Descoberta da Radioatividade

Um selo impresso na Suécia por volta de 1963 mostra prêmio Nobel que Antoine Henri Becquerel, Pierre e Marie Curie dividiram em 1903*

Os fenômenos radioativos começaram a ser descobertos em 1896 pelo cientista francês Antoine Henri Becquerel (1852-1908). No entanto, as suas descobertas só foram possíveis graças aos estudos anteriores sobre os raios X. Assim, vejamos primeiro como os raios X foram descobertos e qual a sua relação com a descoberta da radioatividade, acontecimentos importantes que marcaram o acaso do século passado.

Em 1895, o físico alemão Wilhelm Konrad Röntgen (1845-1923) descobriu de maneira acidental “um novo tipo de raio”, que possibilitava ‘ver’ dentro do corpo humano. Como esse cientista não sabia qual era exatamente a natureza desses raios, ele chamou-os de raios X. Certa noite, ele estava em seu laboratório, onde havia uma ampola de Crookes, um tubo de vidro vedado que tinha no seu interior gases em pequena quantidade, a baixas pressões, e, em sua extremidade, havia dois eletrodos, isto é, peças metálicas ligadas a uma fonte elétrica externa que estabelecia uma diferença de potencial, passando corrente elétrica pelos gases dentro do tubo.


Wilhelm Konrad Röntgen (1845-1923)

A ampola de Crookes estava coberta com papel-cartão preto e as luzes estavam apagadas. Então, Röntgen notou que uma tela recoberta de platinocianeto de bário, que estava por acaso no laboratório, começou a brilhar quando ele ligou a ampola. O platinocianeto de bário é uma substância fluorescente, o que significa que ele emite luz visível quando absorve energia de determinada fonte, mas cessa depois que a fonte é desligada. Depois de fazer vários testes, Röntgen chegou à conclusão de que raios vindos da ampola atingiam o platinocianeto de bário.

Ele notou também que eles não sofriam desvio por campo elétrico e o mais impressionante: podiam sensibilizar uma chapa fotográfica, permitindo que ele visse os ossos de suas mãos. Abaixo temos a radiografia da mão da esposa de Röntgen, Anna Bertha Ludwig. Veja que os raios X não atravessaram o ouro da aliança e, por isso, o osso na região da aliança não ficou visível:


Radiografia da mão da esposa de Röntgen, Anna Bertha Ludwig

Os raios X tiveram uma tremenda repercussão, tanto que Röntgen recebeu em 1901 o Prêmio Nobel de Física por sua descoberta.

No entanto, para situar o leitor, os raios X são radiações, mas não são o mesmo que radioatividade. Como assim? Os raios X são ondas eletromagnéticas de alta energia, com comprimento de onda no intervalo aproximado de 10-11 a 10-8 m (0,1 a 100 Å) e resultam da colisão entre elétrons, ou seja, originam-se fora do núcleo do átomo. Já a radioatividade caracteriza radiações emitidas de núcleos atômicos instáveis. Para mais detalhes sobre os raios X, leia o texto abaixo:

A descoberta de Röntgen levou Becquerel, no início do ano de 1896, a testar a hipótese de que as substâncias fosforescentes (substâncias que emitem luz visível depois de absorver energia de outra fonte, mas que, ao contrário das substâncias fluorescentes, continuam emitindo luz por algum tempo, mesmo depois que a fonte de energia é desligada) e fluorescentes também emitiriam raios X.


Antoine Henri Becquerel (1852-1908)

Ele fez isso deixando ao sol amostras de um minério de urânio, o sulfato duplo de potássio e a uranila di-hidratada. Em seguida, ele colocou essas amostras em contato com um filme fotográfico envolvido por um invólucro preto para ver se elas impressionavam o filme e, assim, emitiam raios X.

No entanto, começou um tempo de chuva em Paris e Becquerel teve que guardar as suas amostras em uma gaveta escura com alguns filmes virgens protegidos com um papel preto. Novamente, um fato acidental aliado à perspicácia resultou em uma descoberta excepcional. Veja um trecho do relatório que Becquerel fez à Academia de Ciências da França:

“Como o sol não voltou a aparecer durante vários dias, revelei as chapas fotográficas a 1º de março, na expectativa de encontrar imagens muito deficientes. Ocorreu o oposto: as silhuetas apareceram com grande nitidez. Pensei imediatamente que a ação poderia ocorrer no escuro.”2

Becquerel também descobriu que essa radiação que o urânio emitia também ionizava gases, transformando-os em condutores.

Entrou então em cena o casal Pierre Curie (1859-1906) e Marie Curie (1867-1934). Juntamente a eles, Becquerel descobriu que a propriedade que ele viu era pertencente ao urânio, pois todos os minérios de urânio emitiam os raios que impressionavam o filme. Marie Curie batizou essa propriedade de o urânio emitir raios de radioatividade.

 Os trabalhos do casal Curie tive­ram crucial importância na mudança de rumo que tomaria a radioatividade. Em abril de 1898, Marie Curie constatou que havia algum componente mais ativo que o urânio em seus minerais naturais. Esse casal trabalhou durante três anos exaustivamente, usaram 1400 litros de um minério de urânio chamado pechblenda ou uranita (UO2) e, em 1902, isolaram átomos de dois elementos químicos radioativos que não eram conhecidos na época. O primeiro, eles chamaram de rádio, pois ele era 2 milhões de vezes mais radioativo que o urânio; o segundo, eles chamaram de polônio, em homenagem à Polônia, terra natal de Madame Curie.

Em 1903, Marie Curie, Pierre Curie e Antoine-Henri Becquerel divi­diram o Prêmio Nobel de Física pelos seus trabalhos com radioatividade.

Anos mais tarde, o físico neozelandês Ernest Rutherford (1871-1937) realizou um experimento mostrado na figura abaixo, que identificou a natureza da radioatividade, mostrando que ela se originava do núcleo. Para mais detalhes sobre isso, leia o texto  Emissões Radioativas Naturais. Ernest Rutherford rece­beu o Prêmio Nobel de Química em 1908 pelos estudos da desintegração de elementos e a química das substân­cias radioativas.

1 - Crédito Editorial da Imagem: IgorGolovniov / Shutterstock.com;

2 - SEGRÈ, Emilio. Dos raios X aos quarks. Físicos modernos e suas descobertas. Brasília: Editora da UnB, 1987, p. 29.

Publicado por Jennifer Rocha Vargas Fogaça
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