Alquimia
A alquimia é a utilização de técnicas experimentais, laboratoriais e de substâncias químicas para a manipulação da matéria, a fim de atingir objetivos como a transmutação do ouro e a produção do elixir da longa vida. Apesar de ter sido ocultada pelo início da Química, no século XVIII, entusiastas e praticantes da alquimia perduram até hoje.
Essa prática se difundiu por diversos pontos do planeta, do Oriente ao Ocidente, em especial na Europa, Ásia e Oriente Médio, mesmo tendo sido até mesmo proibida. Diversos alquimistas ficaram famosos, como Paracelo, Zósimo de Panópolis e Maria, a Judia, além de ter sido praticada por cientistas históricos, como Isaac Newton e Robert Boyle. Muitas técnicas desenvolvidas na alquimia, como a calcinação e a destilação, são feitas até os dias atuais.
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Resumo sobre alquimia
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A alquimia, cuja origem é incerta (talvez na China, Índia, Egito ou Grécia), é caracterizada pela utilização de um conjunto de técnicas experimentais, laboratoriais e de substâncias químicas para a manipulação da matéria.
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Mesmo tendo sido proibida em alguns momentos da história, a alquimia foi amplamente difundida do Oriente ao Ocidente, especialmente na Europa, Ásia e Oriente Médio.
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Os principais objetivos da alquimia seriam a aquisição do ouro pela transmutação de outros metais e a produção do elixir da longa vida.
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A Pedra Filosofal era um objeto de interesse dos alquimistas, que serviria para acelerar e permitir as reações químicas necessárias.
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Diversos cientistas famosos praticaram a alquimia, entre eles Isaac Newton e Robert Boyle.
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A alquimia deixou um grande legado para a Química, com o desenvolvimento de técnicas e procedimentos experimentais, tais como a calcinação e a destilação.
Qual a origem e a história da alquimia?
Definir a origem da alquimia é um tanto quanto complicado, porque não há um consenso sobre seu local de surgimento. Boa parte dos autores defendem que a alquimia se originou no Egito, mas há indícios de que ela pode ter se originado na China ou até mesmo na Índia.
A defesa da origem chinesa se dá pela etimologia da palavra “alquimia”. Defende-se que venha do chinês kim ou chim, que significa “aurifação”, ou seja, a ideia teórica de que ouro poderia ser manufaturado. Sendo assim, com as rotas comerciais, a chim foi levada até a Índia, depois para o Oriente Médio, até chegar ao Ocidente, onde, na Grécia, o termo foi talvez traduzido como khemeia (ou chyma), que significa “lançados juntos”, “soldar” ou até mesmo “liga”.
Contudo, a origem da palavra khemeia (ou khemia) tem mais fontes. No Egito Antigo, os egípcios se referiam ao seu país como km.t, que significa “a terra negra”, para mostrar o contraste entre o solo negro e arável do Vale do Nilo e a vermelha e barrenta areia do deserto. Em copta, um idioma falado na época do Egito Antigo, o termo keme significa “Egito”. Dessa forma, pode-se entender que khemeia deriva de keme, sendo traduzido como “preparação do pó negro”. Tudo isso poderia apontar para a origem egípcia da alquimia (mais precisamente na cidade de Alexandria), a qual, por influência do rei da Macedônia, chegou às terras gregas. O prefixo al foi influência direta do idioma árabe, que significa o artigo definido “o”.
Há evidências de que a alquimia também tenha se iniciado na Índia ou até mesmo na Pérsia. Aparentemente, os alquimistas indianos tinham boas relações com a China, chegando a visitar a corte imperial. A obra Yu-Yuang Tsa Tsu, de Tuan Cheng-Shih, datada de 863 d.C., conta sobre um embaixador chinês da corte de Patna (uma cidade indiana) que levou consigo, para a corte imperial chinesa, um escolástico indiano que dizia possuir 200 anos, alegando ao imperador que sua longevidade era consequência de uma água de sua região, a qual sairia das montanhas, sob o disfarce de sete cores, capaz de dissolver diversos materiais e ser quente e fria ao mesmo tempo.
Assim, é muito difícil dizer qual a origem da alquimia em si, mas há a ideia de que ela pode ter se iniciado, de forma independente, em diversas regiões do planeta, afinal muitos eram os povos que já faziam manipulação da matéria, como processos metalúrgicos, conservação de alimentos, fabricação de utensílios, cerâmica, vidro, porcelana, pomadas, venenos, óleos aromáticos etc.
De qualquer forma, após a anexação de Alexandria pelo Império Romano, a alquimia chegou a ser proibida pelo imperador romano Diocleciano, no século III d.C., pois ele temia que a transmutação do ouro fosse bem-sucedida, assim ruindo a economia romana.
Mesmo com as perseguições e proibições, a alquimia continuou a ser praticada por diversos povos, tanto do Oriente quanto do Ocidente. A mudança da capital do Império Romano para Constantinopla (atual Istambul) auxiliou ainda mais na difusão da prática, levando traduções e adaptações de obras gregas por estudiosos árabes. A alquimia foi complementada por teorias originais, descrições práticas e recomendações de alquimistas muçulmanos.
