quais foram as causas. Chica foi enterrada na tumba número 16 na Igreja de São Francisco de Assis, local que era reservado somente para pessoas brancas e ricas. Isso evidencia o grau de integração social de Chica da Silva, embora os historiadores ainda apontem certos limites para a aceitação social de Chica na época.

Versões de Chica da Silva

Enquanto uma mulher negra que enriqueceu e ascendeu socialmente, Chica da Silva incomodou muito. Ao longo do século XVIII e XIX diferentes versões sobre essa mulher surgiram e, muitas delas, contribuíram para fortalecer preconceitos e visões estereotipadas a respeito dela. O primeiro relato a respeito dela é de autoria de um advogado chamado Joaquim Felício dos Santos.

Esse advogado publicou em 1868 um livro chamado “Memórias do Distrito Diamantino”, que trata da história política de Diamantina e, em certo momento, aborda a história de Chica da Silva. A historiadora Kelly Cristina Benjamim Viana conta que o autor desse livro reconstruiu a história de Chica por meio de depoimentos, informações em autos processuais e da sua própria opinião|1|. O resultado foi que Joaquim Felício criou uma imagem preconceituosa e cheia de estereótipos de Chica da Silva que perdurou durante muitos anos e que influenciou outras obras.

A partir desse relato, começou a se consolidar a imagem de Chica da Silva como cruel e sua figura foi extremamente sexualizada. O advogado ainda não escondia o seu preconceito por não entender como uma mulher negra teria conseguido ascender socialmente e justificava isso sob a alegação de que Chica “não tinha” graça, beleza, espírito e nem educação.

A imagem de mulher cruel que foi construída afirmava que Chica perseguia todos aqueles que poderiam colocar em risco sua relação com o contratador. Já a imagem de lasciva a apresentava como uma mulher que usava o sexo como meio de conseguir tudo o que queria. Estudos recentes conduzidos por historiadores desmitificaram essas visões.

Chica da Silva foi uma mulher convencional da época que procurou integrar-se socialmente por meio de sua riqueza e de seu envolvimento com a Igreja. Por ter ficado grávida treze vezes em um período de dezessete anos, a imagem de Chica como lasciva não é aceita pelos historiadores que levantam que ela provavelmente tenha sido uma mãe dedicada.

Chica da Silva passou grande parte da sua vida em Diamantina, cidade no interior de Minas Gerais.

Outro mito bastante comum é aquele que apresenta Chica como símbolo do mito da “democracia racial do Brasil. Isso, no entanto, é um grande não é verdade, primeiro porque a Chica foi o caso de uma mulher negra que conseguiu ascender socialmente, mas enquanto ela ascendia, outras milhões de mulheres negras continuaram sendo escravizadas.

Além disso, mesmo bem integrada socialmente, a história de Chica mostra que ela teve muitos desafios. A quantidade de preconceitos que ela suscitou já é um indicativo disso e Chica, apesar de rica, ainda sim sofreu restrições na sua vida. Fruto de uma sociedade que a aceitava pelo seu dinheiro, mas que impunha limites para essa aceitação.

Chica da Silva foi representada em inúmeros outros relatos escritos ao longo do século XIX e XX, chegando inclusive a se tornar personagem de uma novela de televisão e de uma produção cinematográfica. Essas produções contribuíram para estereotipar mais ainda a figura de Chica da Silva e isso tem sido combatido por estudos conduzidos pelos historiadores.

Notas

|1| VIANA, Kelly Cristina Benjamim. Estórias da Senhora de Tejuco: Chica da Silva na escrita de mulheres. Para acessar, clique aqui.

Créditos de imagem

[1] Reprodução

Publicado por Daniel Neves Silva
Português
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