Triste fim de Policarpo Quaresma
Triste fim de Policarpo Quaresma é uma obra do escritor carioca Lima Barreto. De forma irônica, a narrativa mostra o esforço do protagonista — o major Quaresma — para inspirar aqueles que o cercam a amar o Brasil. Assim, ele valoriza a cultura tipicamente brasileira e vê na agricultura um meio de enriquecimento da nação.
Esse romance é uma das principais obras do pré-modernismo, um período literário em que estão inseridas as obras brasileiras publicadas entre 1902 e 1922. Desse modo, o livro de Lima Barreto possui caráter realista e, portanto, antirromântico. Seu cômico protagonista tem a função de nos mostrar a verdadeira face do Brasil.
Leia também: Dom Casmurro — análise da obra mais conhecida de Machado de Assis
Resumo da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
-
A obra Triste fim de Policarpo Quaresma é um romance escrito por Lima Barreto.
-
O escritor brasileiro Lima Barreto nasceu em 1881 e faleceu em 1922.
-
Triste fim de Policarpo Quaresma conta a história de um ingênuo patriota.
-
Quaresma busca valorizar as coisas de seu país, mas só encontra decepção.
-
O patriotismo exagerado torna o protagonista motivo de zombaria e o coloca em situações vexatórias.
-
Depois de passar um tempo internado em um hospício, Quaresma decide viver em um sítio, tentando a sorte como agricultor.
-
Sem sucesso, retorna à cidade, mas é preso ao envolver-se em uma luta armada.
-
Quaresma finalmente cai em si e abandona a ideia romântica que tem sobre a realidade do Brasil.
-
O romance está inserido no pré-modernismo e apresenta crítica sociopolítica.
Videoaula sobre a obra Triste fim de Policarpo Quaresma
Análise da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
→ Enredo da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
Policarpo Quaresma, “mais conhecido por Major Quaresma”, é o protagonista. Trabalha no Arsenal de Guerra. Portanto, é um funcionário público. A principal característica de Quaresma é seu patriotismo:
Policarpo era patriota. Desde moço, aí pelos vinte anos, o amor da pátria tomou-o todo inteiro. Não fora o amor comum, palrador e vazio; fora um sentimento sério, grave e absorvente. Nada de ambições políticas ou administrativas; o que Quaresma pensou, ou melhor: o que o patriotismo o fez pensar foi num conhecimento inteiro do Brasil, levando-o a meditações sobre os seus recursos, para depois então apontar os remédios, as medidas progressivas, com pleno conhecimento de causa.
Dessa forma, Quaresma sempre esteve atento às coisas do Brasil, como sua cultura, história, política e elementos naturais. Mas esse seu exagerado interesse pela nação brasileira é visto, por alguns, como sendo algo digno de zombaria. Por se dedicar ao estudo do tupi-guarani, os colegas de repartição lhe dão o apelido de Ubirajara.
Um dos principais amigos de Policarpo é Ricardo Coração dos Outros, “homem célebre pela sua habilidade em cantar modinhas e tocar violão”. Esse instrumento se torna um dos interesses patriotas do protagonista, que chega à conclusão de que a modinha acompanhada pelo violão é uma expressão artística tipicamente brasileira.
Em seus estudos das coisas do Brasil, volta às origens, aos tupinambás, e passa a defender que não devemos nos cumprimentar com apertos de mão. O cumprimento nacional e, portanto, patriótico deve ser chorar exagerada e teatralmente, já que essa seria uma recepção digna de um tupinambá, que chorava ao encontrar com amigos.
Esse estranho comportamento do major faz com que seu compadre Vicente duvide de sua saúde mental. Dona Adelaide, irmã de Policarpo, também fica preocupada com a atitude excêntrica do irmão. Essa sua mania de estudar os costumes indígenas faz com que Quaresma redija um requerimento à Câmara. Nesse documento, solicita que o tupi-guarani se torne a língua oficial do país.
Tal acontecimento ganha espaço nos jornais, e o ingênuo Quaresma vira motivo de riso e zombaria por parte dos brasileiros. É, inclusive, repreendido pelo diretor do Arsenal de Guerra, quando, por descuido, escreve um ofício em tupi, o que faz com que o major seja punido com suspensão.
Mais tarde, quando Quaresma fica alguns meses internado em um hospício, apenas três pessoas o visitam: o compadre, a afilhada Olga e Ricardo. Já Adelaide não consegue visitar o irmão, pois era “tal o seu abalo de nervos, era tal a emoção ao vê-lo ali naquela meia-prisão, decaído dele mesmo que um ataque se seguia e não podia ser evitado”.
