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Governo João Goulart

O governo João Goulart estendeu-se de 1961 a 1964 e ficou marcado pela instabilidade política, mobilização popular e encerrou-se com o Golpe Militar de 1964.
João Goulart
Em 7 de setembro de 1961, João Goulart assumiu a presidência do Brasil.[1]

O governo João Goulart foi de 1961 a 1964 e ficou marcado na história brasileira por ter sido um mandato abreviado por conta do golpe civil-militar de 1964. Esse governo ficou marcado pela radicalização e instabilidade política. As tentativas de reforma conduzidas pelo presidente eram impopulares entre as elites, que eram, naquele momento, apoiadas pelos norte-americanos, e que se organizaram com os militares para derrubar o presidente e instalar uma ditadura.

Contexto histórico do governo João Goulart

O Brasil, durante o governo de Jango, estava inserido dentro de uma fase da nossa história conhecida como Quarta República (1946-1964). Essa fase é conhecida também como a primeira experiência democrática do Brasil – embora ainda com muitas limitações. O país estava em profundas transformações e as mudanças que estavam acontecendo refletiam também no debate político.

O crescimento da participação popular na política e a fundação de partidos de massa fizeram com que as eleições presidenciais tornassem-se acirradas e que os debates e as negociações políticas fossem acaloradas. O engajamento popular encontrou, no Partido Trabalhista Brasileiro, um representante de seus interesses.

Além disso, movimentos sociais começaram a surgir no país. Os sindicatos multiplicaram-se e começaram a surgir movimentos de trabalhadores, de camponeses, de estudantes etc. As camadas populares reivindicavam que a legislação trabalhista e os direitos sociais fossem aprofundados e reformas estruturais acontecessem.

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A disputa político-partidária era feroz e crises aconteceram ao longo desse período. O partido liberal-conservador chamado União Democrática Nacional (UDN) tentou impedir a posse de dois presidentes: Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. Os militares também estavam engajados politicamente, e o racha entre direita e esquerda nas Forças Armadas (FFAAs) era visível.

Veja também: Golpe preventivo de novembro de 1955, a crise que quase impediu a posse de JK

Posse de João Goulart

Foi nesse contexto que João Goulart, chamado também de Jango, assumiu. Até agosto de 1961, ele era vice-presidente do Brasil, mas em 25 de agosto, o então presidente, Jânio Quadros, em uma tentativa de realizar um autogolpe, renunciou seu cargo. A Constituição de 1946 estipulava que Jango assumisse e foi aí que uma nova crise estourou e deu início à Campanha da Legalidade.

Membros da UDN e parte das FFAAs afirmaram que não aceitariam a posse de Jango. Grupos legalistas e apoiadores de Jango iniciaram uma campanha no país para defender a posse dele como presidente. Essa indefinição acerca da sucessão presidencial estendeu-se por dez dias e deixou o país à beira de uma guerra civil.

Jango assumiu a presidência depois que as negociações políticas encontraram a solução: realizar uma emenda constitucional que transformaria o país em uma república parlamentarista. Assim, Jango assumiria, mas teria seus poderes reduzidos. Jango, assumiu a presidência oficialmente em 7 de setembro de 1961.

Jango na presidência

Podemos dizer que o governo de Jango esteve dividido em duas fases: uma parlamentarista e outra presidencialista. A presidencialista estendeu-se de setembro de 1961 a janeiro de 1963 e, de janeiro de 1963 a março/abril de 1964, foi a fase presidencialista.

  • Fase parlamentarista

O governo parlamentarista de Jango durou cerca de 14 meses e teve fim com um plebiscito em que a população decidiu pelo retorno do presidencialismo. O parlamentarismo tirava uma série de atribuições políticas do presidente e, com isso, Jango não teve muitas possibilidades de manobras políticas.

