Literatura negra
A literatura negra é composta por obras cuja temática está associada à experiência de pessoas negras. Além disso, autoras e autores desse tipo de literatura devem ser afrodescendentes. Desse modo, a obra deve trazer o ponto de vista dessas pessoas. No Brasil, um dos principais livros da literatura negra é Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus.
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Resumo sobre literatura negra
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Os estudos sobre as obras da literatura negra tiveram início nos anos 1970.
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A literatura negra é definida pela sua temática, autoria, ponto de vista e linguagem.
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Carolina Maria de Jesus é uma das principais autoras da literatura negra brasileira.
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A literatura negra possui caráter político e valoriza o ponto de vista da pessoa negra.
Origem da literatura negra
A designação “literatura negra” passou a estar em evidência nos estudos literários e culturais a partir da década de 1970. No entanto, a literatura escrita por pessoas negras e com protagonistas negros pode ser observada bem antes dessa data.
Características da literatura negra
A literatura negra é aquela produzida por autoras e autores negros ou descendentes de pessoas negras. Consequentemente, as narrativas, poesias ou peças teatrais inseridas nessa categoria trazem como protagonistas as pessoas negras e evidenciam a sua cultura, ou seja, elementos históricos e étnicos.
É uma literatura essencialmente política, ideológica, e tem como objetivo a afirmação de uma identidade. Assim, tal nomenclatura é mais uma forma de dar visibilidade ao discurso ou linguagem dessa minoria política e, desse modo, valorizar a voz daqueles que, historicamente, foram silenciados.
As características definidoras desse tipo de literatura estão, portanto, vinculadas à temática da obra e ao seu caráter político. Não há, obviamente, elementos estruturais diferenciadores. A temática e o contexto de produção são os principais definidores dessa categoria de literatura.
Logo, o que define a literatura negra é a temática, a autoria e o ponto de vista da obra, elementos associados a questões étnicas. Tal literatura, também, é direcionada, primordialmente, a pessoas negras. Nessa perspectiva, o romance Dom Casmurro, por exemplo, de Machado de Assis, um escritor negro, não faz parte da literatura negra ou afrodescendente.
Autores da literatura negra
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William Wells Brown (1814-1884) — estado-unidense.
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Frederick Douglass (1818-1895) — estado-unidense.
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Maria Firmina dos Reis (1822-1917) — brasileira.
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Luiz Gama (1830-1882) — brasileiro.
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Lima Barreto (1881-1922) — brasileiro.
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Richard Wright (1908-1960) — estado-unidense.
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João Felício dos Santos (1911-1989) — brasileiro.
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Carolina Maria de Jesus (1914-1977) — brasileira.
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Maya Angelou (1928-2014) — estado-unidense.
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Alice Walker (1944-) — estado-unidense.
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Conceição Evaristo (1946-) — brasileira
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Paulina Chiziane (1955-) — moçambicana.
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Caryl Phillips (1958-) — inglês.
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Allan da Rosa (1976-) — brasileiro.
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Djaimilia Pereira de Almeida (1982-) — portuguesa.
Principais obras da literatura negra
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Narrativa da vida de Frederick Douglass (1845), autobiografia de Frederick Douglass.
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Narrativa de William Wells Brown, escravo fugitivo (1847), autobiografia de William Wells Brown.
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Quem sou eu?(1861), poema de Luiz Gama.
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A escrava (1887), conto de Maria Firmina dos Reis.
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Recordações do escrivão Isaías Caminha (1909), romance de Lima Barreto.
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Filho nativo (1940), romance de Richard Wright.
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Quarto de despejo (1960), diário de Carolina Maria de Jesus.
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Ganga-Zumba (1962), romance de João Felício dos Santos.
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Ainda assim eu me levanto (1978), poema de Maya Angelou.
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A cor púrpura (1982), romance de Alice Walker.
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Niketche: uma história de poligamia (2002), romance de Paulina Chiziane.
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Ponciá Vicêncio (2003), romance de Conceição Evaristo.
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Da Cabula (2006), peça teatral de Allan da Rosa.
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Dançando no escuro (2007), romance de Caryl Phillips.
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Esse cabelo (2015), romance de Djaimilia Pereira de Almeida.
Literatura negra no Brasil
A figura emblemática da literatura negra brasileira é a escritora mineira Carolina Maria de Jesus. Em 1960, ela publicou o livro Quarto de despejo, seu “diário de uma favelada”. Nessa obra, a autora relata o seu cotidiano de mulher negra, pobre e residente na favela do Canindé, em São Paulo. A obra foi um sucesso estrondoso.
Mas foi a partir do início do século XXI que esse tipo de literatura passou a despertar mais interesse de acadêmicos brasileiros. Assim, a autora de Quarto de despejo, praticamente esquecida, voltou ao protagonismo a partir do reconhecimento acadêmico.
Nessa perspectiva, também ficou sob os holofotes acadêmicos a escritora maranhense Maria Firmina dos Reis. Essa autora também esteve por anos esquecida, sendo redescoberta na década de 1960. No mais, os estudos acerca da literatura negra permitiram também ressignificar algumas obras de autores como Lima Barreto.
