Maria Leopoldina
Maria Leopoldina entrou para a história do Brasil por ter sido a primeira imperatriz do país. Casada com d. Pedro I, a arquiduquesa austríaca teve papel fundamental em convencer seu marido a permanecer no Brasil e posicionar-se pela independência brasileira. O casamento de Leopoldina, no entanto, foi infeliz, e ela faleceu como consequência de um aborto espontâneo.
Os historiadores contam que a primeira imperatriz teve o seu papel na independência diminuído e apagado nas gerações seguintes. Sua atuação, nesse sentido, foi para garantir a manutenção da monarquia no Brasil. Da relação dela com d. Pedro I nasceram sete filhos, deles um foi d. Pedro II.
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Nascimento
Maria Leopoldina era austríaca e nasceu, em Viena, no dia 22 de janeiro de 1797. Seus pais eram a imperatriz Maria Teresa e o imperador Francisco I, e Leopoldina foi o quinto filho do casal, sendo a quarta do sexo feminino. Seu nome completo era Carolina Josefa Leopoldina Fernanda Francisca de Habsburgo-Lorena (o Maria só foi acrescentado quando ela veio ao Brasil).
Leopoldina teve 11 irmãos, e, entre eles, ela teve uma relação muito próxima com Maria Luísa, sua irmã mais velha. Quando Leopoldina casou-se com d. Pedro, ela escreveu várias cartas confidenciando detalhes de sua vida para a irmã. Essas cartas foram (e são) utilizadas pelos historiadores para a reconstrução de parte da vida da imperatriz do Brasil.
Leopoldina, como toda criança da realeza, recebeu uma educação muito boa e foi tutorada por pessoas importantes e influentes, como Goethe. Parte de sua educação era aprender a comportar-se em público e a respeitar as normas de etiqueta praticadas pela aristocracia europeia.
A arquiduquesa (título dela na Áustria) também foi educada a colocar os assuntos de Estado acima dos seus desejos pessoais, assim, se ela precisasse sacrificar suas vontades pelo bem da Áustria, isso seria feito de bom grado. Foi o que ela fez quando se casou com d. Pedro, e os historiadores apontam que ela não reclamou, em nenhum momento, do seu destino.
Mudança para o Brasil
O grande fato da vida de Leopoldina, e que fez com que sua história cruzasse-se com a do Brasil, foi o seu casamento com o filho de d. João VI, rei de Portugal. O destino inesperado de Leopoldina começou a ser traçado quando portugueses e austríacos negociaram essa possibilidade durante o Congresso de Viena.
Do lado dos portugueses, foi decidido que d. Pedro deveria casar-se porque se acreditava que o matrimônio iria colocá-lo “nos trilhos”. Já na sua juventude, d. Pedro era conhecido por ser mulherengo e ficou marcado por diversos casos amorosos, chegando, inclusive, a envolver-se com mulheres da mesma família.
Fora isso, o casamento de d. Pedro com uma das filhas de Francisco I era muito importante política e economicamente para Portugal. Primeiro porque garantia uma aliança com uma das monarquias mais poderosas e tradicionais da Europa, e, segundo, porque abria possibilidade para Portugal pôr fim na dependência que tinha da Inglaterra.
Para os austríacos, esse casamento era a chance de garantir-lhes uma importante influência na América. O historiador Clóvis Bulcão aponta que o matrimônio foi considerado um grande feito diplomático dos dois lados e causou profundo incômodo na Inglaterra|1|.
Uma vez concluída a negociação, o casamento de d. Pedro e Leopoldina aconteceu, em 13 de maio de 1817, por procuração. Quem representou o noivo na cerimônia foi o arquiduque Carlos, duque de Tuschen e tio de Leopoldina. Foi somente quase seis meses depois que Leopoldina e d. Pedro conheceram-se pessoalmente.
Leopoldina mostrou-se animada com a viagem, estudou português e preparou um grupo de cientistas para estudar mineralogia e botânica aqui. Sua viagem foi longa e durou 85 dias, até que desembarcou no Brasil, em 5 de novembro de 1817. A recepção da princesa foi bastante efusiva e uma festa em sua homenagem foi realizada.
Os historiadores contam que Leopoldina ficou encantada com a beleza do Rio de Janeiro e definiu o local como “a Suíça [uma referência à geografia do Rio de Janeiro] unida ao mais belo e ameno céu”|2|. Dias depois, outra recepção foi realizada para ela e membros do corpo diplomático austríaco.
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Como foi o casamento de Leopoldina com d. Pedro?
