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Epopeia

Epopeia, ou poema épico, é um texto narrativo escrito em versos. Teve sua origem na Antiguidade e entrou em decadência no século XVIII, quando o romance, que é uma narrativa em prosa, tomou o seu lugar. É dividido em cantos, em vez de capítulos, e seu protagonista é um herói cheio de virtudes e capaz de superar grandes obstáculos para cumprir a sua missão.

Esse tipo de obra começa com um prólogo, em que o nome do herói e a temática são revelados, apresenta invocação a uma divindade capaz de inspirar o autor, narra os feitos heroicos do protagonista e, por fim, apresenta o epílogo, o final da história. São exemplos de epopeias: Ilíada e Odisseia, de Homero; Eneida, de Virgílio (70 a. C.-19 a. C.); e Os lusíadas, de Luís Vaz de Camões (1524-1580).

Veja também: Arcadismo – estética que usou traços épicos em algumas de suas obras

O que é epopeia?

A epopeia, ou poema épico, é uma estrutura poética, do gênero narrativo. Em resumo, é uma história contada em versos em vez de prosa. Sua origem remonta à Antiguidade e tem o poeta Homero como seu principal nome. Esse tipo de narrativa é marcado por aventuras e heroísmo. Portanto, o principal elemento de uma epopeia é a presença de um herói como protagonista.

Esse herói não é valorizado por suas características individuais, mas naquilo que o torna um representante do povo a que pertence. A epopeia, dessa forma, caracteriza-se como uma narrativa solene que objetiva enaltecer determinado povo com base nos feitos heroicos de seu protagonista. Assim, suas qualidades — pois o herói é um modelo de virtude — são também as qualidades de seu povo.

O protagonista heroico das epopeias tem sempre uma missão difícil a cumprir, o que ressalta o seu heroísmo diante das dificuldades extraordinárias que precisa enfrentar para realizar aquilo a que está destinado. Nesses longos poemas narrativos, as grandes aventuras do herói estão também associadas a fatos históricos.

A Ilíada e a Odisseia, atribuídas a Homero, são consideradas, pelos estudiosos, as epopeias mais importantes, que datam aproximadamente do século VIII a. C. Por isso, são chamadas de epopeias primárias. Desse modo, inspirados pelas narrativas de Homero, séculos depois, outros autores criaram seus poemas épicos, como a Eneida (século I a. C.), de Virgílio, e Os lusíadas (1572), de Luís Vaz de Camões. Estas foram chamadas, portanto, de epopeias secundárias.

Aquiles e Heitor lutando na guerra de Troia.
Aquiles e Heitor lutando na guerra de Troia.

Os poemas épicos entraram em decadência no século XVIII. Como exemplo, podemos citar, nesse século, as epopeias brasileiras O Uraguai (1769), de Basílio da Gama (1741-1795), e Caramuru (1781), de Frei José de Santa Rita Durão (1722-1784). Logo depois, o romance tomou o seu lugar, tratando-se da narrativa em prosa, em que o heroísmo é construído baseado em uma perspectiva mais individual e menos representativa de uma nação.

Não obstante, além dos principais poemas épicos já mencionados, existe a Epopeia de Gilgamesh. Ela conta a história de Gilgamesh, rei de Uruk, que, segundo Jeffrey H. Tigay|1|, foi rei durante o início do período da segunda dinastia, aproximadamente 2700-2500 a. C. Ainda, de acordo com Franco D’Agostino|2|, é o documento mais antigo produzido pela humanidade, mais antigo do que as obras de Homero.

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Características de uma epopeia

A estrutura de um poema épico clássico é a seguinte:

  • A epopeia não é dividida em capítulos, mas em cantos.

  • No início da obra, há uma proposição ou prólogo, em que a temática e o nome do herói são revelados pelo narrador.

  • É também feita a invocação, quando o narrador pede inspiração a alguma divindade; normalmente, à Musa.

  • Pode haver uma dedicatória, em que a obra é dedicada a uma ou mais pessoas importantes.

  • Na sequência, temos a narração das aventuras do herói.

  • Por fim, há a conclusão ou epílogo, o encerramento da história.

Zeus, o deus do Olimpo.
Zeus, o deus do Olimpo.

