Belle Époque
O período conhecido pela expressão francesa Belle Époque, “Bela Época”, em português, compreende cerca de quarenta e três anos, tendo início após a Guerra Franco-Prussiana, de 1870-71, que resultou na unificação da Alemanha, e terminando com o advento da Primeira Guerra Mundial, em julho de 1914. Como veremos abaixo, a Belle Époque foi uma era efusiva em que a crença no progresso civilizacional e no desenvolvimento tecnocientífico dava a tônica do momento.
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Belle Époque e modernidade: entusiasmo e euforia com o progresso
Sabemos que o processo de industrialização na Europa e também no Norte dos Estados Unidos começou a ter um amplo desenvolvimento ainda durante a primeira metade do século XIX. Esse desenvolvimento possibilitou a mecanização do trabalho, antes manual e manufaturado, e a consequente produção em larga escala de bens de consumo (comida e vestimentas em geral), transportes (trens e navios a vapor, bondes elétricos, automóveis) e bens de produção (maquinários de diversas ordens). Nessa esteira, na segunda metade do século XIX e nos primeiros anos do século XX, maiores avanços tecnocientíficos foram conseguidos, como o advento da medicina higienista de Louis Pasteur e da microbiologia.
Tudo isso provocava uma euforia com o progresso, uma fé na ciência e na tecnologia que dava à população da época a nítida certeza de que vivia um período exuberante e frenético. O mundo começava também a se integrar globalmente em razão de invenções como o telégrafo transcontinental. O historiador Philip Blom, em sua obra Anos vertiginosos: mudança de cultura no Ocidente – 1900-1914, mostra claramente a sensação que era percebida naquela época:
Velocidade e euforia, angústia e vertigem eram temas recorrentes entre 1900 e 1914, quando as cidades explodiram em suas dimensões e as sociedades foram transformadas, a produção em massa entrou para a vida cotidiana, os jornais tornaram-se impérios das comunicações, o público de cinema contava-se às dezenas de milhões e a globalização trazia aos pratos dos britânicos carne da Nova Zelândia e cereais do Canadá, aniquilando a venda de velhas classes fundiárias e promovendo a ascensão de novos tipos: engenheiros tecnocratas, as classes urbanas. [1]
Para Blom, o caráter vertiginoso desses anos de Belle Époque exprimia também a própria essência do que era ser moderno, no sentido de ruptura com as bases da cultura tradicional do Ocidente. Segundo esse historiador:
[…] A modernidade não emergiu virgem nas trincheiras de Somme. Muito antes de 1914, já se afirmava solidamente nas mentes e nas vidas da Europa. A primeira Guerra não funcionou como elemento gerador, mas catalisador, forçando velhas estruturas a ruir mais rapidamente e novas identidades a se afirmar mais facilmente. [2]
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Sociedades de massa, arte moderna e transformação dos sentidos
O grande símbolo dessa atmosfera de modernização que caracterizou a Belle Époque foi a chamada Exposição Universal (Exposition Universelle, em francês), realizada em 1900, em Paris. Essa exposição consistia em uma feira aberta de mostras tecnológicas e culturais que ocorria em vários pontos da capital francesa. O objetivo era render homenagens e fazer demonstrações do que havia sido inventado, dos aparatos técnicos da última leva, da nova moda de vestimentas, novos monumentos públicos e a nova arte (geralmente no estilo Art nouveau) etc. Os principais centros urbanos e culturais dessa época, além de Paris, eram Viena, Berlim e Londres.
Propaganda de uma fábrica de roupas da moda parisiense da Belle Époque
A formação desses centros urbanos inundados de inovações tecnológicas, como o telégrafo, o automóvel, os trens e bondes elétricos, o fonógrafo e gramofone, o telefone, a fotografia e, principalmente, o cinema, acabou por modelar também o comportamento e os sentidos humanos. Isso teve uma repercussão muito grande na arte. Movimentos das artes plásticas, como o impressionismo e o expressionismo, nasceram da necessidade de se representar a realidade de modo a captar algo diverso do que a fotografia já era capaz de fazer.
Outras formas de arte tipicamente modernistas, como o cubismo de Picasso, buscavam recursos das culturas primitivas de outros continentes, como a África. A própria aura tecnológica foi um modelo imitado pela pintura, no caso dos futuristas, como Giacomo Balla, que procurava passar a impressão de velocidade em seus quadros.
Contudo, esse entusiasmo da Belle Époque teve os seus críticos, que, de um modo ou de outro, previram certos efeitos que seriam colhidos com a grande catástrofe que foi a Primeira Guerra Mundial. Um deles foi o psiquiatra austríaco Sigmund Freud, que percebeu os problemas que as sociedades de massa, integradas pelos meios de comunicação e pelo alto desenvolvimento industrial, poderiam provocar. A rivalidade entre as nações, pautada no ressentimento de conflitos e divergências passados, foi um desses problemas.
NOTAS
[1] BLOM, Philip. Anos vertiginosos: mudança de cultura no Ocidente – 1900-1914. trad. Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2015. pp. 15-16.
[2] Ibid. p. 16.
[3] Ibid. p. 338.