Com base nos relatos de Leopoldina e em seu estado nos seus últimos anos de vida, pode ser dito que o seu casamento não foi feliz. Os primeiros comentários dela acerca do marido eram sobre seu apetite sexual e sua personalidade. Clóvis Bulcão traz um desses comentários feito para sua irmã:
“Com toda franqueza, diz ele tudo o que pensa, e isso com alguma brutalidade: habituado a executar a sua vontade, todos devem acomodar-se a ele; até eu sou obrigada a admitir alguns azedumes. Vendo, entretanto, que me chocou, chora comigo […].|3|”
A animação e o encantamento inicial de Leopoldina com o casamento e com seu marido logo deixaram de existir. Até 1822 ela tinha grande influência sobre ele, mas, quando tornou-se imperador, o interesse por ela diminuiu consideravelmente, e o tratamento a ela dispensado fez com que a imperatriz fosse bastante infeliz.
O período mais conturbado do casamento iniciou-se pouco antes da independência, durante uma viagem de d. Pedro a São Paulo. Lá ele conheceu Domitila de Castro, futura marquesa de Santos. Domitila foi amante do imperador durante muitos anos, e esse caso foi uma grande humilhação para Leopoldina.
Esse caso extraconjugal era escancarado ao ponto que toda a cidade do Rio de Janeiro sabia dele, até estrangeiros que vieram ao Brasil relataram-no. Domitila enriqueceu com o seu envolvimento com o imperador. Ela adquiriu bens e títulos, assim como seus familiares.
A situação era tão vexatória para Leopoldina que d. Pedro I chegou a nomear sua amante como primeira-dama da esposa. Essa função fazia com que Domitila tivesse contato diário com a imperatriz do Brasil. Esta deixou registrado em carta que d. Pedro I destratava-a na frente da amante e definiu-a como “a causa de todas as minhas desgraças”|4|.
Além de ser maltratada, d. Pedro I fez outras coisas horríveis com a imperatriz, como sofrer proibições e agressões. Proibiu-a de gastar a mesada a que ela tinha direito, cortou pela metade os gastos dela com comida, proibiu-a de passear a cavalo, e existem relatos de que chegou a agredi-la fisicamente, inclusive grávida.
Do casamento de Leopoldina com d. Pedro, nasceram sete filhos, dos quais o mais importante foi Pedro de Alcântara, coroado imperador do Brasil em 1840, tornando-se d. Pedro II.
Falecimento
Os últimos anos de Leopoldina foram marcados pelas decepções causadas pelo imperador. O casamento infeliz deixou-a em um estado de ânimo que alguns historiadores definem como compatível ao que consideramos atualmente como depressão. Isso é confirmado por vários relatos da época.
Além de depressiva, no final de 1826, a imperatriz estava grávida e sofreu um aborto espontâneo. Com a saúde fragilizada, seu quadro agravou-se e ela faleceu no dia 11 de dezembro de 1826, aos 29 anos de idade. Alguns relatos sugerem que o aborto pode ter sido consequência das agressões de d. Pedro I.
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Qual foi o papel de Leopoldina na independência do Brasil?
Leopoldina foi uma figura fundamental durante os acontecimentos que levaram a nossa independência, mas sua atuação foi sendo esquecida. O processo de independência iniciou-se com os esforços da burguesia portuguesa (representada pelas Cortes portuguesas) em recolonizar o Brasil.
As medidas tomadas pelas Cortes e a forma como tratavam os representantes do Brasil começaram a agitar o clima político, sobretudo no Rio de Janeiro. Nesse momento, Maria Leopoldina abriu mão de seus desejos pessoais e focou naquilo que havia sido ensinada a prezar: os valores monárquicos e os interesses do Estado.
Em 1820 o desejo de Leopoldina era retornar para a Europa, mas a leitura que ela fez do cenário político fê-la abrir mão de seu desejo. Ela leu o clima político do Brasil e percebeu que o risco de que uma revolução democrática e republicana acontecesse aqui era considerável, caso os portugueses continuassem pressionando o reino brasileiro.
Assim ela passou a aconselhar seu marido a como agir nesse cenário. D. Pedro era indeciso e ainda apegado ao sentimento de lealdade a Portugal, e, assim, suas ações eram hesitantes. Leopoldina percebeu que a monarquia só se manteria em vigência no Brasil se um monarca dos Bragança tomasse a liderança da situação e conduzisse o processo de independência.
Com isso ela atuou para convencer d. Pedro a permanecer no país (até certo momento ele considerava retornar a Portugal), e depois, quando a relação com Portugal ficou muito ruim, ela, junto de José Bonifácio, convenceu o príncipe regente a romper com o próprio país de origem e declarar a independência do Brasil.
Notas
|1| BULCÃO, Clóvis. Leopoldina, a austríaca que amou o Brasil. In.: FIGUEIREDO, Luciano. História do Brasil para ocupados. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013, p. 237-238.
|2| Idem, p. 238.
|3| Idem, p. 239.
|4| LUSTOSA, Isabel. D. Pedro I: um herói sem nenhum caráter. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Crédito das imagens
[1] Commons