Humanismo na literatura

Na literatura, o Humanismo foi um movimento de transição entre a Idade Média e a Idade Moderna.
O Humanismo foi um movimento literário de transição

O Humanismo foi um movimento de transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, ou entre o Trovadorismo e o Renascimento. Como o próprio nome já indica, esse período literário correspondeu a ideais filosóficos, morais e estéticos que valorizavam o ser humano.

Por volta do século XIV, ou Baixa Idade Média, na Europa Ocidental, ocorreram mudanças sociais e econômicas profundas que contribuíram para o surgimento de novas formas de pensar. Essas modificações do modo de pensar não aconteceram de uma hora para outra, foram consolidando-se ao longo dos séculos anteriores até concretizarem-se em uma nova mentalidade e nova cultura. Assim, essas novas formas de pensamento influenciaram a economia, a organização do poder e a produção artística.

Contexto histórico

Com a decadência do Feudalismo, surgiu uma nova classe social, a burguesia, o que contribuiu para o surgimento de cidades e, também, para a emigração do campo para a cidade. Os burgueses, agora, competiam com a nobreza pelo poder econômico e social.

Além do surgimento da burguesia, outras mudanças marcaram esse período na Europa, entre elas, a expansão marítima, o desenvolvimento do comércio, o surgimento de pequenas indústrias, etc., e todas essas transformações foram desenvolvidas pelos humanistas. Assim, lentamente, a mentalidade medieval foi sendo deixada no passado daquela sociedade.

A nova organização social trouxe consequências para o povo, que era acostumado à servidão e, portanto, não tinha nem estudo nem qualificação profissional para atender às exigências comerciais que se consolidavam. Com isso, esse foi um período de muita fome e doenças. A epidemia da peste bubônica, conhecida como Peste Negra, por exemplo, dizimou um terço da população da Europa.

Outro fator relevante dessa nova constituição social foi a mudança do poder descentralizado, que era executado em cada feudo pelo seu nobre responsável, para um poder centralizado nas mãos do rei, ou seja, momento político chamado de Absolutismo.

Além disso, a hegemonia da Igreja foi quebrada, e sua influência sobre a sociedade, o modo de pensar, de viver e a influência nas artes passou a ser criticada, inclusive, pelos seus seguidores. Esse rompimento com a Igreja influenciou diretamenta o modo de expressão da sociedade ascendente desse período, bem como sua relação com a espiritualidade.

Outro aspecto importante foi o grande avanço científico que se realizou nessa época: o início das grandes navegações como forma de expansão comercial e territorial, a invenção da bússola, a teoria heliocêntrica provada por Galileu, o que deu ao homem uma postura mais cientificista e racionalista.

Em Portugal, o Humanismo estendeu-se entre 1434 a 1527 e teve como marco inicial a nomeação de Fernão Lopes como cronista-mor do Reino e, como marco de transição para o Renascimento, a volta do poeta Sá de Miranda da Itália, que trazia as novidades renascentistas.

Mudança do pensamento religioso

Durante séculos, a Igreja exercia uma enorme influência sobre a sociedade e seu modo de pensar. O pensamento religioso que, até então, possuía uma visão teocêntrica (teos = Deus, no centro das preocupações humanas) deu lugar a uma visão antropocêntrica (anthropos = homem, no centro das realizações do universo humano). Por ser um movimento de transição, o Humanismo apresentava tanto as características do modo medieval do pensamento quanto do novo modo de pensar religioso, ou seja, havia uma tensão entre essas duas visões, porém existia um predomínio da visão antropocêntrica.

A visão antropocêntrica via o ser humano em sua real humanidade, desconectado da visão da Igreja, passando a ser responsável por seus pensamentos e atos, sem a necessidade da permissão religiosa.

Por esse desligamento, houve um resgate das culturas greco-romanas da Antiguidade, ou seja, um resgate das culturas pagãs, o que, posteriormente, marcaria o período renascentista. Assim, houve também uma retomada de temas, valores e personagens da mitologia dos gregos e romanos.

Características gerais do Humanismo

- Transição do Teocentrismo para o Antropocentrismo;

- Cientificismo;

- Racionalidade;

- Retomada do modelo clássico das culturas da Antiguidade;

- Busca da beleza e da perfeição;

- Valorização do corpo humano e das emoções.