Já os elementos que compõem essa narrativa são:

  • O herói, protagonista da obra, corajoso e com valores nobres.

  • Os obstáculos que o impedem de cumprir sua missão, os quais ele precisa superar.

  • A presença de deuses ou seres mitológicos que auxiliam ou dificultam a vida do herói.

  • Fatos extraordinários e grandes perigos, que colocam em destaque o heroísmo do protagonista.

  • A superioridade humana do herói inspira os leitores ou ouvintes a valorizarem a tradição de seu povo.

Veja também: Literatura de cordel – assim como a epopeia, é elaborada em versos

Exemplos de epopeia

No início do “Canto I”, da Ilíada, de Homero, com tradução de Manoel Odorico Mendes (1799-1864), podemos perceber, já no início, a invocação à “deusa”. Nesse prólogo, o nome do herói Aquiles é mencionado, além dos deuses Jove e Apolo, e a temática da epopeia é exposta o conflito entre gregos e troianos:

Canta-me, ó deusa, do Peleio Aquiles
A ira tenaz, que, lutuosa aos Gregos,
Verdes no Orco lançou mil fortes almas,
Corpos de heróis a cães e abutres pasto:
Lei foi de Jove, em rixa ao discordarem
O de homens chefe e o Mirmidon divino.
Nume há que os malquistasse? O que o Supremo
Teve em Latona. Infenso um letal morbo
No campo ateia; o povo perecia,
Só porque o rei desacatara a Crises.
Com ricos dons remir viera a filha
Aos alados baixéis, nas mãos o cetro
E a do certeiro Apolo ínfula sacra.
Ora e aos irmãos potentes mais se humilha:
“Atridas, vós Aqueus de fina greva,
Raso o muro Priâmeo, assim regresso
Vos deem feliz do Olimpo os moradores!
Peço a minha Criseida, eis seu resgate;
Reverentes à prole do Tonante,
Ao Longe-vibrador, soltai-me a filha”.
Que, aceito o preço esplêndido, se acate
O sacerdote murmuraram todos;
[…].

A seguir, um trecho do “Canto X”, da Odisseia, de Homero, com tradução de Manoel Odorico Mendes. Nesse canto, Circe convida os enviados de Ulisses (ou Odisseu) a entrarem em seu palácio e transforma-os em porcos. O herói vai salvar os companheiros e, nessa aventura, acaba sendo seduzido pela feiticeira:

[...]
Num vale acham marmóreo insigne paço,
Que cercam lobos e leões, de Circe
Com peçonha amansados: contra a gente
Não remeteram de unhas lacerantes,
Sim alongando a cauda os afagaram,
Como festejam cães o meigo dono
Que lhes traz do banquete algum bocado;
Mas, a tal vista, ao pórtico medrosos
Retiveram-se os Gregos. Dentro ouviam
Cantar suave a crinipulcra Circe,
Teia a correr brilhante, que só deusas
Lavram tão fina e bela. Eis diz Polites,
Chefe que eu mais prezava: “No alto, amigos,
Mulher ou deusa tece; o pavimento
Ressoa todo ao cântico: falemos”.
Gritam; Circe aparece, e abrindo as portas
Resplendentes, convida esses incautos;
Só, receoso, Euríloco repugna.
Senta-os a deusa em tronos e camilhas;
Escândea e queijo com Paneio vinho
Mistura e fresco mel, poção lhe ajunta
Que deslembra da pátria. Mal a engolem,
Toca-os de vara, na pocilga os fecha,
Porcos sendo no som, no vulto e cerdas,
A inteligência embora conservassem.
Tristes grunhindo, a maga lhes atira
Glande, azinha e cornisolo, sustento
Próprio desses rasteiros foçadores.
Veio Euríloco à pressa anunciar-nos
O caso infando, que articula apenas
Pela força da dor, pois lhe excitava
Luto no coração, água nos olhos;
[...].
Já, pelo sacro bosque, avisto o alcáçar
Da venéfica Circe, quando o nume
Do caduceu me encontra, afigurado
Num gentil gracioso adolescente;
Ele trava-me a destra: “Ignotos serros,
Mísero, andas sozinho? os teus, quais porcos,
Os tem Circe em fortíssimo escondrijo.
Vens tu livrá-los? sorte igual te espera.
Antídoto haverás, que te preserve
Da encantadora. Seus ardis aprende:
Num misto lançará sutil veneno, […]”.

