Descrição
A descrição é uma tipologia textual usada para retratar personagens, espaços, momentos, pensamentos etc. Em suma, tudo que é nomeado pode ser descrito. A classe gramatical mais usada para essa função é o adjetivo. Não obstante, existem diversas outras formas de produzir essa tipologia, assim como há vários tipos de descrição. Além disso, os trechos descritivos são fundamentais em diversos gêneros textuais, tais como: os contos, as crônicas, as notícias, entre outros. Por isso, é fundamental saber como fazer uma boa descrição para compor bons textos.
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Tipos
Descrever algo é uma das práticas discursivas mais importantes para a comunicação humana. Isso pode ser visto, por exemplo, na necessidade de alguém determinar um objeto do qual não se lembra o nome, como quando se diz “pegue essa coisa vermelha que é usada para beber café e que está em cima da mesa”, em que a palavra “xícara” é substituída por sua descrição (que, no caso, também é circunstancial) “coisa vermelha […] em cima da mesa”.
O ato de descrever é visto até quando se refere a conceitos abstratos, como o da liberdade, tão bem definida por Cecília Meireles, na seguinte frase da obra Romanceiro da Inconfidência: “Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.”
Nota-se que, no trecho escrito pela poeta, o termo “liberdade” é relacionado ao trecho descritivo “uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda”, por meio do verbo “ser” flexionado na 3ª pessoa do singular.
Para além de sua função ampla, podemos dividir as descrições em dois grupos:
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Descrição física
Quando elementos do mundo real — externo ao sujeito, mas apreensível pelos seus sentidos — são descritos, diz-se que há descrição física.
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Descrição psicológica
Opondo-se à descrição física, a psicológica volta-se para o interior das personagens, seus pensamentos, sensações e sentimentos. Os traços psicológicos só podem ser descritos por narradores em 1ª pessoa ou aqueles oniscientes, haja vista que é necessário penetrar na mente do sujeito descrito para conhecer sua psiquê.
Pensando nos dois tipos de descrição recém-citados, veja, a seguir, a descrição da personagem Professor, do romance Capitães de Areia:
João José era o único que lia correntemente entre eles e, no entanto, só esteve na escola ano e meio. Mas o treino diário da leitura despertara completamente sua imaginação e talvez fosse ele o único que tivesse uma certa consciência do heroico das suas vidas. Aquele saber, aquela vocação para contar histórias, fizera-o respeitado entre os Capitães Areia, se bem fosse franzino, magro e triste, o cabelo moreno caindo sobre os olhos apertados de míope. Apelidaram-no de Professor porque num livro furtado ele aprendera a fazer mágicas com lenços níqueis e também porque, contando aquelas histórias que lia e muitas que inventava, fazia a grande e misteriosa mágica de os transportar para mundos diversos, fazia com que os olhos vivos dos Capitães da Areia brilhassem como só brilham as estrelas da noite da Bahia.
In: AMADO, J. Capitães da areia.
No trecho, elementos físicos e psicológicos são usados para descrever a personagem João José. Fisicamente, ele era “franzino, magro”, com “o cabelo moreno caindo sobre os olhos apertados de míope”. Psicologicamente, a personagem mostrava-se (entre outras características) persistente e criativo — “o treino diário da leitura despertara completamente sua imaginação e talvez fosse ele o único que tivesse uma certa consciência do heroico das suas vidas”.
Como fazer
A capacidade de produzir boas descrições envolve diversos fatores. Entre esses, há alguns mais técnicos, como o domínio das estruturas gramaticais funcionais à descrição (como os adjetivos ou as orações subordinadas adjetivas), ou ainda a capacidade de ser criativo para perceber ângulos, perspectivas ou pontos de vista inesperados.
Ainda, vale sempre lembrar que se é produtivo para compor descrições:
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Determinar o que será descrito;
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Decidir se a composição descreverá aspectos físicos, psicológicos ou ambos;
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Escolher as palavras, expressões ou orações mais precisas para descrever o que será caracterizado.
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Exemplos
Leia, a seguir, alguns textos com descrições interessantes:
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Texto 01
O bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
In: BANDEIRA, M. Belo belo.
Nesse poema de Manuel Bandeira, um “bicho” é descrito como alguém que vivia “na imundície do pátio”, catava “comida entre os detritos”, “não examinava nem cheirava” o que encontrava no lixo, mas sim “engolia com voracidade”. Um bicho que não seria nem “cão”, “gato” ou “rato”, porém, na verdade, “um homem”. Perceba que esses traços físicos e psicológicos do homem que se assemelha tanto com um bicho podem ser interpretados pelo leitor.
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Texto 02
Estrela azul do céu
Aquela estrela azul do céu
Do céu do meu balão
De antigamente
Sumiu de repente
Da noite de São João
Azul do céu na noite só
Papel de seda faz
Balão era isso
Magia, feitiço
Milagre que não tem mais
Papel de seda azul e vermelho e amarelo
E verde a cintilar
Translúcido vitral
O balão se elevava, súbito pairava lá no ar
Ser sobrenatural
Aquela estrela azul do céu
O tempo carregou
O tempo não falha
O tempo atrapalha
O tempo não tem pudor
A fila anda, a vida vai
Propondo a mutação
Então de repente
Ficou diferente
A noite de São João
GIL, G. Fé na festa.
Nessa composição de Gilberto Gil, percebemos que a função principal da canção é descrever os balões que, na perspectiva do sujeito lírico, sumiram da noite de São João. Retratado como “estrela azul do céu”, “magia, feitiço”, “milagre que não tem mais” ou ainda “translúcido vitral”, o balão da festa junina rememorado pelo autor é descrito, portanto, em seus aspectos físicos e psicológicos.
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No caso desses últimos, é possível ler como os balões afetam ou são percebidos pelo “eu poético” da música. Para aquele que canta no texto, o balão significa uma lembrança de tempos antigos, uma memória afetiva que não pode ser acessada senão pelo rememorar.