Florestan Fernandes
Florestan Fernandes foi um sociólogo e político brasileiro. Sua biografia foi marcada por ser um dos primeiros sociólogos de destaque formados pelo primeiro curso superior de Sociologia do Brasil, fundado em 1933, na Fundação Escola Superior de Sociologia e Política de São Paulo (FESSP), órgão que pertence, desde 1934, à Universidade de São Paulo (USP).
Florestan Fernandes lecionou sociologia na USP, foi exilado durante a ditadura militar brasileira e, após seu retorno ao Brasil e a redemocratização da política brasileira, foi eleito deputado federal, cumprindo dois mandatos.
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Biografia de Florestan Fernandes
Florestan Fernandes nasceu em 1920, na cidade de São Paulo. Filho único de mãe solteira, Florestan foi criado em cortiços da capital paulista com a ajuda de sua madrinha, Hermínia Bresser. Ela era patroa de sua mãe, que trabalhava como empregada doméstica. Foi na casa de Hermínia Bresser que Florestan conheceu os livros e percebeu a importância do estudo. A sua origem pobre despertou-o para a importância de analisar-se a disparidade de classes sociais presente no Brasil.
Ainda cursando o primário (que hoje corresponde à primeira fase do Ensino Fundamental), Fernandes teve que largar os estudos para trabalhar e complementar a renda familiar (que era composta apenas pela renda de sua mãe). Foi engraxate, trabalhou em uma padaria e em um restaurante.
No entanto, o jovem pensador jamais abandonou o gosto pelo estudo e pelos livros. Seu retorno aos estudos formais deu-se em 1937, quando tinha 17 anos. Ele fez um curso de educação básica acelerada, parecido com o que chamamos hoje de supletivo, ficando apto a concorrer a uma vaga no Ensino Superior.
Aos 21 anos de idade, Florestan Fernandes ingressou no curso de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo, obtendo título de bacharel em 1943 e de licenciado em 1944. Seguindo a carreira acadêmica, o sociólogo cursou seu mestrado em Antropologia, também pela USP. Nesse momento, ele iniciou uma intensa pesquisa etnográfica que resultou na dissertação A organização social dos Tupinambá, defendida em 1947.
Antes da conclusão de seu mestrado, o sociólogo tornou-se assistente de ensino de seu orientador na USP, o professor Fernando Azevedo. Também nessa época iniciou sua a atuação política, quando filiou-se ao Partido Socialista Revolucionário (PSR), extinto partido de esquerda brasileiro. No ano de 1951, Florestan Fernandes concluiu e defendeu sua tese de doutorado, intitulada A função social da guerra na sociedade Tupinambá.
No ano de 1953, com a saída do sociólogo francês Roger Bastide da USP, Florestan Fernandes ocupou seu lugar ingressando como professor titular na instituição. Destacando-se como um brilhante acadêmico, em 1964, Fernandes defendeu sua tese de livre docência, que mais tarde se tornaria o célebre livro A inserção do negro na sociedade de classes. Percebe-se aqui uma mudança de visão sociológica e de objeto de estudo, que mudou do índio tupinambá para a questão étnico-racial no capitalismo.
Por conta da atuação política em um partido de esquerda por meio da militância pelos desfavorecidos e da atuação docente, Florestan Fernandes foi preso em 1964, quando estourou o golpe provocado pelos militares.
Em 1969, poucos meses após a promulgação do Ato Institucional número 5 (o AI-5) — tal medida derrubava os direitos civis e constitucionais e permitia a prisão sem flagrante ou prévia investigação, inviabilizava o habeas corpus e permitia a cassação de mandatos políticos, entre outras atrocidades —, Fernandes foi preso novamente, destituído de seu cargo na USP e mandado para o exílio, retornando somente em 1972.
No período de exílio, o sociólogo viveu e lecionou nos Estados Unidos e no Canadá, o que alavancou a sua carreira também fora do Brasil, tanto o é que, em 1977, ele lecionou como professor convidado na tradicional Universidade de Yale. Também nesse ano, regressando novamente ao Brasil, Fernandes tornou-se professor titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Em 1979, Fernandes ofereceu um curso de férias na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, seu antigo ambiente de trabalho. O que era para ser um simples curso sobre a experiência do sociólogo em Cuba, tornou-se uma visão bastante singular sobre o socialismo que mesclava as interpretações clássica e moderna do marxismo.
