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Socialismo

Socialismo é um ideário político e econômico que propõe uma organização social baseada no princípio da igualdade na produção e na distribuição de bens entre seus membros.
Retrato desenhado de Saint-Simon, teórico do socialismo utópico.
Saint-Simon, teórico do socialismo utópico. O primeiro pensador a usar o termo socialismo.

Socialismo é uma doutrina econômica e política que nasceu no final do século XVIII, na Europa, em contraposição às iniquidades sociais produzidas em larga escala pelo fenômeno da Revolução Industrial. Defende a reformulação da sociedade capitalista, transformando-a numa sociedade justa e igualitária.

Para os socialistas utópicos, isso seria possível sem a destruição do capitalismo. Para os socialistas científicos, isso só seria possível com a destruição do capitalismo. A primeira corrente era reformista; a segunda, revolucionária. Porém, as experiências reais de sociedades socialistas são diferentes das idealizações de ambas.

Leia também: Anarquismo – modelo socioeconômico que visa ao fim do capitalismo e do Estado

Origem e história do socialismo

O socialismo é um ideário político e econômico concebido no contexto da Revolução Industrial, em fins do século XVIII e meados do século XIX. Tendo por princípio basilar a igualdade, o socialismo foi construído em contestação ao capitalismo, que naquele período operava sem nenhuma forma de regulação ou legislação trabalhista que conferisse aos trabalhadores proteção e condições dignas de trabalho.

A Revolução Industrial, embora seja um marco de modernização da produção de riqueza, foi marcada por:

  • graves violações ao operariado;

  • insalubridade e precariedade nos ambientes fabris, que adoeciam muitos operários ou os tornavam vulneráveis a acidentes de trabalho, inclusive fatais;

  • jornadas de trabalho de até 18 horas;

  • baixos salários;

  • emprego de crianças e adolescentes, que, devido às jornadas exaustivas, exposição a doenças e acidentes, além da má alimentação, sequer se desenvolviam plenamente para a vida adulta, tendo sua expectativa de vida diminuída.

Era o “capitalismo selvagem” em sua expressão exata, bem diferente do que conhecemos hoje depois de inúmeras lutas civis que garantiram:

  • limite de jornada de trabalho;

  • um dia de descanso semanal;

  • equipamento de proteção no ambiente de trabalho;

  • um salário mínimo como piso para estipular remuneração;

  • progressão salarial;

  • aposentadoria;

  • indenização em caso de acidentes;

  • vedação de trabalho infantil, entre outros direitos.

Numa conjuntura social de intensificação das desigualdades sociais e, consequentemente, da miséria, a teoria socialista foi criada por pensadores que desejavam construir um caminho para uma sociedade organizada sob o princípio da igualdade. A primeira corrente de pensamento de vertente socialista foi denominada socialismo utópico. Posteriormente foi desenvolvido o socialismo científico.

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Características do socialismo

As características do socialismo variam conforme a vertente de pensamento. O ponto em comum é a busca da igualdade, mas os caminhos propostos para alcançá-la são distintos.

No socialismo utópico, podemos destacar:

  • combate à desigualdade por meio da reforma do capitalismo;

  • conciliação entre as classes;

  • cooperação nas relações de trabalho e distribuição da riqueza produzida.

O socialismo científico, vertente revolucionária desse pensamento, tem características substancialmente diferentes da primeira vertente. Ele propõe:

  • combate à desigualdade por meio da extinção do capitalismo;

  • uma sociedade sem classes;

  • abolição da propriedade privada e socialização dos meios de produção.

Tipos de socialismo

  • Socialismo utópico

A primeira corrente do pensamento socialista foi denominada socialismo utópico e desenvolvida na Primeira Revolução Industrial. O filósofo e economista francês Saint-Simon foi seu principal intelectual. Ele não era defensor de uma revolução e da abolição da propriedade privada, mas de uma tecnocracia governamental e uma base econômica industrial em que não houvesse ociosos e explorados, mas compartilhamento na produção e usufruto da riqueza.

Advogava um Estado forte que arbitrasse a economia e instituições fortes que distribuíssem os dividendos do progresso industrial e científico, conferindo aos pobres uma boa formação intelectual e qualidade de vida. Saint-Simon ressaltava a necessidade de que os ricos compreendessem que viabilizar melhores condições de subsistência aos pobres seria bom para a sociedade como um todo, incluindo eles próprios. Esse filósofo também era crítico da grande influência social exercida pela nobreza, pelo clero e pelos militares.

