Patativa do Assaré
Patativa do Assaré foi um poeta brasileiro. Ele nasceu em 5 de março de 1909, na cidade de Assaré, no Ceará. Mais tarde, teve apenas alguns meses de estudo formal, trabalhou grande parte da vida como agricultor, foi violeiro e cantor. Assim, Patativa do Assaré, além de publicar livros, também gravou discos.
O escritor, que faleceu em 8 de julho de 2002, em Assaré, foi autor de literatura de cordel e poesia popular nordestina. Suas obras apresentam linguagem coloquial, traços regionais, além de elementos sociais e políticos. Inspiração nordestina e Aqui tem coisa são alguns de seus livros.
Leia também: Afinal, o que é literatura de cordel?
Resumo sobre Patativa do Assaré
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Patativa do Assaré foi um famoso poeta brasileiro.
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Nasceu em 1909 e faleceu em 2002.
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Além de poeta, foi agricultor, violeiro e cantor nordestino.
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Suas obras apresentam lirismo, caráter popular e crítica sociopolítica.
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Seu primeiro livro, publicado em 1956, é Inspiração nordestina.
Biografia de Patativa do Assaré
Patativa do Assaré (Antônio Gonçalves da Silva) nasceu em 5 de março de 1909, na cidade de Assaré, no Ceará. Em 1913, com quatro anos de idade, devido ao sarampo, perdeu a visão do olho direito. Já em 1917, ficou órfão de pai, um pobre agricultor, que deixou esse ofício como herança para o filho.
Com oito anos de idade, ao ouvir uma mulher ler um cordel, o pequeno poeta ficou fascinado e se apaixonou pela poesia. Em 1921, com 12 anos de idade, ingressou na escola pela primeira vez, ficando somente entre quatro a seis meses. Isso foi o suficiente para ele aprender a ler e lhe possibilitou, futuramente, ler Camões, Castro Alves, entre outros autores.
Em 1922, começou a fazer versos. Em 1925, após vender uma cabra, conseguiu comprar uma viola e passou a tocar e cantar em festas e feiras. Em 1929, morou seis meses no Pará, onde ficou conhecido e adquiriu seu pseudônimo. Ali nascia o poeta Patativa do Assaré.
No ano de 1936, casou-se com dona Belinha (Belarmina Paes Cidrão). Continuou com suas apresentações e sua literatura. Ele compunha seus poemas na memória e só os colocava no papel depois que estavam prontos. Por volta dos 40 anos de idade, deixou a atividade de violeiro e, artisticamente, passou a se dedicar apenas à poesia.
Na década de 1950, Patativa do Assaré recitava seus poemas na rádio Araripe e foi ouvido pelo pesquisador José Arraes de Alencar. Este convenceu e ajudou Patativa a publicar seu primeiro livro — Inspiração nordestina. O poeta ficou mais conhecido quando, em 1964, o cantor Luiz Gonzaga (1912-1989) gravou A triste partida, canção de Assaré.
Por volta de 1965, ao publicar seu poema “Caboclo roceiro” em um jornal, Patativa do Assaré foi convocado a depor, já que a obra incomodou representantes da ditadura militar da época, de forma que foi censurada. Já em 1972, o cantor Raimundo Fagner gravou a canção “Sina”, de Patativa do Assaré.
No ano seguinte, quando estava em Fortaleza, o poeta foi atropelado em 13 de agosto, fraturou uma perna, o que o levou a se aposentar do trabalho rural. Em 1979, Patativa gravou o disco Poemas e canções. No ano seguinte, Fagner gravou mais uma canção do poeta — “Vaca Estrela e boi Fubá”.
O poeta Patativa do Assaré, em 1984, participou do movimento Diretas Já, que pedia eleições diretas para presidente do Brasil. No ano seguinte, gravou o disco Patativa do Assaré. A essa altura, o poeta, compositor, violeiro e cantor era bastante conhecido no Brasil.
Ele fez uma participação especial na novela Renascer, da tevê Globo, em 1993. O artista lançou o disco Patativa — 85 anos de luz e poesia, em 1994, e o CD Patativa — 88 anos de poesia, em 1997. No entanto, o poeta trabalhou na roça até quase 70 anos de idade. Patativa de Assaré faleceu em 8 de julho de 2002, em Assaré, aos 93 anos de idade.
Por que o pseudônimo Patativa do Assaré?
Ao viajar ao Pará, por volta de 1929, o autor foi apresentado ao folclorista José Carvalho de Brito, que escrevia para o Correio do Ceará. Nesse jornal, o estudioso publicou um artigo sobre o poeta, no qual compara Antônio Gonçalves da Silva a uma patativa (ave cujo canto é muito apreciado). Assim, o poeta juntou o apelido de Patativa com o nome de sua cidade de origem, e passou a assinar com o pseudônimo de Patativa do Assaré.