Na década de 1980, o sociólogo filiou-se ao recém-nascido Partido dos Trabalhadores (PT), sendo eleito deputado federal constituinte em 1986 e deputado federal em 1990, permanecendo na Câmara dos Deputados até o fim de seu segundo mandato, em 1994. Desde 1989, o sociólogo escreveu para uma coluna semanal no jornal Folha de São Paulo, falando sobre política, educação, sociologia e as questões sociais do Brasil.
Seus mandatos na Câmara dos Deputados ficaram marcados pelo trabalho em prol da educação pública, gratuita e de qualidade, e pela defesa do direito das populações marginalizadas e da redução das desigualdades sociais.
A importância de Florestan Fernandes na defesa da educação pública e na dos direitos pode ser medida por sua participação na elaboração da Constituição Federal de 1988 como deputado constituinte e por sua participação na elaboração da lei 9394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB).
Em 1994, Fernandes enfrentava problemas de saúde relacionados ao seu fígado. Em 1995, o sociólogo precisou ser internado por complicações do seu quadro de saúde e passou por um transplante de fígado, aos 75 anos de idade, que, infelizmente, terminou com o seu falecimento, no dia 10 de agosto de 1995.
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A questão racial
Embora os primeiros trabalhos de Florestan Fernandes versem sobre problemas específicos das aldeias Tupinambá, afinal eram voltados para os estudos antropológicos, o grande marco de sua obra está em sua tese de livre docência, publicada em forma de livro, A inserção do negro na sociedade de classes. Apesar da mudança de recorte, Fernandes não deixou de ver o índio, como um não branco, sendo excluído no cenário capitalista de sua época.
A obra madura de Florestan Fernandes, como um todo, enxerga uma intersecção entre classe social e cor, ou seja, enxerga que a população mais pobre, marginalizada e excluída é, em geral, a população não branca.
O sociólogo foi bem preciso ao derrubar o que se chamou de mito da democracia racial, ideia extraída da obra de outro sociólogo, Gilberto Freyre, que via uma relação cordial entre senhores e escravos no Brasil Colonial e via uma relação diferente entre negros e brancos brasileiros no século XX, em relação a outros países, como os Estados Unidos. Fernandes, por sua vez, enxergou que a população negra era a mais atingida pela desigualdade social e que a raiz disso se encontrava no capitalismo.
Desigualdade social
A questão da desigualdade social é central na obra e na militância de Florestan Fernandes. Inclusive, sua atuação como parlamentar foi voltada para a redução da desigualdade social no Brasil.
O sociólogo viveu na periferia quando criança, morando em guetos de São Paulo. Desde sua infância, quando trabalhava para ajudar a sua mãe, Fernandes percebeu que os empregos e a renda das pessoas das periferias eram drasticamente inferiores e que havia um tratamento diferente dado ao povo desses lugares.
Fernandes percebeu a quase imperiosa impossibilidade de haver uma ascensão social das pessoas negras no sistema capitalista. Ele percebeu, em sequência, que se o capitalismo promove justamente a desigualdade social, a população negra no Brasil sempre estaria na margem da sociedade, se considera-se a manutenção do sistema capitalista. Nesse sentido, é necessária uma tomada de posição em relação ao capitalismo para que haja um sistema realmente democrático de maior igualdade social.
Democracia
Florestan Fernandes era um defensor convicto da democracia. Muitos opositores no campo político tentavam desqualificar o sociólogo enquanto democrata por sua posição política socialista. No entanto, ao analisar-se sua vida e obra, percebe-se que o que ele defendia era a democracia como reconhecimento dos direitos de todos os cidadãos.
Na visão de Fernandes, a democracia brasileira não era completa, pois não chegava à periferia, às camadas mais pobres da população. Uma democracia efetiva seria aquela que levasse a todos o direito à alimentação, à moradia e à educação.
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Educação
A educação é a peça-chave para promover-se uma verdadeira democracia no Brasil, que reduza as desigualdades sociais e permita uma relação mais democrática para a nação como um todo. Defensor da educação, Fernandes lutou enquanto político para promover um sistema que garantisse escolas laicas, públicas, gratuitas e de qualidade para todos os jovens do Brasil.