Marco Civil da Internet
O Marco Civil da Internet é o nome do projeto de lei 2.126/2011 que visa ao estabelecimento de uma regulamentação sobre o uso e disponibilidade da internet no Brasil. Graças aos recentes casos de escândalos envolvendo espionagem internacional pela internet, o tema vem gerando um maior debate no Congresso Nacional e na sociedade como um todo. Após tramitar pelo congresso e pelo senado, o projeto foi sancionado pela presidenta Dilma Roussef em abril de 2014.
Em resumo, podemos dizer que o Marco Civil é uma espécie de “Constituição da Internet”, visando à regulamentação, através de uma “carta de princípios”, dos direitos e deveres dos usuários da internet, dos portais e sites, das prestadoras de serviço e do Estado. Trata-se, portanto, de uma institucionalização burocrática sobre o que é certo e o que é errado no mundo virtual. Os pontos desse projeto que geraram maiores debates durante a sua tramitação se referem à liberdade, à privacidade e à neutralidade da rede.
A Liberdade de expressão
Antes do Marco Civil, não havia um esclarecimento, no ponto de vista legal, sobre a pertinência de determinados assuntos postados em sites de internet, tendo em vista o respeito às leis e aos direitos constitucionais. Assim, um conteúdo disponibilizado em um site de vídeos ou uma opinião expressa em uma rede de blogs poderiam ser impreterivelmente excluídos mediante uma solicitação judicial ou extrajudicial de alguém que se sentisse ofendido ou que reclamasse os direitos autorais do conteúdo, de modo que o órgão que hospeda o serviço de vídeos ou de blogs pudesse ser responsabilizado pela mensagem.
Assim, o Marco Civil da internet teria a responsabilidade de definir e legislar sobre essa questão. Afinal, quem decidirá se um conteúdo é ofensivo ou não, se ele ataca a lei de direitos autorais ou não, entre outros elementos? E se transgredir alguma lei, quem será o responsável, o autor específico da mensagem (sendo excluído somente o conteúdo desta), o responsável pela hospedagem ou o administrador do site? Caberia, então, ao Estado – no caso, ao poder jurídico – definir essa questão, e não um dos lados da história.
Essa questão refere-se à liberdade de expressão da internet pelo fato de conteúdos críticos postados, por exemplo, no youtube ou em algum blog ou revista serem excluídos por empresas, pessoas ou organizações que se sintam ofendidas, não havendo, portanto, uma mediação legal que regule esse processo de exclusão ou “censura”.
Portanto, para que determinado texto, imagem ou vídeo sejam retirados do ar, com o Marco Civil, há agora a necessidade de existir uma decisão judicial sobre o caso, o que não necessariamente ocorria antes. As exceções seriam para sites em que há o estímulo, a prática ou a incitação explícita à violação dos direitos humanos, bem como casos de pedofilia, racismos, entre outras transgressões penais. Nesses casos, a exclusão do conteúdo deverá ser imediata.
A questão da privacidade do usuário
A privacidade do usuário da internet é uma questão que foi colocada em xeque frente aos casos de espionagem envolvendo a Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) e o Quartel General de Comunicações do Governo do Reino Unido. As denúncias realizadas pelo ex-agente Edward Snowden dão conta de que informações sobre os usuários em redes sociais e sites de publicidade foram coletadas por esses órgãos para monitorar o comportamento de indivíduos e da população em geral.
Isso ocorreu porque, atualmente, sites da internet coletam e utilizam informações sobre as pessoas, como dados sobre o comportamento dos indivíduos, históricos de pesquisas, aprovações e reprovações sobre determinadas plataformas, entre outros elementos, para direcionar propagandas e ofertas relacionadas com cada perfil de usuário. O que pretende o Marco Civil, nesse caso, não é coibir tal prática, mas regulá-la, dando o direito aberto ao próprio internauta de decidir se quer ou não repassar tais informações. Além disso, esses dados deverão estar devidamente protegidos e resguardados.
Outro ponto nessa questão sobre o armazenamento de dados, logs e registros dos usuários é que eles devem ser guardados com sigilo e segurança pelos provedores de acesso. Nesse caso, somente mediante autorização judicial que tais dados poderão ser acessados, para fins de investigação militar ou criminal, vedando o acesso por terceiros de forma ocasional e aleatória.
A neutralidade da rede
Esse, sem dúvidas, foi o ponto de maior debate e que contou com as maiores polêmicas e conflitos nas sessões de aprovação do texto do Marco Civil no Congresso Nacional. Isso porque o Marco Civil visa à definição da neutralidade no acesso à internet, ou seja, que não deverá haver restrições em termos de velocidade e quantidade de bytes acessados na rede.
Anteriormente, as operadoras de internet poderiam oferecer os pacotes ou planos em que os mais baratos dispõem de velocidades, qualidades e conteúdos mais limitados. Em regiões periféricas, muitas vezes, os pacotes mais caros não estão sequer disponíveis, mesmo que o cliente esteja disposto a comprá-los. Com o Marco Civil, essa distinção chega ao fim.
O que as empresas argumentaram é que os pacotes ficariam mais caros e também mais onerosos, diminuindo os seus lucros e também dificultando o acesso. Havia, inclusive, a proposta por planos em que o usuário deveria pagar por acesso a sites e conteúdos “não básicos”, em uma configuração semelhante ao modo como funcionam os canais de TV por assinatura, em que os planos mais caros aceitariam o acesso a qualquer site e os mais baratos restringiriam a navegação a e-mails e redes sociais.
Os usuários, por sua vez, afirmam que isso funcionaria como uma segregação social na internet, em que a população mais pobre não teria os mesmos direitos de acesso ao que for disponibilizado na rede. Além disso, empresas menores, por pagarem servidores mais baratos, apresentariam sites mais lentos e “pesados”, enquanto instituições mais ricas teriam condições para pagar servidores mais caros e eficientes.
Apesar das disputas de influência e dos debates gerados, o texto do Marco Civil foi totalmente aprovado de modo a garantir a liberdade, a privacidade e a neutralidade da rede, o que representou, de certa forma, uma vitória dos movimentos sociais nessa questão. O governo empenhou-se em aprovar a proposta e por isso fez uma grande articulação política para que ele acontecesse.