O que é filosofia?
A Filosofia é uma forma do pensamento se desdobrar sobre si mesmo. De maneira conceitual e abstrata, a Filosofia preza, muitas vezes, por um rigor metodológico parecido com o rigor científico. Outras vezes, utiliza-se de novas perspectivas próprias de cada pensador e de cada trabalho filosófico desenvolvido.
É fato que a Filosofia mantém acesa a chama que aquece a busca pelo conhecimento sem, na maioria das vezes, fornecer respostas prontas e acabadas. A Filosofia é, portanto, uma atividade que problematiza, ou seja, coloca questões em jogo, respondendo a cada pergunta com uma nova pergunta – o que faz o pensamento manter-se sempre em movimento.
A pergunta “o que é a Filosofia?” é complexa e envolta de polêmicas. Ao longo da história universal, vários pensadores diferentes apresentaram as suas ideias sobre o que vem a ser a Filosofia, mas nunca houve um consenso estabelecido, pronto e definido sobre a sua essência. Essa seja, talvez, a maior característica da Filosofia, que, por meio do livre pensar e da crítica, permite que seja desenvolvida uma maneira autônoma de se pensar sobre diversos assuntos, impulsionando o conhecimento sempre adiante.
Porém, de maneira provisória e seguindo uma convenção acadêmica, podemos dizer que a filosofia é a atividade crítica, abstrata, conceitual e problematizadora que o ser humano pode estabelecer sobre os diversos elementos do conhecimento humano e de seu meio.
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O que é Filosofia?
Na tentativa de formular uma resposta genérica que abarque o conceito de Filosofia em geral, faremos uma incursão perigosa, pois ela pode tender para um determinado ponto de vista. Por não haver um consenso do que seja a Filosofia e de como a Filosofia deve operar, muitos pensadores desenvolveram teses diferentes acerca da atividade filosófica.
A Filosofia é uma área do conhecimento que coloca em questão o próprio conhecimento. Os filósofos, desde a Antiguidade, tentaram entender o mundo e tudo o que há nele, seja concreto, seja abstrato, de maneira conceitual. Perguntando pelas essências das coisas, por meio da pergunta “o que é?”, passaram a formular definições complexas e envoltas em problemas, que resultaram em um movimento de constante problematização e formulação de novas questões que rodeia as perguntas “como é?”, “por que é?”, “em que situações se aplica?”, etc.
Gilles Deleuze e Félix Guattari afirmaram que “a filosofia, mais rigorosamente, é a disciplina que consiste em criar conceitos”i. Isso indica, em primeira mão, que a Filosofia é um trabalho de criação e também de recriação, renovação e atualização dos conceitos. O filósofo, na ótica dos pensadores contemporâneos citados, deve trabalhar com um “plano de imanência”, que seria um plano conceitual no qual ele pode pegar os conceitos criados por filósofos anteriores e recriá-los, atualizá-los, moldá-los novamente, criando um pensamento novo. Nessa perspectiva, a Filosofia passa a criar novos significados para o mundo, sempre transformando a si mesma e ao meio, na medida em que permite que o pensamento nunca cesse a sua marcha.
A professora Marilena Chaui, da Universidade de São Paulo (USP), escreveu em seu livro Convite à Filosofiaii que esse saber tem a missão de duvidar das crenças costumeiras. Isso significa colocar em questão o senso comum. A Filosofia seria, para Chaui, aquele movimento que Sócrates iniciou na Antiguidade de olhar para dentro de si (“conhece-te a ti mesmo” são as palavras entalhadas no templo dedicado a Apolo em Atenas que tanto marcaram a trajetória de Sócrates), para então tentar entender o mundo e a verdade. Esse movimento seria percebido apenas em momentos de crise, quando a pessoa sai de sua zona de conforto e percebe a existência de uma realidade muito maior do que a que ela julgava existir.
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O que a filosofia estuda?
Existem, hoje, os cursos de Filosofia que ensinam História da Filosofia. Os professores e filósofos em formação estudam, de início, a produção intelectual de pensadores já canonizados como arautos do conhecimento por meio da história para, quem sabe, produzirem o seu próprio conhecimento.
Algumas perspectivas de estudiosos da didática e da metodologia filosófica, como a de Gonzalo Armijos Paláciosiii, professor titular de Filosofia da Universidade Federal de Goiás (UFG), contrariam essa visão, conjecturando que (com base em uma frase comumente atribuída a Kant) não se deve ensinar História da Filosofia, mas filosofar.
Nessa perspectiva, o aprendizado da Filosofia acontece por meio da atitude filosófica, que não é passiva, no sentido de esperar por um conhecimento, mas sim ativa, no sentido de ser a própria atividade um conhecimento.
Ao longo da história, diversos pensadores apresentaram diversas visões do que é a Filosofia. Alguns disseram a respeito dessas visões próprias; outros, simplesmente, agiram de acordo com o que acreditavam. Se para Sócrates a Filosofia deveria partir do conhecimento interior para se chegar à verdade, para Aristóteles e Tomás de Aquino a Filosofia partiria do conhecimento das causas para se chegar a um conhecimento das essências.
Se para Descartes a Filosofia era racionalista, devendo atuar somente no campo conceitual e abstrato do pensamento, para Hume e Bacon ela deveria partir da experiência prática. Se para Kant e Nietzsche a Filosofia é feita pelo criticismo, para Deleuze, que tem inspirações nietzschianas, a filosofia é o trabalho com os conceitos.