Produções Literárias

O período humanista possuía produções literárias que mesclavam características medievais e modernas. Entre elas, estavam:

→ Poesia Palaciana: proveniente das cantigas do Trovadorismo, possuía, porém, uma estrutura textual mais elaborada – redondilhas, ambiguidades, aliterações, assonâncias, figuras de linguagem, idealismo, sensualidade, métrica, ritmo e expressividade – e não era mais acompanhada por música, mas feita para ser recitada dentro dos palácios, para a nobreza.

Uma coletânea de poesias chamada Cancioneiro Geral reuniu 2865 autores e foi publicada em 1516. Essa organização foi realizada pelo poeta português Garcia Resende (1482-1536).

Os principais temas presentes nesse tipo de produção eram os costumes da corte, temas religiosos, satíricos, líricos e heroicos.

Exemplo de Poesia Palaciana:

Meu amor tanto vos quero,

que deseja o coração

mil cousas contra a razão.

Porque, se vos não quisesse,

como poderia ter

desejo que me viesse

do que nunca pode ser?

Mas conquanto desespero,

e em mim tanta afeição,

que deseja o coração.

(Aires Teles)

→ Prosa: A prosa humanista era divida entre as crônicas historiográficas e as crônicas ficcionais (novelas de cavalaria).

Fernão Lopes foi considerado o “pai da hisotiografia portuguesa”, pois, por meio de seus estudos e pesquisas historiográficas, relatou a vida dos principais reis de Portugal. Suas obras foram: Crônica de El-Rei D. Pedro (1434); Crônica de El-Rei D. Fernando (1436); Crônica de El-Rei D. João I (1443).

A crônica ficcional foi uma adaptação das novelas de cavalaria do Trovadorismo. Quando traduzidas, elas sofreram modificações para adequar-se ao pensamento e à realidade social da época. No período humanista, foi produzida, por exemplo, uma novela de cavalaria chamada Amadis de Gaula.

→ Teatro: Diferente da poesia e da prosa, o teatro humanista português era um teatro popular e tinha como objetivo moralizar e criticar a sociedade. Ele era dividido entre autos e farsas.

Os autos eram encenações que abordavam, principalmente, a temática religiosa. Exemplos desse tipo de obra: Auto da Barca do Inferno, Auto da Lusitânia, Auto da Visitação. Já as farsas eram encenações curtas, populares, baseadas no cotidiano e tinham um caráter cômico.

O principal autor do teatro português foi Gil Vicente. Por causa de sua influência, inclusive, esse tipo de produção literária ficou conhecida como “teatro vicentino”, e suas principais características eram: retrato dos costumes e tipos da sociedade portuguesa; crítica social; caráter universal; antropocêntrismo; retrato de personagens caricaturadas e alegóricas; retrato psicológico das personagens; presença de humor e comicidade; presença de alegorias e misticismo; caráter moralizante e satírico; temas pastoris, cotidianos, profanos e religiosos.

Exemplo do teatro vicentino:

Todo mundo e Ninguém – Gil Vicente

Ninguém: Que andas tu aí buscando?

Todo mundo: Mil cousas ando a buscar:
delas não posso achar,

porém ando porfiando
por quão bom é porfiar.

Ninguém: Como hás nome, cavaleiro?

Todo o Mundo: Eu hei nome Todo o Mundo
e meu tempo todo inteiro

sempre é buscar dinheiro
e sempre nisto me fundo.

Ninguém: Eu hei nome Ninguém,
e busco a consciência.

Belzebu: Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.

Dinato: Que escreverei, companheiro?

Belzebu: Que ninguém busca consciência.

e todo o mundo dinheiro.

Perceba a intenção moralizante que esse texto trazia com a utilização de personagens míticas, levando o leitor/espectador a uma reflexão sobre suas atitudes. Há também o uso de personagens alegóricas para representar Todo o mundo e Ninguém.

Principais autores

- Fernão Lopes;

- Garcia de Resende;

- Gil Vicente;

- Miguel de Cervantes;

- William Shakespeare;

- François Rabelais;

- Luís de Camões;

- Erasmo de Roterdã;

- Dante Alighieri;

- Francesco Petrarca;

- Giovanni Bocaccio.

Publicado por Mariana Rigonatto
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