Renascimento
Antes de inicarmos os estudos sobre o movimento renascentista, é necessário voltarmos a atenção para o movimento de transição que o antecedeu, ou seja, o Humanismo.
Com o advento do Humanismo, ocorreu uma mudança da visão teocêntrica medieval para uma visão antropocêntrica. Assim, a ideia de que Deus e a religião deveriam ser o centro das preocupações humanas é substituída pela ideia de que o homem é a razão da existência do universo. E é exatamente sobre a base desses ideais antropocêntricos que surge o Renascimento, movimento que se espalhou pela Europa durante os séculos XV e XVI.
Para percebermos essa grande mudança da era medieval para a era moderna, vamos comparar duas pinturas desses períodos:
Pintura medieval:
“O sepultamento de Cristo” – iluminura medieval do século XIII
Pintura renascentista:
“O sepultamento de Cristo” - Michelangelo Merisi da Caravaggio
Perceba que, na obra medieval que representa o sepultamento de Cristo, Jesus e todos os outros personagens presentes não possuem expressividade emotiva em seus rostos, dando-nos a impressão de que todos saíram de uma mesma forma. Além disso, a representação da imagem é de uma figura plana, sem profundidade, como se estivesse deslocada.
Já na pintura renascentista, é possível notar que a figura humana é valorizada por meio de uma representação tridimensional, as pessoas possuem expressões emotivas diferentes umas das outras, há a valorização do espaço por meio do uso de luz e sombra, dando-nos a noção do local onde a cena ocorre.
Essas diferenças artísticas são características marcantes dos dois períodos, pois retratam uma diferença do pensamento humano sobre sua própria natureza e importância no mundo que habita. Assim, na Renascença, a pintura tornou-se mais realista do que a da era medieval. Mesmo em obras com a temática religiosa, é notória a representação de uma aparência verdadeira das figuras que, muitas vezes, recebiam a vestimenta à moda da época do Renascimento.
→ Avanços tecnológicos
O período renascentista foi marcado por grandes inovações tecnológicas e científicas, como o desenvolvimento da astronomia, a invenção da bússola, a criação da imprensa, da pólvora, etc.
A criação da imprensa proporcionou uma descentralização do conhecimento, que antes era controlado pela Igreja, e promoveu o aumento da produção literária na Europa. Esse acesso ao conhecimento mudou profundamente a visão de mundo do homem renascentista e, consequentemente, suas produções artístico-literárias foram diretamente influenciadas. Até a atualidade, somos influenciados por essas ideias e atitudes que surgiram naquela época.
→ Revoluções políticas, econômicas e sociais
Durante esse período, como já foi dito anteriormente, muitas foram as mudanças sociais, políticas e econômicas que influenciaram a humanidade. Entre elas, podemos citar:
- a decadência do Feudalismo;
- a substituição da economia de subsistência pelas atividades comerciais;
- a ascenção da burguesia;
- surgimento de novas profissões e desenvolvimento de pequenas indústrias artesanais;
- o mecenato;
- perda do monopólio da arte pela Igreja Católica;
- o Absolutismo.
→ Renascimento e sua visão de mundo
Com o desenvolvimento das ciências humanas, o Renascimento voltou seu olhar para para o homem, seu objeto de observação e também observador de sua própria realidade. Assim, é o homem que passa a ver a beleza, a sentir prazer e ter alegria, anteriormente negados pelo controle da Igreja sobre a humanidade, passando a ter consciência e valorizar mais suas capacidades de construir e ser responsável por seu próprio destino.
→ Características renascentistas na literatura
A literatura renascentista possui também características marcantes que condizem com a ideia de mundo da época:
- Antropocentrismo (o homem no centro);
- Otimismo;
- Racionalismo;
- Humanismo;
- Hedonismo (valorização dos prazeres sensoriais);
- Individualismo;
- Inspiração na Antiguidade Clássica.
→ Inspiração na Antiguidade Clássica
No período do Renascimento, houve um resgate dos valores culturais e padrões clássicos das letras e das artes em geral. Isso quer dizer que figuras mitológicas e pagãs apareciam nas pinturas e eram utilizadas como elemento estético com objetivos morais e filosóficos.
Como modo de romper o período anterior que possui uma arte popular, é por meio dos padrões clássicos que se estabelece um privilégio do intelecto e do raciocínio nas produções da época, ou seja, esses padrões clássicos eram vistos como maneira de produzir adequadamente qualquer obra e, portanto, influenciaram vários campos da atividade humana.
Observe os textos a seguir:
Literatura Medieval:
Cantiga de Amor
Senhor fremosa, que vos fez
mesurada e de bon prez,
que pecados foron os meus
que nunca tevestes por ben
de nunca mi fazerdes ben.
Pero sempre vos soub'amar
des aquel dia que vos vi,
mays que os meus olhos en mi,
e assy o quis Deus guisar,
que nunca tevestes por ben
de nunca mi fazerdes ben.
Des que vos vi, sempr'o maior
ben que vos podia querer
vos quigi, a todo meu poder,
e pero quis Nostro Senhor
que nunca tevestes por ben
de nunca mi fazerdes ben.
Mays, senhor, ainda con ben
se cobraria ben por ben.
(Don Dinis, rei de Portugal que viveu entre 1261 e 1325)
Literatura Renascentista
Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sómente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.
Mas esta linda e pura semideia,|
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim co'a alma minha se conforma,
Está no pensamento como ideia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma.
(Luis de Camões)
Perceba o quanto a abordagem do tema diferencia-se de um texto para outro. No primeiro, é possível notar o cuidado em não se expressar abertamente sobre o sentimento que o eu lírico nutre por sua amada, mantendo certas convenções de sentimento e linguagem. Já no segundo, a expressão do sentimento realiza-se de forma mais direta, o eu lírico manifesta claramente o desejo por sua amada.
É importante citar que Luís de Camões é um dos maiores poetas da língua portuguesa. Na composição de sua obra, buscou inspiração nos gregos e latinos da Antiguidade e, além disso, pesquisou a origem da língua portuguesa, contribuindo diretamente para a consolidação desse idioma.