Tais movimentos foram necessários para se alcançar o período mais conhecido da alquimia, que ocorreu durante a Idade Média europeia. Afirma-se que a primeira menção à alquimia na Europa Medieval data de 1050, a qual citava uma transmutação fraudulenta em ouro por um judeu bizantino conhecido apenas como Paul.
Semelhantemente ao que ocorreu no Império Romano, a alquimia não era bem-vista pela Igreja Católica. Apesar disso, alguns religiosos exerceram a alquimia. Havia um conceito de que a transformação de um metal impuro em ouro, considerado o mais puro de todos, seria a personificação da ideia de salvação.
Foi durante a Idade Média que, preocupados com charlatões e perseguições políticas, os alquimistas criaram símbolos para se referir a processos ou substâncias, de modo que apenas os iniciados na arte soubessem interpretá-los, como a ouroboros (uma cobra que morde o próprio rabo, para representar a unidade da matéria), a salamandra (fogo), lobo (antimônio), além do homem e a mulher (ou rei e rainha, para representar a união entre enxofre e mercúrio).
A alquimia se tornou muito popular entre os anos 1560 e 1685, com diversas publicações em latim, alemão, uma parte considerável em francês e inglês, além de uma pequena parte em italiano. Foi com esse aumento de popularidade que a alquimia chamou a atenção de cientistas históricos, como Isaac Newton e Robert Boyle. Ambos, motivados por explicar sua crença religiosa por meio da compreensão da matéria e da natureza, investiram bons anos de suas vidas em trabalhos alquimistas.
Embora a alquimia não tenha deixado de ser praticada nos anos seguintes, é bem verdade que o Tratado de Química Elementar, de Antoine Lavoisier, auxiliou a distinguir a Química da alquimia, a partir do ano de 1789.
Quais os objetivos da alquimia?
A alquimia possuía dois objetivos principais: a capacidade de transmutar metais em outros mais evoluídos, como ouro, e a busca por um elixir da longa vida, o qual seria capaz de curar qualquer doença.
Contudo, deve-se entender que a alquimia transcendeu as técnicas experimentais puras feitas em laboratório. Ela acaba por se aliar também a uma evolução espiritual do seu praticante. O alquimista entende que ao realizar práticas que busquem materiais mais nobres, ele estaria evoluindo da mesma forma, purificando-se, elevando-se.
A relação do alquimista com a matéria é diferente do químico. Para o praticante da alquimia, a matéria deve passar pelo seu constituinte básico, conhecido como prima materia, para ser manipulada de forma exitosa. Assim, as técnicas realizadas em laboratório buscavam produzi-la.
Outro exemplo da relação com a matéria na alquimia é a noção de que como os metais crescem do solo, eles gradualmente mudam de uma forma metálica para outra melhor e mais estável. Assim, sendo o ouro o mais nobre e estável de todos os metais, seria esse o elemento a ser alcançado (de fato, o ouro é um metal quimicamente inerte). O alquimista, então, tenta realizar no laboratório, em um menor intervalo de tempo, o que ele crê que a natureza levou milhares de anos para conseguir.
Relação entre a alquimia e a Pedra Filosofal
Na alquimia, a tão famosa “Pedra Filosofal” seria a chave para acelerar processos que levaram, em tese, milhares de anos para ocorrer na natureza, uma vez que essa era a grande dificuldade na produção da prima materia. Embora seja retratada, por algumas fontes, como uma pedra de coloração rubra (ou carmesim), a ideia é de que a Pedra Filosofal seria uma espécie de catalisador em pó que permitiria ao alquimista atingir o seu objetivo.
Contudo, sua produção se iniciaria pelo material básico, a prima materia. Alguns alquimistas chegaram a dizer que haveria três “pedras”, cada uma com um propósito diferente: uma vegetal, para estimular o crescimento; uma animal, para a cura de doenças; e uma mineral, para a transmutação de metais.
A verdade é que para a produção da prima materia era necessário fragmentar a matéria comum em sua busca. Era aí que entravam as técnicas laboratoriais que perduraram até os anos atuais, como a calcinação, o banho-maria (em referência à alquimista Maria, a Judia), a sublimação, a destilação, a purificação, entre outras.
Relação entre a alquimia e o elixir da vida
O elixir da vida era a ideia de que se poderia criar uma substância capaz de curar todas as doenças, aumentar a longevidade e, até mesmo, tornar o usuário imortal. A confecção do elixir da vida foi, sem dúvida, o principal objetivo dos alquimistas e seus patrocinadores (mais até que a busca pelo ouro).
A busca por tal substância é de grande importância, visto que poderia ser essencial para revolucionar a Medicina e os tratamentos disponíveis. Não à toa, surgiu um ramo da alquimia conhecido como iatroquímica, a alquimia voltada para a Medicina.
Por que a alquimia é importante?
