Reforma Urbana
A Reforma Urbana é, basicamente, a promoção de uma série de políticas públicas para reordenar a lógica das cidades, democratizando suas estruturas e garantindo o seu acesso para as camadas economicamente inferiores da sociedade. Trata-se de uma perspectiva de melhorar a forma com que a cidade funciona para disponibilizar estruturas básicas em regiões periféricas, reaproveitar espaços subutilizados e ampliar as políticas de mobilidade urbana.
A luta pela reforma urbana no Brasil teve uma crescente necessidade, segundo os defensores dessa política, a partir do crescimento das cidades brasileiras, que conheceram um sistema tardio de desenvolvimento, marcado por uma industrialização acelerada e um forte êxodo rural. Para se ter uma ideia, na década de 1940, a população urbana no país era de apenas 31,2%, passando para 75% na década de 1990 e adquirindo patamares ainda mais elevados nos últimos anos.
Esse crescimento acelerado, descontrolado (quase sempre) e concentrado em um número restrito de cidades não foi acompanhado de uma política de fornecimento de infraestruturas. Além disso, a maior procura por espaços para habitação favoreceu o crescimento da especulação imobiliária, elevando o preço do solo urbano e encarecendo os imóveis. Com isso, as populações mais pobres não tiveram um grande acesso a tais localidades, o que contribuiu para o crescimento de moradias precárias, geralmente em áreas irregulares, a exemplo das favelas.
A reforma urbana no Brasil teve uma defesa mais sistemática pelos movimentos sociais a partir do início da década de 1960. No governo de João Goulart, ela chegou a entrar nas pautas de debates em conjunto com outras reformas de base, com destaque para a Reforma Agrária, o que explicitava o caráter reformista do governo “Jango”. No entanto, com o Golpe de 1964, essas pautas enfraqueceram e o projeto de Reforma Urbana (além de muitos outros) foi engavetado.
No período da redemocratização, ao longo da década de 1980, a reforma urbana entrou novamente em pauta e ganhou um maior apelo durante os debates e articulações da Constituição Federal de 1988.
Em 1985, foi criado aquele que seria considerado a principal frente de luta por essa questão no Brasil, o Movimento Nacional pela Reforma Urbana, que se iniciou com uma série de lutas locais por moradias e ganhou, gradativamente, um escopo de luta pela cidade como um espaço democrático em termos de acessos, educação, cultura, infraestrutura, saúde e segurança. Esse movimento reuniu vários grupos não institucionais, além de federações, sindicatos, arquitetos e uma grande quantidade de intelectuais.
Vale lembrar que, apesar de esses movimentos serem majoritariamente de esquerda, as políticas de reforma não necessariamente correspondem a uma perspectiva socialista, ao contrário do que muitos imaginam. Trata-se, na verdade, de uma perspectiva reformista da sociedade e que já foi até mesmo realizada em países capitalistas desenvolvidos, como é caso da França com a exemplar reforma urbana de Paris, aplicada ainda no século XIX.
Após a promulgação da Constituição Federal, os movimentos sociais iniciaram a pressão para a articulação de suas reivindicações por meio da organização do Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU). Com isso, importantes avanços foram alcançados, com destaque para a criação do Estatuto das Cidades, oficialmente sancionado em 2001. Apesar disso, ainda não houve no país uma verdadeira política que permitisse a integral ou relativa aplicação dos termos necessários para a Reforma Urbana no Brasil.
Quais são os objetivos da reforma urbana?
A reforma urbana vai muito além de conceder moradias à parcela mais pobre da população. Em sua definição, ela preconiza também a distribuição de políticas de implantação de infraestruturas, como o saneamento básico e ambiental, o maior número e qualidade de escolas, melhores condições de segurança, além de outros elementos, como o asfalto e a ordenação não concentrada de serviços públicos e particulares.
Assim, podemos enumerar os objetivos da reforma urbana da seguinte forma: a) combate à especulação imobiliária; b) diminuição do número de grandes propriedades pouco ou não utilizadas; c) combate a práticas de especulação, sobretudo através da diminuição do número de lotes vagos; d) contenção do crescimento desordenado das áreas urbanas; e) ampliação das condições de infraestrutura para áreas periféricas e com pouca atenção do Estado; f) facilitar o deslocamento, melhorando as condições de trânsito e, principalmente, a qualidade do transporte público.
Com a promoção dos megaeventos no Brasil – a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 –, os debates sobre as condições sociais das cidades ampliaram-se. No entanto, a pauta específica da Reforma Urbana foi, de certa forma, não observada pela população e ganhou pouco espaço, sobretudo nos protestos que ganharam as ruas em 2013, muito embora a questão da mobilidade urbana tenha ganhado certo espaço, principalmente pela insatisfação com os serviços de transporte público em todo o país.
Há em tramitação no Congresso vários projetos que pretendem atender às reivindicações de promoção da reforma urbana. No entanto, os movimentos sociais dessa área consideram as proposições realizadas pelos parlamentares como ruins e incipientes para as demandas de melhorias nas cidades. Os grupos de luta pela reforma urbana acreditam que ela deve ocorrer a partir de iniciativas da própria população organizada, “de baixo para cima”, através de projetos e, principalmente, de plebiscitos populares.