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Murilo Rubião

O escritor mineiro Murilo Rubião notabilizou-se como um dos mais importantes contistas da história da literatura brasileira, apesar de ter publicado somente 33 contos. Seu estilo original, sempre apresentando ao leitor enredos inusitados, que contrariam a ordem de um mundo governado pela lógica racional, fez com que se tornasse o autor mais significativo da literatura filiada ao chamado realismo fantástico.

Leia também: Mário de Andrade – grande contista da primeira fase do modernismo

Biografia de Murilo Rubião

Murilo Rubião nasceu na cidade de Silvestre Ferraz, hoje Carmo de Minas (MG), em 1º de junho de 1916. Após ter estudado nas cidades de Conceição do Rio Verde e em Passa Quatro, concluiu, em 1928, o curso primário no Grupo Escolar Afonso Pena, em Belo Horizonte. Em 1935 concluiu o bacharelado em Humanidades, no Colégio Arnaldo, na capital mineira, tendo sido orador da turma.

Em 1938, quando cursava Direito, atuou no Diretório dos Estudantes da Faculdade de Direito da Universidade de Minas Gerais, como vice-presidente e depois como presidente; e no Diretório Central da UFMG, como tesoureiro. Nesse mesmo ano, fundou, juntamente com um grupo de escritores estudantes, a revista “Tentativa”.

Sempre muito politizado, em 1939, Murilo Rubião participou da fundação da União Estadual dos Estudantes de Minas Gerais, tendo sido um de seus presidentes. Ainda nesse ano, tornou-se redator da Folha de Minas, função que exerceu por mais de dez anos. Em 1940, tornou-se redator da revista Belo Horizonte. Em 1942, formou-se em Direito e foi escolhido diretor da Associação dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais.

No ano de 1943, foi designado Diretor da Rádio Inconfidência de Minas Gerais e convidado para lecionar no Colégio Arnaldo, onde estudou, e no Colégio Sagrado Coração de Jesus. Em 1945, foi escolhido para chefiar a delegação de escritores de Minas Gerais ao I Congresso Brasileiro de Escritores, realizado em São Paulo, do qual foi um dos seus vice-presidentes. Nesse mesmo ano, foi eleito Presidente da Associação Brasileira de Escritores de Minas Gerais.

Funcionário público, Murilo Rubião também atuou como chefe de gabinete de Juscelino Kubitschek, então governador de Minas Gerais e, durante cinco anos, atuou como chefe do escritório de Propaganda e Expansão Comercial do Brasil em Madri, onde foi também adido à embaixada brasileira. Como jornalista, criou, em 1966, o Suplemento Literário do diário oficial de Minas Gerais.

Murilo Rubião morreu em Belo Horizonte, em 1991.

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Principais obras

Em vida, Murilo Rubião publicou os seguintes livros, todos eles de contos:

  • O ex-mágico (1947);
  • A estrela vermelha (1953);
  • Os dragões e outros contos (1965);
  • O pirotécnico Zacarias (1974);
  • O convidado (1974);
  • A Casa do Girassol Vermelho (1978);
  • O homem do boné cinzento (1990).

Veja também: Crônica narrativa – narrativa curta inspirada pelo cotidiano

Conto “O ex-mágico da taberna Minhota”

Capa da nova edição da obra completa de Murilo Rubião, lançada em comemoração a seu centenário. [1] (imagem principal)
Capa da nova edição da obra completa de Murilo Rubião, lançada em comemoração a seu centenário. [1] 

O conto “O ex-mágico da taberna Minhota”, narrativa publicada pela primeira vez no livro O ex-mágico (1947), primeira obra de Murilo Rubião, apresenta como protagonista um mágico com poderes surpreendentes, mas que se manifestam de modo incontrolável. Com foco narrativo em primeira pessoa, o protagonista, que, além de mágico, é funcionário público, expõe as situações estranhas pelas quais passa, como se observa neste trecho:

“Às vezes, sentado em algum café, a olhar cismativamente o povo desfilando na calçada, arrancava do bolso pombos, gaivotas, maritacas. As pessoas que se encontravam nas imediações, julgando intencional o meu gesto, rompiam em estridentes gargalhadas. Eu olhava melancólico para o chão e resmungava contra o mundo e os pássaros.

Se, distraído, abria as mãos, delas escorregavam esquisitos objetos. A ponto de me surpreender, certa vez, puxando da manga da camisa uma figura, depois outra. Por fim, estava rodeado de figuras estranhas, sem saber que destino lhes dar.

Nada fazia. Olhava para os lados e implorava com os olhos por um socorro que não poderia vir de parte alguma.”

As mágicas que o narrador faz, como tirar do bolso “pombos, gaivotas, maritacas” ou tirar da manga da camisa “figuras estranhas”, apesar de causarem no público gargalhadas e surpresa, provocam-lhe um sentimento de melancolia e desespero, a ponto de implorar "com os olhos por um socorro que não poderia vir de parte alguma”.

O sentimento de angústia e de inquietação, como evidenciado nesse trecho da narrativa, é constante ao longo do conto “O ex-mágico da taberna Minhota”, assim como se faz presente em outros contos do autor, considerado o mais importante escritor brasileiro de narrativas fantásticas, gênero do qual foi pioneiro no país.