Aposentado, Quaresma decide viver no Sossego, seu sítio. Ali, dá vazão à sua nova obsessão — a agricultura:
A ideia caiu-lhe na cabeça e germinou logo. O terreno estava amanhado e só esperava uma boa semente. Não lhe voltou a alegria que jamais teve, mas a taciturnidade foi-se com o abatimento moral, e veio-lhe a atividade mental cerebrina, por assim dizer, de outros tempos. [...]. Planejou a sua vida agrícola com a exatidão e meticulosidade que punha em todos os seus projetos. Encarou-a por todas as faces, pesou as vantagens e ônus; e muito contente ficou em vê-la monetariamente atraente, não por ambição de fazer fortuna, mas por haver nisso mais uma demonstração das excelências do Brasil.
Em Curuzu, onde fica o sítio de Policarpo, há muita miséria. Dessa forma, o narrador contraria a idealização romântica de que o homem do campo é feliz. E mostra a realidade brasileira. Nessa sua experiência agrícola, o major esbarra com dificuldades naturais (as saúvas) e aquelas causadas pela perseguição política dos poderosos da região.
Ao desistir da aventura agrícola, volta para a cidade do Rio de Janeiro e envereda pelo caminho da luta armada, em apoio ao presidente Floriano Peixoto. Estamos falando da segunda Revolta da Armada. O major se torna voluntário em defesa do governo vigente, em uma atitude que considera patriótica. Já Ricardo Coração dos Outros não tem escolha, é obrigado a servir à nação.
Desse modo, Policarpo Quaresma vivencia sua última decepção. Ele percebe que tudo aquilo não faz sentido. Afinal, brasileiros estão lutando contra brasileiros. E os prisioneiros capturados pelas forças governamentais recebem tratamento desumano. Ao questionar tal situação, Quaresma é preso.
Ironicamente, o maior patriota do Brasil é acusado de traição apenas por questionar as atitudes do governo vigente. Então, depois de tantos anos de idealizações, Quaresma para de romantizar a realidade brasileira, enxerga as coisas como elas realmente são e chega, assim, a seu triste fim.
Apesar do empenho de Ricardo e de Olga, o major Quaresma não recebe o perdão. A afilhada, inclusive, solicita uma reunião com o presidente, mas sem sucesso:
[...] teve vergonha de ter ido pedir, de ter descido do seu orgulho e ter enxovalhado a grandeza moral do padrinho com o seu pedido. Com tal gente, era melhor tê-lo deixado morrer só e heroicamente num ilhéu qualquer, mas levando para o túmulo inteiramente intacto o seu orgulho, a sua doçura, a sua personalidade moral, sem a mácula de um empenho que diminuísse a injustiça de sua morte, que de algum modo fizesse crer aos seus algozes que eles tinham direito de matá-lo.
→ Tempo da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
O tempo da narrativa está situado nos anos que se seguem à Proclamação da República. Assim, os acontecimentos que compõem o final da história se referem ao governo do ditador Floriano Peixoto. Além disso, predomina, na obra, o tempo cronológico.
→ Espaço da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
O protagonista vive na cidade do Rio de Janeiro, principal espaço de ação dessa narrativa de Lima Barreto. Porém, por um tempo, Quaresma reside em um sítio em Curuzu.
→ Narrador da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
Narrador em terceira pessoa, onisciente, isto é, tem o conhecimento total acerca dos fatos e dos personagens.
→ Personagens da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
-
Adelaide
-
Albernaz
-
Anastácio
-
Antonino Dutra
-
Armando Borges
-
Campos
-
Cavalcanti
-
Doutor Rocha
-
Felizardo
-
Floriano Peixoto
-
Genelício
-
Ismênia
-
Lalá
-
Maricota
-
Olga
-
Policarpo Quaresma
-
Quinota
-
Ricardo Coração dos Outros
-
Vicente Coleoni
- Zizi
Veja também: Euclides da Cunha — escritor pré-modernista e autor da grande obra Os Sertões
Características da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
O romance está inserido no período literário conhecido como pré-modernismo, que engloba obras publicadas entre 1902 e 1922. Assim, o livro traz uma perspectiva realista e faz crítica social e política. A obra é irônica e condena o nacionalismo cego, sem criticidade. Desse modo, apresenta uma concepção antirromântica.