O segundo teórico mais importante do socialismo utópico, Charles Fourier, propunha a criação de sociedades comunitárias independentes da sociedade capitalista. Elas dependeriam do capital privado e teriam sua economia baseada na indústria. Ele não propunha a igualdade absoluta, mas que as diferenças de renda não fossem muito grandes. Assim como Fourier, Robert Owen idealizava comunidades independentes dentro da sociedade capitalista, porém baseadas na igualdade absoluta, tendo por único critério de hierarquia a idade.

Para os socialistas utópicos, a indústria era o vetor do desenvolvimento econômico e para melhores condições de vida. Eles não defendiam a aniquilação do sistema capitalista. A nomenclatura “utópico” é decorrente da crítica que Marx e Engels, precursores da segunda vertente socialista, faziam a eles. Eles criticavam o socialismo utópico por apresentar um modelo de sociedade, mas não apontar os instrumentos para que ele fosse colocado em prática.

  • Socialismo científico

Socialismo científico é a corrente de pensamento protagonizada por Marx e Engels. No século XIX, esses teóricos debruçaram-se na construção e divulgação de uma análise econômica da história. O socialismo científico, também conhecido como marxismo, propõe a compreensão científica de como o capitalismo funciona para poder substituí-lo por um regime econômico igualitário. Para seus autores, todos os períodos da História e todos os modelos econômicos foram estruturados sobre a luta de classes. No sistema capitalista, o antagonismo entre opressor e oprimido se apresentou principalmente em dois grupos:

  • o seleto grupo burguês: composto por donos dos grandes meios de produção, como as grandes propriedades rurais e as grandes fábricas;

  • o grande grupo do proletariado: trabalhadores assalariados que dispunham somente de sua força de trabalho e produziam a riqueza sem, contudo, desfrutar dela, recebendo apenas baixas remunerações.

Para Marx e Engels, a conscientização do proletariado sobre sua condição e, a partir disso, sua organização política constituíam o caminho revolucionário para debelar o capitalismo e construir em seu lugar uma sociedade igualitária. O socialismo seria marcado pela abolição da propriedade privada e pela socialização dos meios de produção, isto é, terras, indústria, todos os ativos de produção de riqueza pertenceriam à sociedade e seriam controlados pelo Estado e pela economia planificada, com o Estado dirigindo os setores econômicos, definindo preços e salários, regulando o mercado. Após a aniquilação das desigualdades por meio da interferência estatal, o próprio Estado seria abolido, e a sociedade seria livre e sem classes. O socialismo faria a transição para o comunismo.

Veja também: Consciência de classe – percepção do próprio papel no sistema produtivo

Experiências socialistas

  • Comunidade de Robert Owen

O autor socialista Robert Owen logrou construir uma comunidade baseada no seu ideal de sociedade. Nela, os salários dos trabalhadores eram altos, e os lucros dos sócios, limitados. Parte do lucro era investida em melhorias para a coletividade, o tempo de trabalho era menor que em outros lugares e, durante crises econômicas, os funcionários não eram demitidos ou desamparados. Todavia, a comunidade só funcionava harmonicamente sob sua liderança e, por fim, foi desfeita após brigas internas.

  • Comuna de Paris

A Comuna de Paris foi uma tentativa de implementação de um governo socialista. Em 1871, a classe operária revoltou-se contra o governo francês e, com o apoio da Guarda Nacional, tomou o poder em Paris. Seu governo era composto por 90 representantes de diferentes correntes socialistas eleitos por sufrágio universal masculino — mulheres não puderam votar.

As principais mudanças realizadas por esse governo foram:

  • a redução da jornada de trabalho;

  • fixação de salário mínimo para trabalhadores;

  • ensino gratuito para todos;

  • autogestão nas fábricas;

  • separação entre Igreja e Estado.

O governo operário durou 72 dias. Apoiado pelo exército prussiano, o governo francês derrubou a comuna e recuperou o poder.

  • União Soviética

A adoção do ideário socialista por um país inteiro ocorreu pela primeira vez no século XX, na Rússia, que, em 1922, unificada a outros países, formou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que foi agregando países do Leste Europeu. Em 1917 a monarquia czarista foi derrubada por uma revolução que resultou em guerra civil. O Partido Bolchevique alçou ao poder Vladimir Lenin, sucedido por Joseph Stalin.

