Social-democracia
A social-democracia é uma corrente política surgida na Europa, na segunda metade do século XIX. Ligada em sua gênese ao marxismo, ela se metamorfoseou ao longo do tempo, firmando-se como uma concepção de centro-esquerda, no âmbito da democracia representativa, com uma perspectiva de Estado voltada para reduzir as iniquidades sociais sem abolir o capitalismo.
Popularizou-se no século XX, no continente europeu, especialmente no pós-Segunda Guerra Mundial, quando a reconstrução dos países afetados pela guerra demandava uma participação mais ativa dos Estados. Também denominada de “socialismo democrático”, a social-democracia prioriza as reformas sociais para redistribuir renda por meio de acesso a serviços públicos gratuitos, tais como saúde, segurança, educação e previdência, bem como uma política econômica que contemple também as populações mais desassistidas. Defende também a propriedade privada e o sistema representativo. Vários países europeus têm arraigada tradição de partidos social-democratas, dentre os quais se destacam Alemanha, Suécia, França, Holanda e Espanha.
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O que é social-democracia?
A social-democracia é uma corrente política pautada pelos ideais de liberdade e igualdade. Entre seus valores básicos está a defesa da democracia representativa, das liberdades individuais, da propriedade privada e da justiça social.
Surgiu na Europa, ligada ao movimento operário, no século XIX. Como aponta Adam Przeworski, nesse período os Estados limitavam-se à função de polícia e algumas poucas regulações. Sua atuação era limitada, mas voltada a reprimir violentamente a classe operária no que reivindicavam. Então os operários perceberam que precisariam se organizar e entrar na política, caso contrário, não conseguiriam combater a repressão policial e implantar o socialismo.
Por volta de 1860, formaram-se os primeiros partidos operários. Ao longo do tempo, foi crescendo sua densidade eleitoral e eles passaram a ocupar bom número de cadeiras nos Parlamentos europeus, embora nunca ultrapassassem a metade das vagas. Ao chegarem a esse patamar de influência nos governos, sua orientação mudou. Implantar o socialismo traria altos custos políticos e sociais, então decidiram concentrar seus esforços em promover melhorias de condições de trabalho e salário. Em vez de fazer a revolução do proletariado, a decisão política dos social-democratas foi aprimorar no curto prazo a qualidade de vida dos eleitores que representavam.
Para além das preocupações sociais, observaram também que o crescimento econômico viabilizado pelo investimento privado era crucial, pois propiciava o aumento da arrecadação de impostos e, com isso, permitia maiores investimentos para os representados. Perceberam ainda que, se nacionalizassem as empresas, os investidores privados retiravam seus recursos e levavam para outros países, o que gerava crise econômica, desemprego, queda na qualidade de vida e, consequentemente, perda de cadeiras no Parlamento na eleição seguinte.
Os social-democratas concluíram, então, que precisavam do investimento privado para melhorar as condições sociais e econômicas da população, por isso decidiram reformar o capitalismo em vez de tentar implantar o socialismo. O pacto social-democrata se dá nos seguintes termos: os operários abrem mão de socializar os meios de produção, e os capitalistas abrem mão de um pouco do lucro para que seja investido na qualidade de vida das pessoas em geral. Dito em outras palavras, a coletivização da propriedade privada foi substituída pela cooperação com o capital para aumentar a produtividade e, assim, melhorar a distribuição dos ganhos.
Desse modo, convencionou-se que seria possível regular a economia capitalista, alocando recursos públicos no mercado conforme a inclinação da sociedade, sem perder de vista o critério da eficiência. Ao mesmo tempo, também seriam garantidos direitos trabalhistas, proteção contra o desemprego, previdência social, saúde, educação e outros serviços para os trabalhadores.
Como aponta o estudioso da social-democracia, Adam Przeworsky:
“A política eleitoral constitui o mecanismo pelo qual o indivíduo, enquanto cidadão, pode reivindicar seu direito a bens e serviços. Embora como produtores imediatos os trabalhadores não tenham direito legal ao produto, como cidadãos podem obter tal direito via sistema político. Ademais, novamente como cidadãos e não como produtores imediatos, podem intervir na própria organização da produção e na alocação dos lucros”. |1|
Já no século XX a social-democracia desenvolveu-se como contraponto ao marxismo revolucionário e ao liberalismo clássico. Nesse período, foi fortemente influenciada pelas teses do economista John Maynard Keynes (1883-1946), intelectual que concebeu o modelo do Estado de bem-estar social, em que o ente governamental assume o papel de organizar a economia com a dupla missão de promover o progresso econômico e oferecer aos cidadãos redes de proteção social para todas as fases da vida. O Estado de bem-estar social foi incorporado ao ideário social-democrata.
Assim, o Estado concomitantemente era o garantidor da propriedade privada e o promotor de políticas econômicas e sociais de interesse coletivo. O Estado de bem-estar social foi o modelo amplamente colocado em prática no mundo ocidental até a década de 1970. Nesse período o Estado cresceu, ampliou suas atribuições, instituições, agências regulatórias, de modo que o Estado hoje, mesmo em países de governos liberais, é expressivamente maior que o Estado do século XIX, quando os operários europeus começaram a se organizar politicamente.
