Mais-valia
A mais-valia é um conceito central na crítica de Karl Marx ao capitalismo, representando o trabalho não pago ao trabalhador. Esse conceito explica que parte do valor produzido pelo trabalho é apropriada pelo dono dos meios de produção, resultando em lucro para o capitalista. Segundo a teoria do valor-trabalho, o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para produzi-la.
Assim, a mais-valia é a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador. Marx argumenta que essa exploração é a base das desigualdades sociais e das crises econômicas no sistema capitalista, onde a luta de classes emerge como uma consequência inevitável dessa dinâmica.
A alienação é intrinsecamente ligada à mais-valia, pois a exploração do trabalhador por meio da mais-valia é a base material da alienação. Marx argumenta que, sem alienação, os trabalhadores teriam controle sobre o processo de produção e o produto, impossibilitando a apropriação do valor excedente pelo capitalista.
Leia também: Como Marx e Engels definem a consciência de classe
Resumo sobre mais-valia
- Mais-valia é a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador.
- Ocorre quando o patrão acumula parte do valor criado pelos funcionários, enquanto o trabalhador é privado de grande parte do valor que cria.
- A mais-valia depende da teoria do valor-trabalho, que estabelece que o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para produzi-la.
- Por causa da mais-valia, a sociedade capitalista é dividida em duas classes com projetos antagônicos: proletariado e burguesia.
- A mais-valia absoluta é obtida aumentando a jornada de trabalho sem aumentar o salário, o que a torna limitada.
- A mais-valia relativa é obtida aumentando a produtividade do trabalho por meio de avanços tecnológicos ou melhorias na organização do trabalho, e dela vem a maior parte do lucro.
- Mais-valia e alienação são conceitos centrais na teoria de Karl Marx.
- A alienação refere-se ao processo pelo qual o trabalhador se torna estranho ao produto de seu trabalho.
- Por causa da mais-valia e da alienação, no capitalismo, a força de trabalho do trabalhador é transformada em uma atividade forçada e desumanizante.
Videoaula sobre mais-valia
O que é mais-valia?
A mais-valia é o trabalho que não é pago ao trabalhador. Isso acontece porque uma parte do valor produzido pelo seu trabalho é apropriada pelo dono dos meios de produção. A mais-valia, portanto, é a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador, e que retorna para o patrão sob a forma de lucro.
Em outras palavras, enquanto o salário é o trabalho pago ao trabalhador, para que ele possa arcar com os custos de sua sobrevivência, a renda do patrão é obtida pela mais-valia. A mais-valia é um conceito central na crítica de Karl Marx ao modo de produção capitalista. O objetivo de Marx, com a mais-valia, é demonstrar que esse modo de produção se baseia na exploração da classe trabalhadora e em outras injustiças.
→ Mais-valia na teoria do valor-trabalho
É importante explicar a geração da mais-valia com base na teoria do valor-trabalho, que estabelece que o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para produzi-la. Esse trabalho abstrato pode ser medido em tempo, horas ou dias, e aqui é importante prestar atenção em um fato.
Para ilustrar a teoria do valor-trabalho, vamos imaginar o caso de um padeiro. O trabalho abstrato não é o tempo que um padeiro concreto leva para produzir pães, mas o tempo que seria socialmente necessário para produzi-los. Isso significa que se deve, primeiro, estabelecer uma sociedade e considerar o tempo médio que um padeiro dessa sociedade, usando as forças produtivas existentes, gastaria para produzir um pão.
Então, segundo a teoria do valor-trabalho, o valor de uma mercadoria deveria ser determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário gasto na sua produção. Sendo assim, quando alguém produz uma mercadoria, e depois a vende por certa quantidade de dinheiro, esse dinheiro representa determinada quantidade de tempo de trabalho abstrato (ou socialmente necessário).
Portanto, segundo essa teoria, se um celular vale o mesmo que quatro mil pães, é porque a fabricação do celular consumiu uma quantidade de trabalho humano quatro mil vezes maior do que a de um pão. É importante lembrar que o conceito de mais-valia depende da teoria do valor-trabalho para funcionar.
Veja também: O que é um trabalho informal e quais as suas vantagens e desvantagens?
Teoria da mais-valia, de Karl Marx
A teoria da mais-valia, conforme defendida por Karl Marx, argumenta que a origem da renda que o capital paga aos donos dos meios de produção (o lucro no capitalismo) está na exploração do trabalho e da classe trabalhadora. Para Marx, essa exploração é a base das desigualdades sociais e das crises econômicas no sistema capitalista. A luta de classes, portanto, emerge como uma consequência inevitável dessa dinâmica, em que os trabalhadores buscam recuperar o valor total de seu trabalho, apropriado indevidamente pelos capitalistas.
