Acidente de Chernobyl
O acidente nuclear de Chernobyl aconteceu em Pripyat, cidade soviética localizada na atual Ucrânia, no dia 26 de abril de 1986. O acidente ocorreu quando o reator quatro da usina nuclear dessa cidade explodiu, deixando o reator aberto e lançando grande quantidade de material radioativo na atmosfera.
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O que foi o acidente de Chernobyl?
O acidente de Chernobyl foi um desastre nuclear que aconteceu na Central Nuclear de V. I. Lenin, usina nuclear que ficava em Pripyat, cidade localizada na União Soviética, atualmente Ucrânia. Esse acidente aconteceu às 1h23 de 26 de abril de 1986. Na ocasião, a usina passava por uma manutenção, quando uma falha humana levou a uma explosão no reator 4.
Além da falha humana, a explosão foi resultado de problemas no projeto do reator RBMK (Reactor BolshoMoshchnosty Kanalny). Esses reatores eram muito comuns na União Soviética, mas eram considerados altamente instáveis, sobretudo quando trabalhavam com potência reduzida. Com a explosão, dois trabalhadores da usina morreram imediatamente e um incêndio se iniciou.
O incêndio no reator se estendeu durante dias e as autoridades locais procuraram, sem sucesso, apagá-lo. Com a explosão, o reator e seu material radioativo ficaram expostos, fazendo com que esse material fosse lançado na atmosfera. Essa radiação se espalhou e alcançou regiões próximas como a Bielorrússia e a Rússia (ambas faziam parte da União Soviética), mas também locais como Suécia, Áustria e, até mesmo, o Canadá.
Os suecos, por sua vez, foram os primeiros a identificar que algum acidente radioativo havia acontecido na União Soviética e logo informaram a comunidade internacional. Eles descobriram o fato em razão dos níveis anormais na radioatividade na atmosfera. A princípio, os soviéticos se negaram a reconhecer, mas, no dia 28 de abril, admitiram que um acidente havia acontecido em Pripyat.
O que causou o acidente de Chernobyl?
Como mencionado, o acidente de Chernobyl aconteceu devido a falhas humanas durante um teste de segurança. O objetivo desse teste era determinar o tempo em que as turbinas continuavam operantes, a baixas potências, após uma queda de energia. Na ocasião, os operadores da usina deixaram de seguir uma série de protocolos, causando, assim, a instabilidade de um dos reatores nucleares e, consequentemente, uma grande explosão.
Apesar de a ação humana ter sido a principal causa de todo o desastre, os reatores nucleares do tipo RBMK, que, como vimos, eram usados em diversas usinas nucleares da União Soviética, possuíam moderadores de carbono, os quais causaram o superaquecimento da água quando a potência do reator foi reduzida.
Como ocorreu o acidente de Chernobyl?
Ao todo, duas explosões foram registradas no reator 4 da usina de Chernobyl. A primeira explosão foi suficientemente forte para desprender o escudo protetor instalado logo acima do reator, que pesava mais de 1000 toneladas, lançando para o ar alguns produtos de fissão nuclear extremamente nocivos, como iodo-131, césio-137 e estrôncio-90.
A segunda explosão, por sua vez, fez com que mais de 300 kg de blocos de grafite, localizados entre as hastes de combustível, fossem lançados para fora das instalações da usina. Com isso, o reator começou a pegar fogo, e uma enorme quantidade de elementos radioativos foi lançada para a atmosfera durante cerca de 10 dias, até que o incêndio foi contido.
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Como funcionava a usina de Chernobyl?
A usina de Chernobyl funcionava de forma similar a qualquer outra usina nuclear. Nesse tipo de usina, há um reator, onde são inseridas longas hastes metálicas que armazenam cápsulas do combustível físsil, geralmente feitas de urânio-235 ou plutônio. Na usina de Chernobyl, essas hastes eram periodicamente recarregadas com o máximo de 192 toneladas de urânio.
Por meio da fissão nuclear do urânio, extrai-se uma grande quantidade de energia térmica, usada para aquecer um circuito primário — onde circula água pura (destilada) —, que é disposto em hastes verticais e que fica em contato direto com o reator nuclear, bem como um circuito de água secundário, aquecido pela água do circuito primário, que circula por uma espécie de serpentina.