Social-democracia e o socialismo
A social-democracia, originalmente, era uma vertente do socialismo, pois foi desenvolvida no seio do movimento operário do século XIX. Todavia, ao longo do processo histórico, passou a divergir dessa corrente. Ao contrário do socialismo marxista, a social-democracia não é incompatível com o capitalismo, antes, procura mitigar seus efeitos negativos por meio do sistema político. Portanto, é uma corrente política reformista, e não revolucionária, que, por meio de políticas econômicas e sociais, promove modificações pontuais no modelo econômico capitalista, porém não o substitui nem o reestrutura. Os socialistas revolucionários rechaçam esse posicionamento por acreditarem que o capitalismo seja impassível de reforma.
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Social-democracia e saúde
O ideário social-democrata identifica o acesso a serviços essenciais para uma vida digna, tais como saúde, alimentação, renda mínima, educação, saneamento, habitação, entre outros, como direitos políticos, e não como caridade pública, logo, aqueles que deles participam não podem ser enxergados como beneficiários, mas como cidadãos.
O modelo de Estado de bem-estar social de tônica social-democrata preconiza que o serviço de saúde seja universal, isto é, com ampla cobertura para todos os cidadãos; progressivo, ou seja, que promova uma transferência social para a população vulnerável; integrado a outras políticas sociais que promovam conjuntamente a qualidade de vida, tais como renda mínima, segurança alimentar, saneamento básico; e corretivo, no sentido de minorar as distorções geradas pelo mercado.
Assim como os demais serviços providos pelo Estado, na social-democracia o sistema de saúde tem por função principal diminuir as desigualdades. Exemplos de sistema de saúde pública que se encaixam na descrição acima podem ser encontrados na Inglaterra e no nosso Sistema Único de Saúde (SUS).
Social-democracia no Brasil
Embora surgida no século XIX e tendo galgado protagonismo na Europa e EUA do século XX, no Brasil a social-democracia passou a ganhar destaque durante a transição democrática, no ocaso da ditadura militar iniciada em 1964. O partido brasileiro que leva o nome de social-democrata é o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira). Ele foi formado no período da redemocratização por intelectuais de esquerda inspirados, sobretudo, pela social-democracia alemã.
Todavia, se analisarmos as características pontuadas nos tópicos anteriores, veremos que sua origem não se encaixa com os antecedentes históricos de um partido social-democrata. Os partidos com esse viés em seu início são operários, em outras palavras, partidos formados por sindicalistas. Ao se formarem, comumente têm um discurso radicalizado, porém, na medida em que participam de eleições e especialmente quando compõem um governo, tendem a se moderar.
É interessante observar a capacidade de moderação que o sistema representativo exerce sobre os partidos. Ao se submeterem ao crivo da eleição e às regras do jogo do sistema representativo, eles necessitam abrir mão de suas bandeiras mais radicais para alcançar um escopo de eleitores maior que o seu nicho inicial, o que implica representar um grupo de interesses maior que o inicial. Portanto, como afirma o cientista político Alberto Carlos Almeida, o partido brasileiro que pode ser denominado social-democrata é o PT (Partido dos Trabalhadores), que começou como um partido operário, moderou-se para alcançar um eleitorado maior, mas não perdeu de vista a identificação com a população pobre e, no governo federal, teve como características o intervencionismo na área econômica e a ampliação de políticas sociais.
Note que parte desses programas sociais foi realizada em parceria com a iniciativa privada, que também se beneficiou da gestão. A gestão federal do PSDB também foi social-democrata no sentido de intervenção econômica, estabilização da moeda, combate à hiperinflação, equilíbrio fiscal, implementação de medidas de transferência de renda e, ainda que em menor grau, esforço político de erradicação do analfabetismo. Os governos petistas deram continuidade à política econômica e um maior enfoque às questões sociais, como o combate à fome.
A diferença que se apresenta entre a experiência social-democrata no Brasil e nos países europeus é que, na Europa, o caráter reformista é explorado de maneira mais contundente, ou seja, há reformas nas leis e no sistema tributário que permitem uma distribuição mais equitativa da riqueza. No Brasil, o caráter reformista não foi preponderante, sendo substituído por políticas focais para populações vulneráveis.
Outro partido brasileiro que pode ser identificado como social-democrata é o PDT (Partido Democrático Trabalhista). Fundado por Leonel Brizola, ele carrega o ideário do trabalhismo e integra a Internacional Socialista, órgão que reúne partidos social-democratas de todo o mundo. Porém, esse partido não tem uma experiência enquanto governo federal para que seja comparado aos dois anteriores.
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Pontos positivos e negativos
É importante salientar que pontos positivos e negativos não são inerentes a um modelo de Estado, mas são resultados possíveis conforme a gestão, que poder ser ineficiente ou eficiente, o que, por sua vez, reflete a soma do modelo ao arranjo de elementos internos e externos, e não somente ao modelo em si.
→ Pontos negativos
- Alta carga tributária
- Endividamento do Estado
- Expansão continuada do tamanho do Estado
→ Pontos positivos
- Diminuição da desigualdade de renda
- Acesso amplo a bens e serviços básicos
- Melhoria na qualidade de vida
Nota
|1| PRZEWORSKY, Adam. Capitalismo e Social-democracia, 1989, p. 24.
Créditos das imagens
[1] Aécio Neves / Commons
[2] Agência Brasil /Commons