→ Como acontece o processo de obtenção da mais-valia?
A teoria da mais valia explica como a extração da mais-valia, no sistema capitalista, é fundamental para a geração do que chamamos de lucros. No capitalismo, a força de trabalho foi convertida em mais uma mercadoria disponível no mercado. O capitalista, então, compra a força de trabalho do trabalhador, pagando um salário que corresponde ao valor necessário para a subsistência do trabalhador e de sua família.
Esse salário é determinado pelo valor dos bens e serviços necessários para manter o trabalhador apto a continuar trabalhando. A força de trabalho, contudo, é uma mercadoria diferente das demais, porque o trabalhador usa sua força de trabalho para produzir outras mercadorias.
Então, durante a jornada de trabalho, o trabalhador cria valor por meio do processo produtivo. Sendo assim, a força de trabalho tem um valor de uso (a capacidade de realizar trabalho) e um valor de troca (o salário pago pelo capitalista). Só que o valor de uso da força de trabalho é superior ao seu valor de troca, pois o trabalhador pode produzir mais valor do que o necessário para cobrir seu salário.
O trabalhador, portanto, pode dividir a sua jornada de trabalho em duas partes. Uma parte é o tempo de trabalho necessário durante o qual o trabalhador produz valor equivalente ao seu salário. A outra parte é o tempo de trabalho excedente durante o qual o trabalhador continua a produzir valor, mas esse valor excedente é apropriado pelo capitalista como mais-valia.
-
Exemplo de obtenção de mais-valia
Para ver isso de forma simples e clara, vamos pegar um exemplo hipotético. Vamos supor que um trabalhador em uma fábrica de sapatos recebe um salário diário de 50 reais, o valor necessário para sua subsistência. Durante um dia de trabalho de 8 horas, ele produz sapatos que têm um valor de 150 reais.
As primeiras 3 horas de trabalho são suficientes para produzir o valor de 50 reais (tempo de trabalho necessário). As 5 horas restantes são o tempo de trabalho excedente, durante o qual ele produz um valor adicional de 100 reais. Esse valor excedente de 100 reais é a mais-valia, apropriada pelo capitalista.
Tipos de mais-valia
Para aumentar as taxas de mais-valia, o capitalista pode obter a mais-valia absoluta e a mais-valia relativa. Vamos conhecer melhor as diferenças entre esses dois tipos de mais-valia.
→ Mais-valia absoluta
A extração da mais-valia absoluta é obtida aumentando a jornada de trabalho sem aumentar o salário. Por exemplo, se um trabalhador é obrigado a trabalhar mais horas, o valor excedente produzido durante essas horas adicionais é apropriado pelo capitalista. Há um limite natural para a extração da mais-valia absoluta. Como o capitalista não pode aumentar a duração de um dia, ele só pode obter a mais-valia absoluta por 24 horas, sendo impossível aumentar a jornada de trabalho além disso. Por causa disso, o capitalista tenta ampliar seus lucros extraindo a mais-valia relativa.
→ Mais-valia relativa
A mais-valia relativa é obtida aumentando a produtividade do trabalho por meio de avanços tecnológicos ou melhorias na organização do trabalho, sem aumentar o salário. Assim, já que o capitalista não pode aumentar a duração do dia, para obrigar o trabalhador a trabalhar mais, ele faz com que o trabalhador trabalhe mais intensamente, obtendo uma mais-valia maior por cada hora de trabalho.
O capitalista consegue fazer isso ampliando as forças produtivas, por exemplo, investindo em tecnologia e novas organizações do trabalho. Isso permite que o trabalhador produza mais valor no mesmo período e aumenta a mais-valia relativa.
Exemplos de mais-valia
Suponha que um trabalhador na indústria têxtil produza 50 peças de roupa em 10 dias, gerando um valor de 1000 reais. Sendo assim, esse trabalhador, em um mês de trabalho (22 dias), produziria um valor de 2200 reais com o seu trabalho. No entanto, se o salário mensal desse trabalhador é de apenas 1200 reais, isso significa que o valor produzido nos 12 dias restantes (1000 reais) é apropriado pelo capitalista como mais-valia.
De onde surgiram esses 1000 reais que o capitalista está chamando de lucro? Já vimos que, segundo a teoria do valor-trabalho, a base do valor é o trabalho socialmente necessário na produção de mercadorias. O lucro, esse valor a mais, não surge do nada. Ele é justamente a parte de valor criado pelo trabalhador que não lhe foi paga como salário. Portanto, para que o capitalista possa lucrar, é necessário que o trabalhador não receba o equivalente total do seu trabalho em seu salário.