Desse modo, a água que contém isótopos radioativos e a água do circuito secundário não se misturam. Além desses circuitos, na usina de Chernobyl havia também um circuito de refrigeração, que fazia circular cerca de 48 mil metros cúbicos de água por hora, que ajudavam a manter a temperatura do reator nuclear sob controle. Essa água era bombeada por motores elétricos, fundamentais para o bom funcionamento de toda a usina.
Ao ser aquecida a cerca de 270 ºC, a água do circuito secundário evapora e, então, sob altas pressões (cerca de 60 atm), move as turbinas do gerador. Essas turbinas giram um conjunto de grandes ímãs e bobinas condutoras, que produzem a energia elétrica a partir do fenômeno de indução eletromagnética.
Diferentemente da maior parte dos reatores nucleares modernos, que utilizam água para reduzir a velocidade da reação nuclear, os reatores da usina de Chernobyl utilizavam carbono como moderador de nêutrons. Moderador é o nome da substância usada para diminuir a transferência de calor do reator para os circuitos de refrigeração.
A utilização do carbono, entretanto, foi uma das causas do desastre nucelar. Hoje em dia, é sabido que, em regimes de baixas potências, o carbono absorve nêutrons em uma taxa muito alta, fazendo com que o sistema de refrigeração do reator perca sua eficiência e a temperatura de todo o sistema aumente consideravelmente. Além disso, na tentativa de contornar o superaquecimento do reator, os operadores da usina inseriram uma grande quantidade de hastes de controle; no entanto, a inserção de tais hastes derramou um volume considerável de água dos circuitos principais, causando, assim, a primeira explosão do reator.
Contenção de danos do acidente em Chernobyl
A princípio, a resposta das autoridades soviéticas foi lenta e cautelosa. Elas não sabiam a extensão dos danos causados pela explosão e nem que o reator estava exposto, mas, ainda assim, elas evitaram realizar a evacuação imediata da Pripyat. O trabalho de evacuação demorou 36 horas para ser iniciado e forçou os 50 mil habitantes da cidade a saírem dali.
Ao todo, o governo soviético mobilizou mais de 1000 ônibus para retirar a população de Pripyat. As pessoas foram informadas de que seria uma remoção temporária e, por isso, não levaram pertences pessoais e tudo ficou abandonado na cidade. Ao longo do ano de 1986, um total de 115 mil pessoas foram evacuadas de regiões próximas da área afetada.
O total de pessoas evacuadas chegou a mais de 300 mil, uma vez que regiões na Ucrânia, Bielorrússia e Rússia foram severamente afetadas pela radiação. Além disso, o governo soviético criou uma zona de exclusão na qual toda uma região no raio de 30 quilômetros da usina não poderia ter a presença humana, a não ser para casos com a devida autorização. Até hoje, é proibida a presença humana nessa zona.
Uma vez que se identificou que o que acontecia em Pripyat era grave, o governo soviético montou um comitê responsável pela contenção dos danos. Uma das decisões desse comitê foi enviar centenas de milhares de pessoas para a região de Pripyat com o objetivo de conter os danos do acidente nuclear.
Essas pessoas receberam o nome de “liquidadores” e incluíam soldados, bombeiros, cientistas, entre outros. Estima-se que de 600 mil a 800 mil pessoas tenham sido enviadas para trabalhar na contenção de danos e muitos desses não tinham ideia dos riscos a que seriam submetidos com o seu trabalho.
A escritora bielorrussa Aleksana Aleksievitch aponta que, no caso da Bielorrússia, por exemplo, mais de 115 mil pessoas trabalharam como liquidadores e, de 1990 a 2003, cerca de 8500 morreram |1|. Muitas das pessoas que foram enviadas para ajudar a conter os danos de Chernobyl foram motivadas a ir por promessas de bons salários e pelo sentimento de patriotismo.
A cientista Elena Kozlova, por exemplo, trabalhou como liquidadora e, ao final de seus serviços, recebeu um pagamento 10 vezes maior do que recebia usualmente|2|. Apesar dos bons salários prometidos, os riscos eram maiores, e muitos dos liquidadores morreram depois de trabalhar por poucas semanas, pois tiveram contato com altas doses de radiação.