Nessa fase, foram montados três gabinetes que evidenciam o grau de instabilidade política que se encontrava no Brasil. Os três primeiros-ministros foram: Tancredo Neves, Brochado da Rocha e Hermes de Lima. Nessa fase, Jango teve uma noção dos problemas que o país enfrentava. O país tinha uma alta dívida externa e o prazo para o seu pagamento era curto.

O país enfrentava problemas graves em áreas como a questão da terra e a educação. Os movimentos de camponeses e estudantis estavam cada vez mais inflamados. Os primeiros exigiam a realização de reforma agrária no país, enquanto que os segundos queriam a ampliação e a melhora do ensino superior do país.

A inflação era um problema desde o fim da década de 1940 e era um fator que acirrava os ânimos das classes baixa e média. Além de tudo isso, havia o racha político com o presidente tendo que fazer um trabalho de malabarista, pois a UDN atuava permanentemente para desestabilizar o governo.

Na imagem, está o presidente Jango e o primeiro-ministro Hermes de Lima (à direita de óculos).[1]
Na imagem, está o presidente Jango e o primeiro-ministro Hermes de Lima (à direita de óculos).[1]

Na economia, o governo aprovou uma lei que chamava Lei de Remessas de Lucros em 1962. Essa lei impedia que multinacionais enviassem mais de 10% de seus lucros para fora do país. Essa lei transitava no Legislativo brasileiro desde a década de 1950 e sua aprovação desagradou conservadores e grupos ligados a interesses estrangeiros no país.

O governo tentou promover o desenvolvimento e reduzir a inflação por meio de um plano de austeridade chamado Plano Trienal, mas esse plano fracassou e, em 1963, o governo abandonou sua aplicação. Na política externa, o país continuou a exercer uma política externa independente, sem sujeitar-se a interesses de norte-americanos nem de soviéticos. Com a realização do plebiscito em janeiro de 1963, o presidencialismo foi restabelecido no país.

Leia também: Populismo: uma prática política que marcou parte da experiência política brasileira

  • Fase presidencialista

A fase presidencialista do governo de Jango é marcada integralmente pelos debates causados pela proposta do governo de realizar as Reformas de Base, que eram reformas estruturais defendidas pelo governo com o objetivo de resolver problemas estruturais do país. Visavam a combater a desigualdade e abrir o caminho para ampliar o desenvolvimento nacional.

As Reformas de Base defendiam a realização de reforma agrária, tributária, bancária, urbana, educacional e eleitoral. Dentre todas as reformas defendidas nesse programa, a mais bem elaborada e a que resultou em um debate político gigantesco foi a reforma agrária. Essa reforma defendia a desapropriação de propriedades rurais maiores de 500 hectares que não estavam sendo utilizadas.

O debate pela reforma agrária estendeu-se por parte considerável do ano de 1963. Isso porque a Constituição de 1946 estipulava que a reforma agrária só poderia ser realizada mediante indenização em dinheiro para quem tivesse sua terra desapropriada. O governo, por sua vez, tentava negociar a realização de uma emenda constitucional que o permitiria indenizar aqueles que tivessem suas terras desapropriadas com títulos da dívida pública atualizados de acordo com a inflação.

As negociações pela realização da reforma agrária travou o governo e fez com que Jango fosse perdendo sua base de apoio a partir de 1963. Inúmeros políticos do Partido Social Democrático (PSD) abandonaram o governo e juntaram-se à UDN, o partido da oposição. Isso porque inúmeros políticos desse partido estavam ligados a interesses de latifundiários e os termos do governo não agradavam os interesses desses políticos.

Enquanto o debate político acontecia, o interior do país radicalizava-se, sobretudo pela ação das Ligas Camponesas, grupos de trabalhadores rurais que defendiam a reforma agrária. O número de sindicatos de camponeses no país disparou assustadoramente o que evidenciou o engajamento político dessa classe.