Para a epistemologia, a Filosofia deve buscar entender como é possível o conhecimento. Para a filosofia política, o trabalho filosófico consiste em problematizar as ações humanas resultantes da vida em sociedade. Há uma variedade imensa de estudos e possibilidades de atuação para os filósofos, sendo impossível elencar, em um breve texto, todas essas possibilidades.
Origens da Filosofia
Outra questão que gera querela entre os filósofos e, principalmente, aqueles que se dedicam a estudar a História da Filosofia é quanto à origem certa desse ramo do saber. Uns afirmam com veemência que a origem da filosofia é grega. Outros admitem, ao menos, a possibilidade de que a filosofia tenha se originado a partir de doutrinas orientais.
Giovanni Reale, historiador da Filosofia, é convicto da tese mais aceita pela academia, de que a filosofia surgiu na Grécia Antiga. Segundo o pesquisador,
encontramo-nos diante de um fenômeno tão novo que […] não só não há entre os povos orientais idêntico correlativo, mas nem mesmo algo que analogicamente comporte comparação com a filosofia dos gregos ou que a prefigure de modo inequívocoiv.
Essa tese suporta a ideia de que Tales de Mileto tenha sido o primeiro filósofo, ao buscar uma origem racional para o surgimento do universo e afirmando que a água seria a possível origem, por volta do ano 585 a.C.
Tales, ao fazer a sua Filosofia, não sabia que ficaria marcado na história ocidental. Também não sabia que o que estava fazendo era Filosofia e tampouco cunhou a palavra que ficou conhecida pela posteridade. Aristóteles foi o responsável por afirmar que Tales foi o primeiro filósofo e reconheceu em Pitágoras a origem do termo filosofia, que seria a junção dos vocábulos gregos philos (de philia, que significa amor ou amizade) e sophia (que significa sabedoria). O filósofo seria, portanto, um amigo ou amante da sabedoria.
Quem discorda dessa tese tem também os seus motivos. Alguns pesquisadores acreditam que os pensadores gregos tiveram contato com povos egípcios e babilônicos, que trouxeram, devido ao contato com hindus, caldeus e hebreus, as influências do pensamento oriental para a região da Grécia. Alguns ainda dizem que, em períodos anteriores, os gregos tiveram contato direto com orientais.
Na esteira do que foi dito, deve-se considerar como Filosofia a produção de doutrinas orientais, fundadas no budismo, escritas por pensadores como Lao Tsé, Confúcio e Mozi, mais ou menos no mesmo período em que os gregos desenvolviam a sua Filosofia.
Selos chineses estampam os rostos dos antigos sábios Mozi, Lao-Tsé, Confúcio e Chuang-Tzu.
Para que serve a Filosofia?
A pergunta acerca da utilidade da Filosofia gera muitas polêmicas. Muitos acusam a Filosofia de não ter utilidade alguma, pois ela não apresenta nada de concreto e útil em suas teses. Em partes, é verdade. A Filosofia não atua de maneira prática e concreta, modificando visivelmente o mundo.
De tanto essa pergunta se repetir, com intenções irônicas, os estudantes de Filosofia também se habituaram a soltar uma resposta não menos irônica: “a filosofia é uma ciência com a qual e sem a qual o mundo permanece tal e qualv”. Assim, partindo do ponto de vista pragmático da sociedade capitalista que afirma que algo somente tem o direito de existir se for imediatamente útil e, em todos os casos, lucrativo, então a Filosofia não tem utilidade.
A Filosofia não serve para essa modificação concreta do mundo porque ela não serve a ninguém. A Filosofia, ao menos uma Filosofia autêntica, é autônoma e crítica, emancipada das amarras de qualquer norma que determine o que deve ou não ser feito, o que pode ou não ser dito. Esse foi o motivo da condenação de Sócrates pelos atenienses, que viram no pensador um perigo para a estabilidade política dos governantes.
A Filosofia é aquela capaz de criar subterfúgios e caminhos para que o pensamento continue avançando, que a humanidade continue questionando-se e tentando entender o mundo e o seu próprio pensamento de maneira crítica e racional. É a Filosofia que oferece ferramentas para as ciências ao mesmo tempo em que questiona a validade das teorias científicas. É a Filosofia que oferece subsídios teóricos para a política, ao mesmo tempo em que questiona as ações políticas. É a Filosofia que estrutura a ética e o modo como o ser humano deve agir. Nesse ponto, a Filosofia tem a sua utilidade e a sua importância no mundo. É a Filosofia que tem a capacidade de derrotar a ignorância por intermédio de um pensamento livre, crítico e autônomo.
iDELEUZE, G.; GUATTARI, F. O que é a filosofia? Tradução de Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Muñoz. Rio de Janeiro: 34, 1992, p. 13.
iiCHAUI, M. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2005.
iiiPALÁCIOS, G. A. Ensina-se a filosofar, filosofando. In: Philósophos, vol. 12, n. 1. Goiânia: UFG, 2007, p. 79-90.
ivREALE, G. História da Filosofia Antiga. São Paulo: Loyola, 1993, v. 1, p. 11.
vCHAUI, M. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2005, p. 19.