Um dos trabalhos mais perigosos era o dos liquidadores escolhidos para varrer os escombros do reator 4 que estavam no teto da usina nuclear. Outros liquidadores receberam missões como enterrar tudo que estivesse contaminado, matar animais domésticos abandonados, fazer medições dos níveis de radiação, etc.
Depois que todo o trabalho de contenção foi realizado, as autoridades soviéticas deram início à construção da estrutura que encapsulou o reator 4, para impedir que o reator continuasse lançando radioatividade na atmosfera. Essa estrutura recebeu o nome de Sarcófago de Chernobyl.
Sarcófago de Chernobyl
O sarcófago de Chernobyl era uma estrutura de mais de 7300 toneladas e 400.000 m³ de aço e concreto. Foi instalado ao redor do núcleo derretido do reator, a região mais perigosa de toda a zona de exclusão. O intuito da estrutura era cobrir o reator, protegendo-o da exposição climática (chuvas e ventos) para que os isótopos radioativos não se espalhassem ainda mais para a atmosfera. O sarcófago cobria quase 200 toneladas de lava radioativa — originária do material utilizado para conter o incêndio do reator —, 30 toneladas de poeira contaminada e 16 toneladas de urânio e plutônio.
O sarcófago teve de ser substituído por um novo tipo de confinamento, uma vez que a radiação havia deteriorado a estrutura quase por completo. A nova cobertura, além de ser mais resistente e ter sido projetada para aguentar por pelo menos 100 anos, também filtra os gases radioativos que deixam o núcleo do reator.
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Consequências do acidente em Chernobyl
O acidente de Chernobyl deixou consequências terríveis, principalmente para os três países mais afetados, que foram Ucrânia, Bielorrússia e Rússia. Na década de 1980, o desastre serviu para desmoralizar o governo soviético internacionalmente e contribuiu para que Mikhail Gorbachev promovesse o desarmamento nuclear soviético.
Além disso, os impactos do acidente na economia soviética, que já sofria com os gastos da Guerra do Afeganistão, contribuíram para agravar a crise econômica que se arrastava na URSS desde a década de 1970. Esses impactos na economia continuaram depois que a União Soviética foi desmembrada em quinze novos países, no começo da década de 1990.
O país mais afetado pelo acidente foi a Bielorrússia, nação que viu mais de 20% do seu território ser contaminado (a Bielorrússia tem uma área com tamanho aproximado do território do estado do Paraná). Com isso, o país perdeu cerca de ¼ das suas terras cultiváveis e, nos 30 anos seguintes ao acidente, teve prejuízos econômicos de cerca de 235 bilhões de dólares. Além disso, o governo bielorrusso gastou cerca de 18 bilhões em medidas contra as consequências do acidente|4|.
Os territórios ucraniano e russo foram afetados em menor escala, sendo 7,5% para a Ucrânia e 1,5 para a Rússia|4|. Na Ucrânia, estima-se que de 5% a 7% do orçamento do país seja gasto anualmente com despesas relacionadas a Chernobyl. Já a Bielorrússia gastou, até 2002, cerca de 22% do seu orçamento anual com consequências do acidente e, desde 2002, esse valor caiu para 6%|3|.
O acidente ainda contribuiu para afetar severamente a saúde da população. Os casos de câncer aumentaram de forma considerável na população ucraniana e bielorrussa, além dos casos de doenças cardiovasculares também terem aumentado. Por fim, não pode ser destacado o impacto psicológico desse acidente, que tirou mais de 300 mil pessoas de suas casas. Até hoje não se sabe ao certo quantas pessoas morreram em consequência de Chernobyl.
Notas
|1| ALEKSIEVITCH, Svetlana. Vozes de Tchernóbil: a história oral do desastre nuclear.
|2| Os ‘liquidadores’ que limparam Chernobyl. Para acessar, clique aqui.
|3| Cernobyl Nuclear Accident. Para acessar, clique aqui [em inglês].
|4| The global catastrophe is a national disaster. Para acessar, clique aqui [em inglês].
Créditos das imagens:
[1] Argonne National Laboratory
[2] Olga Vladimirova e Shutterstock