Já da Eneida, de Virgílio, com tradução de Manoel Odorico Mendes, selecionamos o “Canto XII”, o epílogo, em que o herói troiano Eneias tem sua última batalha, contra Turno, na guerra entre latinos e troianos:

[…]

Lança estremece, de evadir-se o meio
Nem contra o seu rival já vê recurso,
Nem mais a auriga irmã, nem mais seu carro.
Enquanto hesita, o lanço Eneias mede,
A hasta vibra fatal, forceja e solta:
Nunca assim fremem do mural trabuco
Jogadas rochas, nem trovão rebrama:
Qual furacão letífera voando,
Da cota as orlas e os extremos orbes
Do septêmplice escudo a estrugir fura,
E a coxa lhe traspassa. Ao bote o moço,
Inflexa a curva, tomba; os seus alteiam
Mesto clamor; remuge inteiro o monte,
E na selva o lamento amplo reboa.
Turno olha humilde, súplice ergue a destra:
“Bem mereço, é teu jus, perdão não peço;
Mas, se de um pai (de Anquises te relembres)
Comove-te a velhice, a Dauno eu rogo
Me entregues, se não vivo, ao menos morto.
Venceste, e viu-me enfim a Itália toda
As palmas levantar: Lavínia é tua;
Os ódios não requintes”. O acre Eneias
Para, os olhos volteia, a mão reprime:
Iam-no as preces quase enternecendo,
[…].

Vasco da Gama (1469-1524), o herói de “Os lusíadas”, de Luís Vaz de Camões.
Vasco da Gama (1469-1524), o herói de “Os lusíadas”, de Luís Vaz de Camões.

Por fim, um trecho do “Canto I”, de Os lusíadas, de Luís Vaz de Camões, em que o narrador apresenta o herói Vasco da Gama, que, com sua tripulação, chega à ilha de Moçambique:

Vasco da Gama, o forte Capitão,
Que a tamanhas empresas se oferece,
De soberbo e de altivo coração,
A quem Fortuna sempre favorece,
Pera se aqui deter não vê razão,
Que inabitada a terra lhe parece.
Por diante passar determinava,
Mas não lhe sucedeu como cuidava.

Eis aparecem logo em companhia
Uns pequenos batéis, que vêm daquela
Que mais chegada à terra parecia,
Cortando o longo mar com larga vela.
A gente se alvoroça e, de alegria,
Não sabe mais que olhar a causa dela.
— “Que gente será esta?” (em si diziam)
“Que costumes, que Lei, que Rei teriam?”

As embarcações eram na maneira
Mui veloces, estreitas e compridas;
As velas com que vêm eram de esteira,
Duas folhas de palma, bem tecidas;
A gente da cor era verdadeira
Que Fáeton, nas terras acendidas,
Ao mundo deu, de ousado e não prudente
(O Pado o sabe e Lampetusa o sente).

De panos de algodão vinham vestidos,
De várias cores, brancos e listrados;
Uns trazem derredor de si cingidos,
Outros em modo airoso sobraçados;
Das cintas pera cima vêm despidos;
Por armas têm adagas e tarçados;
Com toucas na cabeça; e, navegando,
Anafis sonorosos vão tocando.

Cos panos e cos braços acenavam
Às gentes Lusitanas, que esperassem;
Mas já as proas ligeiras se inclinavam,
Pera que junto às Ilhas amainassem.
A gente e marinheiros trabalhavam
Como se aqui os trabalhos s’acabassem:
Tomam velas, amaina-se a verga alta,
Da âncora o mar ferido em cima salta.
[...]

Notas

|1| Citado por Marco Pais Neves dos Santos, no artigo: O conceito de morte para o homem mesopotâmico na Epopeia de Gilgamesh.

|2| Citado por Marco Pais Neves dos Santos, no artigo: O conceito de morte para o homem mesopotâmico na Epopeia de Gilgamesh.

Publicado por Warley Souza
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