Segundo Marx, essa situação se repete não apenas uma, duas ou três vezes. Há séculos, o trabalhador recebe como pagamento por seu trabalho um salário suficiente apenas para a sua subsistência. O dono dos meios de produção, por outro lado, recebe pelo que rende a força de trabalho de cada um dos seus funcionários e devolve a eles uma quantidade sempre menor do que recebeu, porque ele tem lucro.
É importante lembrar que, segundo Marx, a força de trabalho representa a própria substância da vida. É dela que vem a capacidade humana de criar coisas novas, de transformar o mundo ao redor e nos transformarmos em nós mesmos.
O trabalho é a origem de toda cultura e consciência individual, pensa Marx. Sendo assim, o trabalhador assalariado, de cuja força de trabalho a mais-valia é extraída, é sempre prejudicado, recebendo em seu salário um valor menor do que aquele que criou com seu trabalho.
Em contrapartida a essa situação precária do trabalhador, todo mês o patrão coloca no bolso uma parte do valor criado por cada um de seus funcionários. Enquanto o trabalhador permanece privado de grande parte do valor que cria, sendo impedido de incrementar esse valor no próprio desenvolvimento, o dono dos meios de produção acumula capital e riqueza.
-
Mais-valia e divisão de classes
A sociedade capitalista, pensando assim, é dividida em duas classes antagônicas:
- de um lado, o proletariado, a classe trabalhadora, que tem a sua própria força de trabalho explorada;
- e de outro, a classe da burguesia (os capitalistas), que acumula uma fatia do valor criado por outros.
Qual a relação entre alienação e mais-valia?
Os conceitos de mais-valia e alienação são centrais na teoria de Karl Marx e estão profundamente interligados, ambos refletindo a crítica marxista ao sistema capitalista. Nesse sistema, enquanto a mais-valia é o aspecto material da exploração do trabalho, a alienação é a manifestação psicológica dessa exploração.
Enquanto mais-valia é o trabalho não pago no salário do trabalhador, a alienação em Marx refere-se ao processo pelo qual o trabalhador se torna estranho ao produto de seu trabalho, ao próprio ato de trabalhar, aos outros trabalhadores e, finalmente, a si mesmo.
Explicando melhor, a alienação começa com o trabalhador não reconhecendo o produto do seu trabalho como seu, pois ele é apropriado pelo capitalista para ser vendido como mercadoria. Isso acontece porque o trabalhador não tem controle sobre o processo de produção, ditado pelas necessidades do capitalista. Situação que leva à alienação em relação aos outros trabalhadores, uma vez que a competição e a divisão do trabalho fragmentam a solidariedade dos trabalhadores. Após renunciar ao outro, o trabalhador acaba alienado de si mesmo.
Você já se sentiu desumanizado pelo trabalho e mesmo assim sendo forçado a continuar no emprego? Marx acreditava que essa situação tem a ver com alienação e mais-valia. No final do processo de alienação, a força de trabalho do trabalhador, que deveria ser a expressão da sua capacidade e criatividade, é transformada em uma atividade forçada e desumanizante.
Desse modo, fica evidente que a ligação entre mais-valia e alienação é intrínseca. A exploração do trabalhador por meio da mais-valia é a base material da alienação. A mais-valia só é possível porque o trabalhador está alienado do produto de seu trabalho e do processo de produção. Essa alienação permite que o capitalista se aproprie do valor excedente gerado pelo trabalhador.
Em resumo, enquanto a mais-valia é a manifestação econômica da exploração do trabalho, a alienação é a manifestação psicológica dessa exploração. O que faz da alienação tanto uma condição necessária quanto uma consequência da extração de mais-valia. Sem a alienação, os trabalhadores teriam controle sobre o processo de produção e o produto, impossibilitando a apropriação do valor excedente pelo capitalista. Assim, a mais-valia e a alienação são dois lados da mesma moeda no sistema capitalista, ambos resultando na perpetuação da desigualdade e da exploração.
Saiba mais: Desigualdade de gênero — como se manifesta no ambiente familiar, na esfera pública e no mercado de trabalho
Origem e história da mais-valia
A origem e história da mais-valia é a obra Capital, de Karl Marx, publicada em 1867, na qual o autor introduziu o conceito como um aspecto fundamental da luta de classes no capitalismo. A leitura desse clássico revela a origem e história da mais-valia.
