Função emotiva
Poética
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o
cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
do amante exemplar com cem modelos de cartas
e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
Manuel Bandeira
O poema que você leu agora é de autoria de Manuel Bandeira, um dos maiores representantes da Literatura brasileira. Poética é um excelente exemplo da função emotiva da linguagem, uma das seis funções da linguagem, cuja principal característica é a mensagem voltada para o emissor, um dos elementos da comunicação.
Na função emotiva, a expressividade é construída através do uso da primeira pessoa do singular. Nela, ganha voz o eu-lírico, que se posiciona de maneira incisiva em relação ao tema que está desenvolvendo. Como resultado desse processo, surgem textos permeados pela subjetividade, comuns na literatura, no cinema, no teatro, na música, em anúncios publicitários e em várias manifestações artísticas.
“Eu não gosto do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto
Eu aguento até rigores
Eu não tenho pena dos traídos
Eu hospedo infratores e banidos
Eu respeito conveniências
Eu não ligo pra conchavos
Eu suporto aparências
Eu não gosto de maus-tratos
Mas o que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto (...)”.
(Senhas – Adriana Calcanhotto)
Existem, na função emotiva, algumas marcas linguísticas peculiares, como o uso dos verbos e dos pronomes em primeira pessoa, interjeições (que revelam o estado emocional do emissor), adjetivos valorativos e ocorrência de alguns sinais de pontuação como reticências e pontos de exclamação. Observe como ela pode estar presente nos mais diversos gêneros textuais:
A função emotiva manifesta-se nos diversos gêneros textuais. Vida de passarinho. Caulos. Porto Alegre: L&PM, 1989. p. 25
Também são exemplos de função emotiva depoimentos, entrevistas, narrativas de caráter memorialista e críticas subjetivas. Na função emotiva, também conhecida como função expressiva, o destaque vai para a subjetividade do emissor que, através dos recursos expressivos utilizados, conta com a adesão do interlocutor ao conteúdo informado.