O desfecho do conto confirma essa estética literária fantástica, já que o narrador-personagem, ao não ser mais capaz de fazer mágicas, em vez de se sentir bem, já que as mágicas que fazia lhe provocavam inquietações psicológicas, sente-se mal por isso: “Tive que confessar minha derrota. Confiara demais na faculdade de fazer mágicas e ela fora anulada pela burocracia”.

Características literárias

Os contos de Murilo Rubião, distribuídos em sete livros publicados em vida e em obras que reúnem em uma só edição seus textos narrativos, expressam características literárias ligadas ao chamado realismo fantástico ou realismo mágico. Trata-se de uma vertente literária caracterizada pela construção de enredos marcados por situações inexplicáveis, inusitadas, absurdas, as quais contrariam a lógica racional. Produz-se, assim, um efeito de estranhamento no leitor, que se defronta com enredos ilógicos contextualizados em situações cotidianas.

Ao longo de sua carreira como escritor, Murilo Rubião escreveu, em jornais e revistas, cerca de 50 contos. Porém, por ser muito perfeccionista, publicou somente 33 contos em livros, pois preferia reescrevê-los, objetivando aperfeiçoá-los, a lançar novos contos e novas obras. Deixou, portanto, uma obra enxuta e extremamente lapidada, que o situa como um dos mais importantes contistas brasileiros.

  • Linguagem de Murilo Rubião

A linguagem recorrente na obra de Murilo Rubião é a objetiva, o que faz com que o leitor seja lançado sem rodeios em enredos intrigantes, os quais são evidenciados de forma direta, contribuindo, assim, para o processo de naturalização das situações estranhas vivenciadas por suas personagens.

  • Narradores

Os narradores dos contos de Murilo Rubião têm papel central na narrativa, não só por conduzirem o leitor na trama, mas por serem, geralmente, os protagonistas, os quais estão imersos no contexto fantástico, sendo afetados psicologicamente, mesmo que o elemento estranho seja naturalizado.

No conto “O ex-mágico da taberna Minhota”, o narrador, por exemplo, expressa a angústia de não encontrar a menor explicação para sua presença no mundo ao ver seus poderes mágicos desaparecerem a partir do momento em que se torna funcionário público.

Outro significativo exemplo de narrador que expõe suas inquietações encontra-se no conto “O Pirotécnico Zacarias”. Nesse conto, o narrador-personagem – um morto-vivo – mostra-se intrigado com sua própria morte, tecendo, ao longo da narrativa, reflexões sobre sua condição:

"Em verdade morri, o que vem ao encontro da versão dos que creem na minha morte. Por outro lado, também não estou morto, pois faço tudo o que antes fazia e, devo dizer, com mais agrado do que anteriormente".

  • Epígrafes

O uso de epígrafes (citações constantes no início de uma obra) é um recurso muito utilizado por Murilo Rubião em seus contos. O autor tende, por exemplo, ao uso sistemático de epígrafes bíblicas, geralmente extraídas do Antigo Testamento. Apesar do uso de passagens de um texto religioso, não há, por parte do autor, o interesse de professar a fé cristã. Trata-se, antes de tudo, de uma citação que pode ampliar os sentidos do texto.

No conto “O ex-mágico da taberna Minhota”, por exemplo, há a epígrafe “Inclina, Senhor, o teu ouvido, e ouve-me; porque eu sou desvalido e pobre.”(Salmos. LXXXV, I), que antecipa, metonimicamente, as angústias do personagem-narrador, que se verá desvalido e pobre ao perceber que não é mais capaz de fazer mágicas.

Crítica literária

A crítica literária brasileira filia a obra de Murilo Rubião ao chamado realismo fantástico, em razão de seus 33 contos apresentarem traços sobrenaturais, ou seja, neles o mistério e o mágico entrelaçam-se com traços identificáveis da realidade empírica (a realidade concreta). Em entrevistas, Murilo Rubião não escondia o apreço e admiração por esse tipo de literatura, revelando seu interesse pelo escritor alemão E. T. A. Hoffmann (1776-1822) e pelo americano Edgar Allan Poe (1809-1849), ambos mestres na arte do conto.

Capa da nova edição da obra completa de Murilo Rubião, lançada em comemoração a seu centenário. [1] (imagem principal)
Capa da nova edição da obra completa de Murilo Rubião, lançada em comemoração a seu centenário. [1] (imagem principal)

É comum também que os estudiosos de literatura associem o estilo de Rubião ao do escritor Franz Kafka (1883-1924), autor de A metamorfose (1915). Nessa obra, o protagonista vê-se transformado em um inseto gigante, e sua família, apesar do espanto inicial, acaba naturalizando a situação. Tal naturalização diante do sobrenatural é comum em muitos contos de Murilo Rubião, por isso o paralelo entre esses escritores é tão recorrente.

Leia também: Memórias póstumas de Brás Cubas – narrativa do realismo com traços fantásticos

Frases

Tornaram-se famosas duas frases de efeito do conto “O ex-mágico da taberna Minhota”, em razão do pessimismo que expressam acerca da burocracia que tende a envolver o funcionalismo público:

“Hoje sou funcionário público e este não é o meu desconsolo maior.”

“Ouvira de um homem triste que ser funcionário público era suicidar-se aos poucos.”

Crédito da imagem

[1] Companhia das Letras (Reprodução)  

Publicado por Leandro Guimarães
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