Características das obras de Patativa do Assaré
A seguir, as principais características das obras de Patativa do Assaré:
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Caráter memorialístico
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Natureza satírica
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Cunho declamativo
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Marcas da cultura popular
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Aspecto regional
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Questões sociais e políticas
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Religiosidade e misticismo
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Elementos da literatura de cordel
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Uso de metáforas e ironias
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Traços do cotidiano nordestino
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Versos metrificados e rimas
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Linguagem coloquial
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Recurso dialógico
Principais obras de Patativa do Assaré
- Inspiração nordestina (1956)
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Ispinho e fulô (1988)
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Aqui tem coisa (1994)
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Cordel (2000)
Poemas de Patativa do Assaré
A seguir, leia alguns trechos do poema “A terra é naturá”, marcado pela linguagem coloquial e pelo cunho social e político:
Sinhô dotô, meu ofiço
É servi ao meu patrão.
Eu não sei fazê comiço,
Nem discuço, nem sermão;
Nem sei as letra onde mora,
Mas porém, eu quero agora
Dizê, com sua licença,
Uma coisa bem singela,
Que a gente pra dizê ela
Não percisa de sabença.
Se um pai de famia honrado,
Morre, dexando a famia,
Os seus fiinho adorado
Por dono da moradia,
E aqueles irmão mais véio,
Sem pensá nos Evangéio,
Contra os novo a toda hora
Lança da inveja o veneno
Inté botá os mais pequeno
Daquela casa pra fora.
Disso tudo o resurtado
Seu dotô sabe a verdade,
Pois, logo os prejudicado
Recorre às oturidade;
E no chafurdo infeliz
Depressa vai o juiz
Fazê a paz dos irmão
E se ele fô justicêro
Parte a casa dos herdêro
Pra cada quá seu quinhão.
Seu dotô, que estudou munto
E tem boa inducação,
Não ignore este assunto
Da minha comparação,
Pois este pai de famia
É o Deus da Soberania,
Pai do sinhô e pai meu,
Que tudo cria e sustenta,
E esta casa representa
A terra que Ele nos deu.
[…]
Esta terra é como o vento,
O vento que, por capricho
Assopra, as vez, um momento,
Brando, fazendo cuchicho.
Otras vez, vira o capêta,
Vai fazendo piruêta,
Roncando com desatino,
Levando tudo de móio
Jogando arguêro nos óio
Do grande e do pequenino.
[…]
Não invejo o seu tesôro,
Sua mala de dinhêro
A sua prata, o seu ôro
O seu boi, o seu carnêro
Seu repôso, seu recreio,
Seu bom carro de passeio,
Sua casa de morá
E a sua loja surtida,
O que quero nesta vida
É terra pra trabaiá.
Iscute o que tô dizendo,
Seu dotô, seu coroné:
De fome tão padecendo
Meus fio e minha muié.
Sem briga, questão nem guerra,
Meça desta grande terra
Umas tarefa pra eu!
Tenha pena do agregado
Não me dêxe deserdado
Daquilo que Deus me deu.|1|
Agora, leia alguns trechos do poema “Cante lá, que eu canto cá”, em que o eu lírico faz uma comparação entre o poeta do sertão e o poeta da cidade. Desse modo, ele mostra que só pode falar das questões sociais do sertão nordestino aquele que vive nessa realidade:
Poeta, cantô de rua,
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu.
Se aí você teve estudo,
Aqui, Deus me ensinou tudo,
Sem de livro precisá
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mexo aí.
Cante lá, que eu canto cá.
Você teve inducação
Aprendeu munta ciença,
Mas das coisa do sertão
Não tem boa esperiença.
Nunca fez uma paioça,
Nunca trabaiô na roça,
Não pode conhecê bem,
Pois nesta penosa vida,
Só quem provou da comida
Sabe o gosto que ela tem.
Pra gente cantá o sertão,
Precisa nele morá,
Tê armoço de feijão
E a janta de mucunzá.
Vivê pobre, sem dinhêro,
Trabaiando o dia intêro,
Socado dentro do mato,
De apragata currelepe.
Pisando inriba do estrepe,
Brocando a unha-de-gato.
Você é munto ditoso,
Sabe lê, sabe escrevê,
Pois vá, cantando o seu gozo,
Que eu canto meu padecê.
Inquanto a felicidade
Você canta na cidade,
Cá no sertão eu infrento
A fome, a dô e a misera.
Pra sê poeta divera,
Precisa tê sofrimento.