 Assembleia de deputados operários e soldados durante o Governo Provisório Russo, em março de 1917, antes da tomada do poder pelos bolcheviques.
Assembleia de deputados operários e soldados durante o Governo Provisório Russo, em março de 1917, antes da tomada do poder pelos bolcheviques.

O último líder da União Soviética foi Mikhail Gorbachev, que renunciou em 1991, ano em que a URSS foi dissolvida. Em seus anos finais, a URSS era composta por 15 países:

  • Armênia;

  • Azerbaijão;

  • Bielorússia (Belarus);

  • Estônia;

  • Geórgia;

  • Cazaquistão;

  • Kirgiziya (Quirguistão);

  • Letônia;

  • Lituânia;

  • Moldávia (Moldova);

  • Rússia;

  • Tadjiquistão;

  • Turcomenistão;

  • Ucrânia;

  • Uzbequistão.

Essa experiência é denominada “socialismo real” e foi precursora de regimes de economia planificada em outros lugares do mundo. É importante observar que, embora se baseie no socialismo científico em sua fundação sob a liderança de Lenin, não correspondeu ao que é preconizado nos escritos de Marx e Engels a partir do governo de Stalin. A hegemonia do Partido Bolchevique foi conquistada pela expulsão, exílio e execução de socialistas de vertentes distintas e mesmo de correligionários do partido. Stalin não seguiu o ideário de abolição de classes e do Estado, mas fortaleceu este sob o seu comando e cometeu incontáveis violações dos Direitos Humanos. Para saber mais sobre como se deu essa experiência socialista, leia: União Soviética.

  • Alemanha Oriental

A Alemanha, após a Segunda Guerra Mundial, dividiu-se em duas: a Alemanha Ocidental e a Alemanha Oriental. Esta, apoiada pela União Soviética, desenvolveu um governo socialista de 1949 até 1990, caracterizado por uma economia planificada.

A alta emigração, principalmente de jovens, para a Alemanha Ocidental, foi o motivo para que se construísse um muro em 1961, que ficou conhecido como Muro de Berlim. Em 1989, o muro foi derrubado, e o governo alemão, reunificado. A queda do Muro de Berlim é um marco no enfraquecimento do socialismo como modelo de governo.

Ruína do Muro de Berlim (2010). A queda desse muro, em 1989, foi por muitos considerada o triunfo do capitalismo sobre o socialismo. [1]
Ruína do Muro de Berlim (2010). A queda desse muro, em 1989, foi por muitos considerada o triunfo do capitalismo sobre o socialismo. [1]
  • Outras experiências socialistas

Muitos países que realizaram experiências socialistas o fizeram apoiados pela União Soviética, especialmente após o fim da Segunda Guerra Mundial, em que o exército russo teve um papel decisivo na derrota do nazismo. É importante lembrar o período da Guerra Fria, em que EUA e URSS, movidos por disputas políticas e econômicas, financiaram e apoiaram governos e golpes de Estado de direita, no caso dos EUA, e socialistas, no caso da URSS.

Na década de 1960, alguns países africanos que estavam em processos de independência política das colônias aderiam a ideais socialistas, adaptando-os à história e cultura africanas, num movimento que ficou conhecido como socialismo africano, em que se destacaram o governo da

  • Tanzânia;

  • Senegal;

  • Gana;

  • Guiné.

Embora norteados pelas ideias de desenvolvimento social, setor público forte e planos econômicos geridos pelo Estado, afastavam-se das ideias clássicas do socialismo europeu de luta de classes.

Alguns países que tiveram experiências socialistas que se encerraram no início da década de 1990 foram:

  • Afeganistão;

  • Albânia;

  • Angola;

  • Benim;

  • Bulgária;

  • Congo;

  • Etiópia;

  • Hungria;

  • Iêmen;

  • Iugoslávia;

  • Moçambique;

  • Mongólia;

  • Polônia;

  • Romênia;

  • Somália;

  • Checoslováquia.

Acesse também: O nazismo era de esquerda ou de direita?

Autores socialistas

Os primeiros pensadores socialistas, do chamado socialismo utópico, foram:

  • Claude-Henri de Rouvroy, conhecido como Conde de Saint-Simon (1760-1825);

  • Charles Fourier (1772-1837);

  • Louis Blanc (1811-1882);

  • Robert Owen (1771-1858).