O conceito de mais-valia, como já observamos, é uma consequência da teoria do valor-trabalho. Essa teoria, defendida originalmente pelo economista britânico David Ricardo, é responsável por estabelecer que o valor de um bem tem origem no trabalho humano.
Tendo como origem a teoria defendida por David Ricardo, Karl Marx argumentou que o valor de uma mercadoria é determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-la. No entanto, no capitalismo, os trabalhadores não recebem o valor total do que produzem. Ainda, chamou a diferença entre o valor produzido e o salário pago de mais-valia, um valor que é apropriado indevidamente pelo capitalista, o que torna todo o sistema baseado na injustiça e na exploração.
Posteriormente, a teoria da mais-valia de Marx teve um impacto profundo na compreensão das relações de trabalho e na crítica ao capitalismo. Ela forneceu uma base teórica para movimentos operários e socialistas, que lutavam por melhores condições de trabalho e salários justos. No entanto, a teoria também foi alvo de críticas, especialmente de economistas liberais, que argumentam que a mais-valia não leva em conta outros fatores de produção, como o capital e a gestão.
Exercícios resolvidos sobre mais-valia
1) (UEL)
(Disponível em: http://complexowill.blogspot.com/2010/08/precisamos-aprender-novos-conceitos.html. Acesso em: 24 out. 2010.)
Com base na charge e nos conhecimentos sobre a teoria de Marx, é correto afirmar:
a) A produção mercantil e a apropriação privada são justas, tendo em vista que os patrões detêm mais capital do que os trabalhadores assalariados.
b) Um dos elementos constitutivos da acumulação capitalista é a mais-valia, que consiste em pagar ao trabalhador menos do que ele produziu em uma jornada de trabalho.
c) A mercadoria, para poder existir, depende da existência do capitalismo e da substituição dos valores de troca pelos valores de uso.
d) As relações sociais de exploração surgiram com o nascimento do capitalismo, cuja faceta negativa está em pagar salários baixos aos trabalhadores.
e) Sob o capitalismo, os trabalhadores se transformaram em escravos, fato acentuado por ter se tornado impossível, com a individualização do trabalho e dos salários, a consciência de classe entre eles.
Resposta: B
Segundo Karl Marx, que adere à teoria do valor-trabalho, o valor de uma mercadoria depende do trabalho socialmente necessário para produzi-la. Sendo assim, o capitalista consegue acumular dinheiro porque ele extrai a mais-valia, deixando de pagar ao trabalhador uma parte do que ele produz e se apropriando dela como lucro.
2) (Enem) Na produção social que os homens realizam, eles entram em determinadas relações indispensáveis e independentes de sua vontade; tais relações de produção correspondem a um estágio definido de desenvolvimento das suas forças materiais de produção. A totalidade dessas relações constitui a estrutura econômica da sociedade — fundamento real, sobre o qual se erguem as superestruturas política e jurídica, e ao qual correspondem determinadas formas de consciência social.
MARX, K. “Prefácio à Crítica da economia política.” In: MARX, K.; ENGELS, F. Textos 3. São Paulo: Edições Sociais, 1977 (adaptado).
Para o autor, a relação entre economia e política estabelecida no sistema capitalista faz com que
a) o proletariado seja contemplado pelo processo de mais-valia.
b) o trabalho se constitua como o fundamento real da produção material.
c) a consolidação das forças produtivas seja compatível com o progresso humano.
d) a autonomia da sociedade civil seja proporcional ao desenvolvimento econômico.
e) a burguesia revolucione o processo social de formação da consciência de classe.
Resposta: B
Segundo a teoria do valor-trabalho, todo valor é gerado pelo trabalho, portanto, o trabalho se constitui como o fundamento real da produção de valor material.
Créditos das imagens
Fontes
COGGIOLA, O. A dialética de Hegel e o pensamento de Marx. Editora: Boitempo, São Paulo, 2015.
GRESPAN, J. Marx: trabalho, alienação e capital. Editora: Boitempo, São Paulo, 2012.
MARX, K. O Capital: crítica da economia política. Editora: Boitempo, São Paulo, 2013.
MARX, K. Teorias da mais-valia. Editora: Difel, São Paulo, 1974.
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Editora: Boitempo, São Paulo, 2010.
MARX, K. Contribuição à crítica da economia política. Editora: Boitempo, São Paulo, 2008.
MARX, K. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858. Editora: Boitempo, São Paulo, 2011.
PAULO NETTO, J. Karl Marx: uma biografia. Editora: Boitempo, São Paulo, 2018.