Romance urbano
O Romance Urbano ou de Costumes, como também é conhecido, caracteriza-se pela descrição das paixões, dos interesses e do comportamento dos membros da elite carioca brasileira no início do século XIX. O Romance Urbano pertence a um período da Literatura brasileira posterior ao Condoreirismo (terceira geração romântica) e anterior ao Romance Indianista.
A capital do Império, Rio de Janeiro, é o cenário principal das histórias de amor pelas quais passam as moças e os rapazes da corte, heróis e heroínas que se apaixonavam e precisavam superar obstáculos para, então, viver felizes para sempre.
O projeto literário do Romance Urbano
Com histórias de amores impossíveis, encontros e desencontros das personagens, os romances urbanos conquistaram um público leitor ávido e fiel, o qual se divertia com os retratos bem-humorados sobre seus valores e costumes. Incorporados aos textos, como se fizessem parte dos enredos, os leitores dos romances urbanos povoaram sua imaginação com as cenas e histórias da corte brasileira entre os anos de 1844, com a publicação do romance “A Moreninha”, de Joaquim Manuel de Macedo, e 1875, com a publicação do romance “Senhora”, de José de Alencar.
Esse perfil literário teve início ainda na década de 1830, quando os moradores da capital do Império passaram a ter outras formas de entretenimento, como a leitura de romances estrangeiros, sobretudo franceses, os quais passaram a ser publicados nos jornais na forma de folhetins.
De maneira geral, as obras do romance urbano são marcadas por histórias melodramáticas com finais quase sempre felizes. Os escritores brasileiros, com destaque para Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar, trouxeram histórias de amores idealizados e diversos elementos nacionais, como a vida na corte e os costumes da classe burguesa.
O Romance Urbano e o público
O romance urbano é considerado por alguns estudiosos como sendo um perfil literário desenvolvido não somente para tratar sobre os costumes da elite carioca, mas também desenvolvido e direcionado a esse público, já que, no início do século XIX, o número de brasileiros analfabetos chegava a 60%. Isso significa que apenas os mais abastados tinham acesso à educação como prática formal e sistematizada. Por isso, não é de se admirar que os leitores fiéis dos folhetins românticos fossem membros da elite, profissionais liberais, rapazes e moças que seguiam os hábitos das cortes europeias.
Quem vivia na corte reconhecia e aprovava o comportamento das personagens, como das jovens que se preparavam para ingressar nas festas, como se comportavam nos saraus e nos bailes, como sorriam, a respeito do que conversavam. Dessa forma, o romance urbano cumpria os papéis de representar a elite brasileira, por meio da criação de personagens à imagem e semelhança dos leitores, bem como da divulgação de valores importantes para a formação da identidade de uma sociedade em transformação.
Além disso, o diálogo estabelecido entre narrador e leitores fez com que estes se sentissem como um amigo ou parente das personagens e, consequentemente, confidentes. Essa estratégia discursiva possibilitou a discussão e a difusão de comportamentos e de valores sociais.
A linguagem do Romance Urbano
A linguagem dos autores do Romance Urbano é bastante acessível, sem muitos rebuscamentos. A descrição de cenários e personagens é uma das principais características dos autores românticos, de maneira geral.
Leia um trecho do romance “A Moreninha”, de Joaquim Manuel de Macedo, e observe de que maneira os referidos costumes e valores sociais aparecem nas obras do Romance Urbano. O trecho retrata o momento em que o jovem Augusto, em um passeio à beira-mar, declara seu amor a Carolina, uma menina de quatorze anos, conhecida como Moreninha:
Como de costume, a tarde teve de ser empregada em passeios à borda do mar e pelo jardim. O maior inimigo do amor é a civilidade. Augusto o sentiu, tendo de oferecer o braço à Srª D. Ana: mas esta lhe fez cair a sopa no mel, rogando-lhe que o reservasse para sua neta.
[...]
Em uma das ruas do jardim duas rolinhas mariscavam: mas, ao sentirem passos, voaram e pousando não muito longe, em um arbusto, começaram a beijar-se com ternura: e esta cena se passava aos olhos de Augusto e Carolina!
Igual pensamento, talvez, brilhou em ambas aquelas almas, porque os olhares da menina e do moço se encontraram ao mesmo tempo e os olhos da virgem modestamente se abaixaram e em suas faces se acendeu um fogo, que era pejo. E o mancebo, apontando para ambos, disse:
- Eles se amam!
E a menina murmurou apenas:
- São felizes.
-Pois acredita que em amor possa haver felicidade?
-Às vezes.
-Acaso, já tem a senhora amado!
-Eu?! e o senhor?
- Comecei a amar há poucos dias.
A virgem guardou silêncio e o mancebo, depois de alguns instantes, perguntou tremendo:
- E a senhora já ama também?
Novo silêncio; ela pareceu não ouvir, mais suspirou. Ele falou menos baixo:
- Já ama também?
Ela abaixou ainda mais os olhos e com voz quase extinta disse:
- Não...Não sei...talvez...
- E a quem?
-Eu não perguntei a quem o senhor amava.
-Quer que lho diga?
-Eu não pergunto.
-Posso eu fazê-lo?
-Não lho impeço.
-É a senhora.
D. Carolina fez-se cor-de-rosa e só depois de alguns instantes pôde perguntar, forcejando um sorriso:
-Por quantos dias?
-Oh! Para sempre! - respondeu Augusto, apertando-lhe vivamente o braço.
(MACEDO, Joaquim Manuel de. A Moreninha. São Paulo: FTD, 1991, p. 140-41.)