Cruz e Sousa
Cruz e Sousa, principal nome do Simbolismo brasileiro, nasceu em 24 de novembro de 1861. Filho de escravos alforriados, teve acesso à educação formal graças ao apadrinhamento do ex-“dono” de sua mãe. Durante toda a sua vida, sofreu com o preconceito racial, mas lutou contra a escravidão e o racismo. Para sobreviver, trabalhou na Companhia Dramática Julieta dos Santos e, mais tarde, na Estrada de Ferro Central do Brasil, quando adquiriu tuberculose, o que o levou à morte em 19 de março de 1898.
O poeta publicou seus dois primeiros livros — Missal e Broquéis — em 1893. Como características simbolistas de suas obras, é possível apontar a ocorrência de sinestesia, misticismo, rigor formal, pessimismo e maiúscula alegorizante. Como características individuais, é possível notar a angústia, a presença da cor branca (possivelmente, como símbolo de pureza), além da temática da pobreza, do preconceito racial e da morte.
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Biografia de Cruz e Sousa
Cruz e Souza (João da Cruz e Sousa) nasceu em 24 de novembro de 1861, em Florianópolis, no estado de Santa Catarina. Seu pai (Guilherme da Cruz) era pedreiro, e sua mãe (Carolina Eva da Conceição), lavadeira, ambos escravos alforriados.
O menino recebia educação formal devido ao apadrinhamento do coronel Guilherme Xavier de Sousa, antigo “dono” da mãe do autor e de quem o menino herdou o sobrenome Sousa. Aos 8 anos já fazia versos. Em 1874, Cruz e Sousa ingressou no Ateneu Provincial Catarinense, colégio da elite local da época. Nessa escola, como bolsista, o jovem poeta destacou-se como aluno.
Em 1881, trabalhou na Companhia Dramática Julieta dos Santos e fundou, com amigos, o jornal Colombo. A partir de então, o poeta dedicou-se à causa abolicionista. Alvo de preconceito racial desde a infância, foi impedido, por ser negro, de assumir o cargo de promotor em Laguna, em 1884, apesar de sua nomeação.
O Dante Negro ou o Cisne Negro, introdutor do Simbolismo no Brasil, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1890 e lançou seu primeiro livro em 1893 — Missal. Paralelamente a seu trabalho de escritor, inclusive com publicações em jornais, Cruz e Sousa, para sobreviver, trabalhou na Estrada de Ferro Central do Brasil, mas adquiriu tuberculose e morreu em 19 de março de 1898.
Cruz e Sousa teve seu corpo transportado de Minas Gerais, onde buscava recuperar-se da doença, até o Rio de Janeiro, em um vagão de transporte de animais. Seu enterro foi custeado por amigos como José do Patrocínio (1853-1905).
Estilo literário de Cruz e Sousa
Cruz e Sousa é o escritor responsável por inaugurar o Simbolismo no Brasil. Portanto, suas obras possuem as seguintes características:
- Pessimismo diante da realidade
- Antipositivismo
- Sinestesia
- Alienação social
- Poder de sugestão
- Antirromantismo
- Misticismo
- Crença em um mundo ideal
- Sondagem interior
- Uso de reticências
- Musicalidade
- Maiúscula alegorizante
- Rigor formal
No entanto, os poemas de Cruz e Sousa possuem algumas peculiaridades:
- Profundidade filosófica
- Angústia metafísica
- Obsessão pela cor branca
- Temática social: pobreza e preconceito
- Morbidez
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Obras de Cruz e Sousa
- Missal (1893)
- Broquéis (1893)
- Evocações (1898)
- Faróis (1900)
- Últimos sonetos (1905)
- Poemas inéditos (1996)
- Últimos inéditos (2013)
Poemas de Cruz e Sousa
No soneto “Sonho branco”, do livro Broquéis de Cruz e Sousa, o eu lírico personifica e descreve o sonho, que está vestido “de linho e rosas brancas”. Tal sonho é virgem, puro, no peito do eu lírico. Além disso, é o deus do luar e nascido das estrelas. Ele segue por um caminho branco e florido, onde as aves cantam. No entanto, em contraste com a sua alegria, está a sua morte iminente:
Sonho Branco
De linho e rosas brancas vais vestido,
Sonho virgem que cantas no meu peito!...
És do Luar o claro deus eleito,
Das estrelas puríssimas nascido.
Por caminho aromal, enflorescido,
Alvo, sereno, límpido, direito,
Segues radiante, no esplendor perfeito,
No perfeito esplendor indefinido...
As aves sonorizam-te o caminho...
E as vestes frescas, do mais puro linho
E as rosas brancas dão-te um ar nevado...
No entanto, ó Sonho branco de quermesse!
Nessa alegria em que tu vais, parece
Que vais infantilmente amortalhado!
Como características de estilo, é possível apontar:
- rigor formal (metrificação — versos decassílabos — e rimas);
- maiúsculas alegorizantes (“Luar” e “Sonho”);
- presença da cor branca (“rosas brancas”, “claro deus”, “alvo”, “ar nevado” e “Sonho branco”);
- sinestesia — combinação de dois ou mais sentidos físicos (“brancas”, “radiante” e “esplendor” — visão; “cantas” e “sonorizam” — audição; “aromal” — olfato; “frescas” e “nevado” — tato);
- pessimismo (no último verso);
- uso de reticências para dar um tom vago e impreciso.
Já no poema “Lésbia”, também do livro Broquéis, a mulher lésbica é comparada a um arbusto “selvagem”, “planta mortal, carnívora”. O poema está centrado na sexualidade dessa mulher e caracteriza o amor por ela sentido como “trágico e triste”, visão preconceituosa do século XIX.
Além disso, de acordo com a visão científica equivocada dessa época, a mulher é considerada “nervosa” e “doente”. É também comparada a uma serpente cruel, demoníaca e sensual (“seios acídulos, amargos”, “capros aromas”). O poema, portanto, traz uma visão negativa e preconceituosa do eu lírico em relação à mulher lésbica:
Lésbia
Cróton selvagem, tinhorão lascivo,
Planta mortal, carnívora, sangrenta,
Da tua carne báquica rebenta
A vermelha explosão de um sangue vivo.
Nesse lábio mordente e convulsivo,
Ri, ri risadas de expressão violenta
O Amor, trágico e triste, e passe, lenta,
A morte, o espasmo gélido, aflitivo...
Lésbia nervosa, fascinante e doente,
Cruel e demoníaca serpente
Das flamejantes atrações do gozo.
Dos teus seios acídulos, amargos,
Fluem capros aromas e os letargos,
Os ópios de um luar tuberculoso...
Quanto a suas características formais, o poema possui:
- rigor formal (metrificação — versos decassílabos — e rimas);
- maiúscula alegorizante (“Amor”);
- sinestesia (“vermelha” e “flamejantes” — visão; “explosão” e “risadas” — audição; “aromas” — olfato; “espasmo”, “gélido” e “tuberculoso” — tato; “acídulos” e “amargos”— paladar);
- uso de reticências.
Crédito da imagem
[1] L&PM (reprodução)