Eudaimonia

A palavra eudaimonia refere-se a uma concepção ética da Antiguidade que visa ao alcance da felicidade como finalidade moral.
A eudaimonia é a doutrina ética grega que afirma a busca da felicidade como fundamento da Ética.

As palavras eudaimonismo ou eudaimonia dizem respeito a uma doutrina que prega a felicidade como a finalidade da vida humana. Segundo Aristóteles, a felicidade é uma finalidade (telos) maior e comum a todos os seres racionais. Nessa concepção teleológica (que busca apontar finalidades para as ações práticas), todas as ações humanas ocorrem visando a alcançar algum estágio de felicidade. Essa busca, porém, não dá ao ser humano a plena liberdade de ação, pois essa deve estar em conformidade com a felicidade dos outros.

Etimologia

Eudaimonia é uma palavra de origem grega formada a partir dos vocábulos Eu (o bem ou aquilo que é bom) e Daemon (deus, ou gênio, intermediário entre os homens e as divindades superiores). Na cultura grega, o Daemon seria a entidade capaz de guiar o caminho das pessoas.

Traduções equivocadas relacionam Daemon a demônio, mas esse sentido não se sustenta. O Daemon era a entidade que traria a luz e a sabedoria divina à humanidade, por ser a ponte entre os deuses e os seres humanos. Em uma tradução livre, podemos dizer que eudaimonia é a “ética da felicidade” ou o “voltar-se para a felicidade”, pois é uma espécie de doutrina que coloca como finalidade última a sabedoria prática necessária para que o agir humano alcance o bem supremo.

A eudaimonia aristotélica está baseada na excelência da ação humana, que possibilita a virtude por meio do que Aristóteles chamou de mediania ou justa medida da ação. Uma ação virtuosa é a que se esquiva dos vícios, por falta de algo ou excesso de algo, e promove a ação prudente, capaz de levar à felicidade. Sócrates também passa, em suas falas nos diálogos platônicos, especialmente em A República, a ideia de que a virtude deve ser o fim maior das ações práticas para que se chegue a um estado de felicidade.

Aristóteles, o conhecimento e a felicidade

Para Aristóteles, a felicidade tinha relação com a vida contemplativa.

Para sermos precisos, devemos entender o que Aristóteles entende por felicidade. A felicidade deve estar em conformidade com a boa vida, e essa nada mais é que a vida contemplativa, ou a vida do filósofo. Para o filósofo e a cultura grega em geral, o trabalho não era considerado algo bom, por isso, na organização social grega, ele era reservado aos não cidadãos (escravos) e aos cidadãos produtores (artesãos).

Nessa hierarquia, logo acima dos que trabalhavam vinham os soldados, depois os políticos e, finalmente, acima de todos estava o filósofo, que deveria concentrar toda a sua energia nas atividades de contemplação do intelecto e do espírito humano. Ou seja, deveria concentrar-se no conhecimento.

Por isso, podemos chamar o eudaimonismo aristotélico de intelectualista, pois coloca como finalidade da vida humana a busca pela contemplação do conhecimento. Além de Aristóteles, o Sócrates platônico apresenta importantes reflexões acerca da eudaimonia em sua perspectiva ética baseada na virtude.

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Sócrates, a Ética e a felicidade

Sócrates relacionou a felicidade com as ações moderadas e a Justiça.

Os estudos de Ética (tal como a conhecemos hoje, ou seja, um campo do saber filosófico que estuda a moral para então determinar como a sociedade deve agir) surgiram ainda na Antiguidade Clássica, precisamente com Aristóteles, em seu livro Ética a Nicômaco. Porém, considera-se de extrema importância histórica para o surgimento da Ética outro pensador grego, Sócrates, o eterno questionador.

Sabe-se que, por meio dos diálogos platônicos, Sócrates saía pelas ruas de Atenas interrogando as pessoas sobre o que seriam valores da vida cotidiana, e muitas vezes esses questionamentos diziam respeito a valores morais como o bem e a virtude.

Suas conclusões eram sempre previsíveis: as pessoas não sabiam a verdade a respeito de tais valores, pois sempre acabavam respondendo insatisfatoriamente e contradizendo-se. Tudo o que os cidadãos atenienses sabiam advinha da moral cultural herdada socialmente, o que caracterizava um conhecimento, de certo modo, dogmático, não questionado, preconceituoso e, muitas vezes, irracional.

Podemos dizer que a defesa de Sócrates por uma busca da sabedoria geral dos cidadãos (motivo pelo qual o filósofo andava pelas ruas de Atenas conversando com as pessoas e utilizando os seus métodos — ironia e maiêutica), visava a um fim claro: a moderação, a prudência e a justiça. Para ele, ações moderadas e a justiça geral, principalmente por parte de quem governava e participava da vida pública, eram aspectos que, de algum modo, levariam as pessoas à felicidade.

Portanto, não se pode dizer que a felicidade defendida pelos antigos como maior finalidade, alcançada por meio da eudaimonia, era uma felicidade vulgar e egoísta, baseada na vida prazerosa, luxuosa e na conquista e usufruto de bens materiais. Ao contrário, era a ação baseada numa sabedoria prática, guiada pela razão, que levaria à justiça e ao bem geral.

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Eudaimonia e hedonismo

Epicuro foi o filósofo que desenvolveu o epicurismo, uma adaptação do hedonismo clássico.

Ainda na Antiguidade, surgiu outra doutrina capaz de inspirar a vida prática com vistas à conquista da felicidade, a saber, o hedonismo. O hedonismo, do grego hedonê (prazer), é a busca dos prazeres como objetivo de uma vida feliz.

O hedonismo foi modificado e disseminado entre as escolas filosóficas helenísticas, principalmente o epicurismo. Epicuro fez significativas transformações no hedonismo, pois ele submeteu a busca pelo prazer à racionalidade e à moderação. Segundo o filósofo grego, buscar os prazeres naturais com moderação era um meio de alcance da felicidade.

Há, porém, uma significativa diferença entre o hedonismo e a eudaimonia, pois ele defende a busca da felicidade por meio de ações que visem ao bem comum, o bem político, aquele defende a busca pelo prazer individual como meio de chegar à felicidade.

É importante salientar que o hedonismo antigo e o epicurismo não defendem a busca do prazer desmedido, como ocorre no hedonismo moderno propagado pelo Marquês de Sade, que evidencia o egoísmo e a indiferença com o sofrimento alheio como meios de alcance do prazer.

O hedonismo antigo é voltado para ações individuais, mas aponta a necessidade dessas ações serem racionalizadas, pensando sempre no bem, no mal e no sofrimento que o indivíduo pode causar a si , mesmo que esse seja um sofrimento indireto derivado da culpa ao causar danos aos outros.

Por fim, o que diferencia o hedonismo do eudaimonismo é a simples delimitação da ação prática, pois, num caso, o indivíduo é enxergado e valorizado, enquanto, no outro, ele tenta visar à coletividade, à política, à sociedade, ao bem geral etc.

Publicado por Francisco Porfírio
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