Do ponto de vista do desenvolvimento da Química como ciência, a alquimia foi de extrema importância para a síntese de diversos compostos e o desenvolvimento de técnicas experimentais que se mantêm até os dias atuais.
A influência da metalurgia, a fermentação e outros processos de manufatura fizeram com que alquimistas se aventurassem em manipular metais e produzir substâncias importantes, como sais, óxidos, bases e ácidos, como o ácido clorídrico, o ácido nítrico, entre outros.
Da mesma forma, os alquimistas foram responsáveis por criar vários procedimentos experimentais, como a calcinação, a cristalização, a destilação, a sublimação, a evaporação, o banho-maria, entre outras diversas técnicas.
O conjunto desses conhecimentos era utilizado para decompor a matéria em busca dos objetivos principais da alquimia.
Veja também: Quais foram as principais descobertas científicas realizadas no século XVIII?
Alquimistas famosos
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Zósimo de Panópolis (século III d.C.): alquimista egípcio nascido em Panópolis, sul do Egito Romano. Escreveu Cheirokmeta, uma das mais antigas coleções de estudos de alquimia. É considerado o pai da alquimia.
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Maria, a Judia (entre o século III d.C.): alquimista egípcia que acreditava que tudo teria a mesma composição, porém a combinação entre os elementos da composição determinaria a forma final das coisas. Acreditava nos metais como algo vivo, os quais poderiam morrer. Aliás, também acreditava que a morte não seria o fim, mas apenas uma mudança de forma, como quando as plantas se tornam poeira quando queimam.
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Ge Hong (283-343 d.C.): alquimista chinês que acreditava que todos poderiam atingir a imortalidade. Durante seus experimentos em busca do ouro, ele, inadvertidamente, criou a base para a pólvora, ao combinar enxofre com salitre.
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Jäbir ibn Hayyan (século VIII d.C.): é conhecido no Ocidente como Geber. Foram atribuídos a ele diversos escritos alquimistas (cerca de 500). Por isso, é considerado como o Pai da Química para os islâmicos. A ele é creditado o uso de mais de 20 equipamentos básicos de laboratório, como alambique e retorta, além de ele ter descrito processos como a cristalização e a destilação.
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Paracelso (1493-1541): acreditava que a composição do corpo humano não era diferente da composição dos materiais da alquimia. Ou seja, assim como metais básicos poderiam ser transmutados em ouro, o corpo poderia se curar pela utilização de compostos químicos. Apesar da excelente ideia, era comum que Paracelso receitasse curas usando arsênio, mercúrio e chumbo, alguns dos elementos químicos mais tóxicos ao ser humano.
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Nicolau Flamel (1330-1418): era proprietário de uma livraria em Paris e grande entusiasta da alquimia. A ele é atribuído o feito de transformar o chumbo em ouro, o qual foi registrado em um livro totalmente codificado (para que apenas seu sobrinho conhecesse o segredo). Aparentemente, Flamel transformava o chumbo em um metal, o qual seria transformado em prata, para então haver a obtenção do ouro. Há quem acredite que ele tenha alcançado o elixir da longa vida e hoje esteja morando em um centro de meditação na Índia, junto a sua esposa, Pernelle.
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Isaac Newton (1643-1727): o lendário matemático, físico e astrônomo foi um grande entusiasta da alquimia. Newton acreditava que seria capaz de criar a Pedra Filosofal. Nos seus trabalhos não publicados, o cientista inglês tentava decifrar artigos alquimistas, o que era difícil por conta de sua escrita única e sua codificação. Estima-se que Newton investiu mais de 30 anos no estudo da alquimia.
Alquimia na atualidade
Atualmente, com a modernização cada vez maior da Química, é bem verdade que a alquimia parece estar esquecida. Contudo, durante o século XX, a alquimia teve algumas contribuições e alguns entusiastas por meio da busca ao elixir da longa vida e da transmutação de algum metal em ouro.
Na década de 1920, o Dr. Irvine Masson disse, em entrevista ao periódico Daily Mail, que até o momento, transmutações de átomos de elementos mais leves ao ouro não haviam sido realizadas, mas que o cientista Ernest Rutherford conseguiu desintegrar elementos em outros mais leves, deixando no ar a ideia de que a transmutação ao ouro era possível.
Na década de 1960, a física Judith Temperley bombardeou mercúrio com nêutrons de alta energia, destruindo um dos 80 prótons do elemento, em um processo conhecido como “captura de elétrons”. O que restou foi um átomo com 79 prótons no núcleo, atribuído ao elemento químico ouro. Na década de 1980, o vencedor do Prêmio Nobel Glenn Seaborg transmutou diversos átomos de bismuto em ouro. Isso foi usado pelos alquimistas para comprovar que a transmutação ao ouro enfim foi alcançada.
O psicólogo suíço Carl Jung (1875-1961) utilizou textos e livros alquimistas nas décadas de 1920 e 1930 para criar algumas correlações entre símbolos alquimistas com aquilo que era descrito pelo que seus clientes sonhavam.
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