Na atualidade, a literatura negra brasileira está em evidência e conta com autoras famosas, como Conceição Evaristo. Além disso, o interesse em torno dessa categoria de literatura permite destacar a negritude de escritores famosos, como Machado de Assis (1839-1908) e Cruz e Sousa (1861-1898), apesar de as obras desses autores não estarem centradas em questões étnicas.
Importância da literatura negra
A literatura negra de um país engloba obras e autores responsáveis por dar voz a uma minoria política que, historicamente, foi relegada à invisibilidade. Como já mencionamos, é uma literatura de viés ideológico ou político. Nessa perspectiva, cumpre também um papel histórico. Afinal, revela a existência e o valor de obras que expressam a vivência e o pensamento de pessoas negras.
Para a leitora e o leitor negros, o contato com essa literatura permite que eles se vejam devidamente representados em obras literárias, e não mais como ocorria no passado, em que eram retratados, equivocadamente, por pessoas brancas.
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Exercícios sobre literatura negra
Questão 01 (Enem)
Quebranto
às vezes sou o policial que me suspeito
me peço documentos
e mesmo de posse deles
me prendo e me dou porrada
às vezes sou o porteiro
não me deixando entrar em mim mesmo
a não ser
pela porta de serviço
[...]
às vezes faço questão de não me ver
e entupido com a visão deles
sinto-me a miséria concebida como um eterno
começo
fecho-me o cerco
sendo o gesto que me nego
a pinga que me bebo e me embebedo
o dedo que me aponto
e denuncio
o ponto em que me entrego.
às vezes!...
CUTI. Negroesia. Belo Horizonte: Mazza, 2007 (fragmento).
Na literatura de temática negra produzida no Brasil, é recorrente a presença de elementos que traduzem experiências históricas de preconceito e violência. No poema, essa vivência revela que o eu lírico:
A) incorpora seletivamente o discurso do seu opressor.
B) submete-se à discriminação como meio de fortalecimento.
C) engaja-se na denúncia do passado de opressão e injustiças.
D) sofre uma perda de identidade e de noção de pertencimento.
E) acredita esporadicamente na utopia de uma sociedade igualitária.
Resolução:
Alternativa A.
Ao usar a primeira pessoa, o eu lírico incorpora o discurso do opressor ao dizer, por exemplo, “às vezes sou o policial que me suspeito” ou “me peço documentos” etc. Além disso, o eu lírico tem consciência disso, pois afirma que está “entupido com a visão deles”.
Questão 02 (Enem)
TEXTO I
Os séculos de escravidão são um aspecto triste da história brasileira. Tabu e vergonha, quando se pensa nas dores e humilhações desumanas por que passaram homens e mulheres negros trazidos da África; mas também — por que não? — orgulho, quando se evocam as lutas e estratégias de resistência e sobrevivência dos escravos, ex-escravos e descendentes. Histórias transmitidas de geração em geração, como narrativas que dão sentido e identidade.
Povos remanescentes de quilombolas são grupos unidos por esse passado comum, que têm território como base da reprodução física, social, econômica e cultural de sua coletividade. São reconhecidos na Constituição de 1988 como detentores de direitos territoriais coletivos e fazem parte do conjunto dos povos e comunidades tradicionais.
LOSCHI, M. Território e tradição. Retratos: a revista do IBGE, n. 2, ago. 2017 (adaptado).
TEXTO II
exiba ao pai
nossos corações
feridos de angústia
nossas costas chicoteadas
ontem
no pelourinho da escravidão
hoje
no pelourinho da discriminação
sabes que em cada coração de negro
há um quilombo pulsando
em cada barraco
outro palmares crepita
os fogos de Xangô iluminando
nossa luta atual e passada
NASCIMENTO, A. Axés do sangue e da esperança. Retratos: a revista do IBGE, n. 2, ago. 2017.
Na comparação entre os textos I e II, percebe-se que ambos apresentam, em relação à história dos africanos escravizados, um(a)
A) saudosismo do local de origem.
B) culpabilização do homem europeu.
C) valorização da memória dos antepassados.
D) apelo à religiosidade das pessoas mais velhas.
E) reconhecimento dos direitos desses sujeitos.
Resolução:
Alternativa C.
Ao mencionar a escravidão ocorrida no passado e vivenciada pelos antepassados das pessoas negras, há uma valorização da memória dessa gente, tanto no poema de Abdias do Nascimento quanto no texto de M. Loschi.
Créditos da imagem
Fontes:
DUARTE, Eduardo de Assis. Literatura afro-brasileira: um conceito em construção. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 31, p. 11-23, jan./ jun. 2008.
PROENÇA FILHO, Domício. A trajetória do negro na literatura brasileira. Estudos Avançados, São Paulo, v. 18, n. 50, abr. 2004.
ZIN, Rafael Balseiro. Maria Firmina dos Reis: a trajetória intelectual de uma escritora afrodescendente no Brasil oitocentista. 2016. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Faculdade de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2016.