Triste fim de Policarpo Quaresma está dividido em três partes e possui um total de 15 capítulos:
-
Primeira parte da obra: mostra a vida de Policarpo Quaresma no subúrbio do Rio de Janeiro.
-
Segunda parte da obra: relata sua experiência frustrada no sítio Sossego.
-
Terceira parte da obra: narra seu envolvimento na Revolta da Armada.
Contexto histórico da obra Triste fim de Policarpo Quaresma
Com o fim da monarquia e a proclamação da República, em 1889, o Brasil passou a ser governado pelo primeiro presidente do Brasil, o marechal Deodoro da Fonseca (1827-1892). Seu governo, de caráter ditatorial, durou até 1891, quando teve início a primeira Revolta da Armada.
Assim, com a renúncia de Deodoro, assumiu o poder o vice-presidente Floriano Peixoto (1839-1895), também um ditador. A insatisfação de alguns militares deu origem à segunda Revolta da Armada, iniciada em 1893 e finalizada em 1894, com a derrota dos rebeldes. No final de 1894, subiu ao poder o primeiro presidente civil do país — Prudente de Morais (1841-1902).
Nesse contexto, o personagem fictício Policarpo Quaresma demonstra seu nacionalismo exagerado. Esse patriota ingênuo defende as riquezas do país, como a cultura e a agricultura. Mas, ao se envolver na luta armada a favor do presidente Floriano Peixoto, fica decepcionado quando enxerga a verdadeira face do país e dos brasileiros.
Triste fim de Policarpo Quaresma no cinema
Em 1998, estreou, nos cinemas brasileiros, a adaptação do livro de Lima Barreto, com o título Policarpo Quaresma: herói do Brasil. O filme foi dirigido por Paulo Thiago (1945-2021) e teve o roteiro assinado pelo escritor Alcione Araújo (1945-2012). O protagonista é interpretado pelo famoso ator Paulo José (1937-2021).
A obra cinematográfica recebeu os seguintes prêmios:
-
Prêmio Estação Botafogo de Cinema Brasileiro;
-
Melhor filme, pelo júri popular, no Festival de Cinema e Vídeo;
-
Melhor ator, para Paulo José, no Festival de Cinema e Vídeo;
-
Melhor direção, para Paulo Thiago, no Festival de Cinema Latino-Americano.
Saiba mais: Semana de Arte Moderna — evento que deu visibilidade ao modernismo no Brasil
Quem foi Lima Barreto?
Lima Barreto é um escritor brasileiro. Ele nasceu no dia 13 de maio de 1881. Esse carioca perdeu a mãe, uma professora primária, quando tinha apenas seis anos de idade. A avó materna do romancista era uma escrava alforriada. Já o pai era tipógrafo; porém, foi acometido por uma doença mental.
Por ser afilhado do Visconde de Ouro Preto (1836-1912), o jovem escritor pôde estudar no Colégio Pedro II. Também iniciou curso de Engenharia na Escola Politécnica, mas não chegou a se formar, pois precisou trabalhar, como funcionário público. O autor morreu em 1º de novembro de 1922, no Rio de Janeiro.
Crédito da imagem
[1] Ezarate/ Wikimedia Commons
Fontes
ABAURRE, Maria Luiza M.; PONTARA, Marcela. Literatura brasileira: tempos, leitores e leituras. 3. ed. São Paulo: Editora Moderna, 2015.
CENTRO Cultural Banco do Brasil. Policarpo Quaresma — herói do Brasil. Disponível em: http://ocinemadeothonbastos.com.br/filmes/filme09.html.
LIMA BARRETO. Triste fim de Policarpo Quaresma. Porto Alegre: L&PM, 1998.
LITERAFRO. Lima Barreto: dados biográficos. Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/literafro/autores/450-lima-barreto.
MUSEUAFROBRASIL. Lima Barreto. Disponível em: http://www.museuafrobrasil.org.br/pesquisa/história-e-memória/historia-e-memoria/2014/07/17/lima-barreto.
PIMENTA, Shyrley. Psicanálise e literatura: o corpo humilhado em Lima Barreto. 2007. 122 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Aplicada) – Instituto de Psicologia, Universidade Federal de Uberlândia, 2007.
PINHEIRO, Eloísa Petti. O caso do Rio de Janeiro. In: PINHEIRO, Eloísa Petti. Europa, França e Bahia: difusão e adaptação de modelos urbanos (Paris, Rio e Salvador). 2. ed. Salvador: EDUFBA, 2011. p. 89-173.