Conspiração contra João Goulart

No meio de todos esses acontecimentos, uma conspiração que mobilizava grupos civis, militares e interesses dos Estados Unidos estava em curso. O governo americano considerava o governo de João Goulart muito à esquerda e, por isso, passou a financiar grupos conservadores e reacionários para desestabilizar politicamente Jango. Descobriu-se, na época, que o governo americano financiou centenas de candidaturas conservadoras nas eleições de 1962.

A interferência americana na política brasileira contribuía para deixar o cenário mais instável do que já estava. Havia mobilização popular no campo e nas grandes cidades, a briga política era intensa e parte dos militares defendiam a implantação de um governo autoritário para impor um programa de desenvolvimento econômico no país.

Um grande nome da oposição era Carlos Lacerda, político da UDN, governador da Guanabara (antigo Distrito Federal) e um grande agitador político. No lado da esquerda, estava Leonel Brizola, cunhado de Jango e um trabalhista ardoroso, que defendia a implantação das Reformas de Base de maneira inflexível. A ação dos dois contribuía para acirrar mais ainda os ânimos no país

Na época, surgiram dois grupos que tiveram papel relevante na desestabilização do governo: o Ibad e o Ipes. O Ibad, Instituto Brasileiro de Ação Democrática, foi o grupo envolvido no financiamento de candidaturas conservadoras na eleição de 1962, e o Ipes foi um instituto que mobilizou grupos do grande empresariado brasileiro que se uniram para derrubar Jango.

O Ipes, Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais, começou a produzir conteúdo difundindo a ideia da “ameaça comunista” no Brasil. O Ipes também atuava no financiamento de grupos de oposição ao governo e atuou diretamente na formação de um governo autoritário que seria implantado depois que Jango fosse derrubado. A tese da “ameaça comunista” já foi desmitificada pelos historiadores atualmente, sobretudo pela constatação de que Jango era ideologicamente vinculado ao trabalhismo.

Nesse turbilhão de acontecimentos, Jango, claramente, começou a enfraquecer-se na posição de presidente. Em setembro de 1963, militares rebelaram-se e realizaram a Rebelião dos Sargentos, que contou com 600 militares que invadiram e tomaram alguns prédios governamentais. Em outubro de 1963, João Goulart decretou estado de sítio no país em resposta a uma declaração de Carlos Lacerda.

O primeiro acontecimento mostrou que conquistar Brasília era extremamente fácil, e o segundo acontecimento mostrou que o presidente estava perdido. O decreto do estado de sítio conseguiu desagradar esquerdistas e direitistas e foi retirada dias depois.

Acesse também: Governo Dutra: primeiro governo brasileiro após 1945

Golpe de 1964

Em 1964, a situação do país continuava tensa. Os grupos que conspiravam contra Jango tinham uma estratégia de derrubada do governo avançada. E Jango, vendo-se politicamente atado e sem conseguir realizar suas reformas, resolveu guinar seu governo à esquerda, em 13 de março de 1964, no conhecido discurso da Central do Brasil.

Nesse discurso, Jango reafirmou publicamente seu compromisso de realizar, a todo custo, as Reformas de Base. A resposta conservadora não tardou e, em 19 de março, meio milhão de pessoas mobilizadas por grupos direitistas realizaram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Nessa marcha, houve inúmeros pedidos de tomada do poder pelos militares.

Na virada de 31 março para 1º de abril de 1964, um levante militar iniciou-se em Juiz de Fora. Esses militares marcharam para o Rio de Janeiro, tomaram a cidade e nenhum tipo de resistência governamental aconteceu. Jango foi instado a resistir, mas negou-se para evitar uma guerra civil. Em 2 de abril de 1964, o golpe foi completado quando Auro de Moura, presidente do Senado, decretou vaga a presidência do Brasil.

Dias depois, foi decretado o Ato Institucional nº 1 e Humberto Castello Branco assumiu a presidência dando início a 21 anos de ditadura no Brasil.

Créditos da imagem:
[1] FGV/CPDOC

Publicado por Daniel Neves Silva
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