Pepetela
Pepetela, escritor angolano, é hoje um dos principais autores de língua portuguesa do mundo. Suas obras, majoritariamente escritas em prosa, retratam os conflitos políticos e psicológicos de um país com resquícios recentes de um cruel processo de colonização portuguesa. A reflexão política e histórica suscitada por sua ficção, como no romance Mayombe, também é permeada pela intersecção das lendas e tradições da cultura angolana, o que torna sua literatura uma rica imersão no continente africano.
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Biografia de Pepetela
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, conhecido pelo pseudônimo de Pepetela, nasceu em Benguela, na Angola, em 29 de outubro de 1941. Cursou os estudos primários e secundários em Benguela e em Lubango. Em 1958, mudou-se para Lisboa, onde frequentou o Instituto Superior Técnico e onde iniciou suas atividades políticas e literárias.
Em 1962, saiu de Portugal com destino a Paris, França, onde passou seis meses. Posteriormente, seguiu para a Argélia, onde se formou em sociologia, vindo a trabalhar na representação do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e no centro de Estudos Angolanos, que ajudou a criar.
Regressou a Angola e participou diretamente da luta armada como guerrilheiro e como responsável pelo setor da educação, de 1969 a 1974. Foi nesse contexto de guerra que ele adotou o nome Pepetela, que significa, na língua umbundo, “pestana”, e que passou a utilizar como pseudônimo literário. Integrou, em 1974, a primeira delegação do MPLA que chegou à capital, Luanda.
Desempenhou os cargos de diretor do Departamento de Educação e Cultura e do Departamento de Orientação Política. Além disso, foi membro do Estado Maior da Frente Centro. De 1975 a 1982, foi vice-ministro da Educação. Posteriormente, passou a lecionar sociologia na Universidade de Luanda. Pepetela publicou inúmeros romances, livros de crônica e teatro. Atualmente suas obras são traduzidas para vários idiomas, e é membro fundador da União dos Escritores Angolanos.
Características literárias de Pepetela
- Revisitação de fatos históricos de Angola com criticidade;
- Constante referência aos mitos tradicionais angolanos;
- Tentativa de problematização da formação identitária de Angola;
- Uso recorrente de figuras de linguagem;
- Prosa tendendo à linguagem poética;
- Fluxo narrativo tendendo à mescla de focos narrativos em uma mesma obra;
- Personagens complexos psicologicamente;
- Exploração do tempo e do espaço de forma não linear.
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Obras de Pepetela
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Romances
- As aventuras de Ngunga (1972)
- Muana Puó (1978)
- Mayombe (1979)
- O cão e os caluandas (1985)
- Yaka (1985)
- Lueji (1990)
- Geração da utopia (1992)
- O desejo de Kianda (1995)
- Parábola do cágado velho (1997)
- A gloriosa família (1997)
- A Montanha da Água Lilás (2000)
- Jaime Bunda, agente secreto (2001)
- Jaime Bunda e a morte do americano (2003)
- Predadores (2005);
- O terrorista de Berkeley, Califórnia (2007)
- O quase fim do mundo (2008)
- Contos de morte (2008)
- O planalto e a estepe (2009)
- A sul. O sombreiro (2011)
- O tímido e as mulheres (2013)
- Se o passado não tivesse asas (2016)
- Sua excelência de corpo presente (2018)
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Teatro
- A corda (1978)
- A revolta da Casa dos Ídolos (1980)
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Crônicas
- Crônicas com fundo de guerra (2011)
- Crônicas maldispostas (2015)
Mayombe
Mayombe foi escrito durante a participação de Pepetela na guerra de libertação de Angola, na década de 1970. O enredo, organizado em seis capítulos, gira em torno do cotidiano dos guerrilheiros do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), os quais estavam em luta contra as tropas portuguesas.
O romance, cujo foco narrativo oscila entre um narrador onisciente e a narração em primeira pessoa dos personagens, mostra-se inovador por abordar as ações e as percepções subjetivas do grupo, evidenciando, inclusive, suas contradições em busca de uma Angola livre da colonização portuguesa. Leia um trecho inicial do primeiro capítulo de Mayombe:
“O rio Lombe brilhava na vegetação densa. Vinte vezes o tinham atravessado. Teoria, o professor, tinha escorregado numa pedra e esfolara profundamente o joelho. O Comandante dissera a Teoria para voltar à Base, acompanhado de um guerrilheiro. O professor, fazendo uma careta, respondera:
— Somos dezasseis. Ficaremos catorze.
Matemática simples que resolvera a questão: era difícil conseguir-se um efetivo suficiente. De mau grado, o Comandante deu ordem de avançar. Vinha por vezes juntar-se a Teoria, que caminhava em penúltima posição, para saber como se sentia. O professor escondia o sofrimento. E sorria sem ânimo.
À hora de acampar, alguns combatentes foram procurar lenha seca, enquanto o Comando se reunia. Pangu-Akitina, o enfermeiro, aplicou um penso no ferimento do professor. O joelho estava muito inchado e só com grande esforço ele podia avançar.
Aos grupos de quatro, prepararam o jantar: arroz com corned-beef. Terminaram a refeição às seis da tarde, quando já o Sol desaparecera e a noite cobrira o Mayombe. As árvores enormes, das quais pendiam cipós grossos como cabos, dançavam em sombras com os movimentos das chamas. Só o fumo podia libertar-se do Mayombe e subir, por entre as folhas e as lianas, dispersando-se rapidamente no alto, como água precipitada por cascata estreita que se espalha num lago.”
(Mayombe, fragmento)
Premiações de Pepetela
- Prêmio Nacional de Literatura (1980)
- Prêmio Especial dos Críticos de São Paulo, Brasil (1993)
- Prêmio Camões (1997)
- Prêmio Prinz Claus, na Holanda (1999)
- Prêmio Nacional de Cultura e Artes (2002)
- Prêmio Internacional da Associação dos Escritores Galegos (2007)
- Grau de doutor honoris causa pela Universidade do Algarve, Portugal (2010)
- Prêmio do Pen da Galiza Rosália de Castro (2014)
- Prêmio Fonlon-Nichols Award da Associação Africana de Literatura (2015)
- Prêmio Correntes de Escrita (2020)
Créditos das imagens
[1] Jmendez~commonswiki assumed (based on copyright claims). / Commons
[2] Editora LeYa (reprodução)