Sua rima, inda que seja
Bordada de prata e de ôro,
Para a gente sertaneja
É perdido este tesôro.
Com o seu verso bem-feito,
Não canta o sertão dereito,
Porque você não conhece
Nossa vida aperreada.
E a dô só é bem cantada,
Cantada por quem padece.
[…]
Aqui findo esta verdade
Toda cheia de razão:
Fique na sua cidade
Que eu fico no meu sertão.
Já lhe mostrei um ispeio,
Já lhe dei grande conseio
Que você deve tomá.
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mexo aí.
Cante lá, que eu canto cá.|2|
Veja também: Ariano Suassuna — autor cujas obras também apresentam elementos da cultura popular nordestina
Prêmios e homenagens a Patativa do Assaré
- Diploma Amigo da Cultura (1982)
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Cidadão de Fortaleza (1982)
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Medalha da Abolição (1987)
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Doutor honoris causa pela Universidade Regional de Cariri (1989)
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Rodovia Patativa do Assaré (1989)
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Prêmio do Ministério da Cultura (1995)
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Medalha José de Alencar (1995)
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Medalha Francisco Gonçalves de Aguiar (1998)
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Memorial Patativa do Assaré (1999)
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Doutor honoris causa pela Universidade Estadual do Ceará (1999)
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Prêmio UniPaz (1999, 2003)
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Cidadão do Rio Grande do Norte (2000)
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Doutor honoris causa pela Universidade Tiradentes (2000)
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Troféu Sereia de Ouro (2001)
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Prêmio FIEC (2002)
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Troféu MST (2004)
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Biblioteca Pública Patativa do Assaré, no Piauí (2005)
Legado de Patativa do Assaré
O legado de Patativa do Assaré é sua obra poética e também a sua história de vida, já que o poeta nasceu e viveu como pobre agricultor. Teve apenas alguns meses de estudo formal. Ainda assim, como autodidata e dono de um talento natural, tornou-se um dos principais poetas do Nordeste brasileiro.
A sua fama como poeta e representante da cultura popular colocou o Nordeste e a vida do nordestino pobre em evidência. Dessa forma, o legado de Patativa do Assaré não é só literário mas também político. Por fim, sua baixa escolaridade não impediu que ele fosse um leitor de clássicos, poeta conhecedor das rimas, métrica e consciente das questões sociais e políticas.
Frases de Patativa do Assaré
A seguir, vamos ler algumas frases de Patativa do Assaré, extraídas do livro Cordéis e outros poemas. Portanto, fizemos uma adaptação e transformamos seus versos em prosa:
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“Eu canto meus sentimentos e os sentimentos alheios.”
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“Quando é preciso eu canto a mágoa, a dor e a tristeza.”
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“O que defende os humildes vai depressa perseguido pelo dragão da maldade.”
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“A justiça é para todos, vamos lutar pela paz.”
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“Ante os direitos humanos, todos nós somos iguais.”
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“Um só homem sem coragem no nosso mundo não há.”
Notas
|1| ASSARÉ, Patativa do. A terra é naturá. In: ASSARÉ, Patativa do. Cordéis e outros poemas. Fortaleza: UFC, 2006.
|2| ASSARÉ, Patativa do. Cante lá, que eu canto cá. In: ASSARÉ, Patativa do. Cordéis e outros poemas. Fortaleza: UFC, 2006.
Créditos de imagem
[1] Editora Moderna (reprodução)
[2] Editora Hedra (reprodução)
[3] Allan Patrick / Wikimedia Commons (reprodução)
Fontes
ASSARÉ, Patativa do. A terra é naturá. In: ASSARÉ, Patativa do. Cordéis e outros poemas. Fortaleza: UFC, 2006.
ASSARÉ, Patativa do. Cante lá, que eu canto cá. In: ASSARÉ, Patativa do. Cordéis e outros poemas. Fortaleza: UFC, 2006.
LEONARDELI, Poliana Bernabé. Patativa do Assaré e a identidade sertaneja: oralidade, memória e religiosidade. 2009. Dissertação (Mestrado em Letras) – Centro de Ciências Humanas e Naturais, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2009.
MELLO, Patrícia Gomes de. Cante lá que eu canto cá: uma abordagem dialógica do estilo da poesia popular de Patativa do Assaré. 2015. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2015.
NÓBREGA FILHO, Antonio; FEITOSA, Fátima (orgs.). Patativa do Assaré: 100 anos de poesia. Fortaleza: INESP, 2009.
NOGUEIRA, Renata de Carvalho. A poética social de Patativa do Assaré. 2017. Dissertação (Mestrado em Letras) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017.