Os principais autores do chamado socialismo científico são:

  • Karl Marx (1818-1883);

  • Friedrich Engels (1820-1895).

Países que se consideram socialistas

  • República Democrática Popular da Coreia do Norte: fundada a partir de uma fragmentação da Coreia em duas nações, em 1948. A Coreia socialista foi apoiada pela URSS, e a Coreia capitalista foi apoiada pelos EUA. A Coreia do Norte tem um governo rígido e uma economia baseada na indústria pesada e na agricultura.

  • República Popular da China: o regime socialista foi implantado em 1949. Manteve relação próxima com a URSS até meados da década de 1960. Hoje é definida como socialismo de mercado, já que possui uma estrutura política socialista, mas uma estrutura econômica capitalista, que vem se expandindo desde os anos 1970.

     

Bandeira da China na muralha da China, um país socialista.
A China combina um governo ditatorial de partido único com abertura comercial e é uma das maiores potências econômicas do mundo.
  • República de Cuba: país em que o socialismo foi adotado a partir da Revolução Cubana (1959). Mantém-se norteado por princípios socialistas, como serviços públicos centralizados no Estado, destacando-se principalmente por sua medicina. A economia planificada foi por muito tempo alvo de embargos e sanções de outros países.

  • República Socialista do Vietnã: nação que adotou o socialismo em 1976, após a guerra contra os EUA. A partir da década de 1990, passou por reformas econômicas e hoje possui um regime parecido com o chinês. Além da agricultura, fortaleceu o setor industrial, atraiu capital estrangeiro, cresceu economicamente e hoje integra os “Novos Tigres Asiáticos”.

Outros países que se definem como socialistas atualmente são:

  • República Democrática Popular do Laos;

  • República Moldava da Transnístria.

Todos, em maior ou menor medida, são influenciados pelo capitalismo transnacional.

Diferença entre socialismo e comunismo

Na teoria marxista, o socialismo seria uma etapa para a construção do comunismo e um período de transição gradativa. O comunismo seria uma organização social onde não haveria divisão de classes nem Estado. Para desenvolvê-la, era necessário um período em que a sociedade controlasse a produção e distribuição de riqueza, promovendo a cooperação nas relações de trabalho e a igualdade na redistribuição dos bens produzidos.

Esse controle social se daria mediante o Estado, que equalizaria os processos produtivos até que cada trabalhador pudesse apropriar-se do produto de seu trabalho sem que isso desapossasse a outrem ou limitasse a si mesmo. Então viria o comunismo, em que a sociedade regularia a produção, mas não imporia a ninguém uma atividade fixa para sua subsistência. O homem livre poderia “Caçar de manhã, pescar a tarde, pastorear à noite e fazer crítica depois da refeição (...) sem por isso me tornar exclusivamente caçador, pescador ou crítico”|1|.

O comunismo seria o fim, e o socialismo seria o meio de alcançá-lo a partir da socialização dos meios de produção e do seu controle temporário pelo Estado até que a organização social fosse colaborativa e igualitária a ponto de o comunismo poder ser exercido. Curiosamente, nenhuma experiência real de tentativa de socialismo caminhou para essa definição marxista de comunismo. O que na prática dos países se costuma chamar de “comunismo” é justamente o fechamento dos regimes e a centralização do controle estatal, o oposto do que o marxismo preconizava. Portanto, nunca houve um país, de fato, comunista.

Como aponta o cientista político Archie Brown|2|:

“Marx e Lênin detalharam muito pouco sobre o sistema político e as instituições que existiriam em um país socialista, o que deixou muitas questões em aberto. Os países tiveram que desenvolver suas próprias instituições. Mesmo assim pelo que vimos nas tentativas comunistas na prática não pareciam nada com os ideais propostos originalmente”.

Veja também: Diferença entre esquerda e direita

Diferença entre socialismo e capitalismo

O capitalismo é um modelo econômico baseado:

  • na propriedade privada;

  • no mercado regulado pela relação oferta-demanda;

  • na produção de riqueza orientada pelo lucro e pela acumulação.

O socialismo é um modelo econômico baseado:

  • na propriedade coletiva;

  • no Estado forte que recebe da sociedade a procuração para gerir o processo de produção de riqueza e distribuí-la de maneira igualitária entre os membros da sociedade.

Na vertente utópica, o socialismo seria um reformador do capitalismo que o regulasse e o equalizasse de modo a diminuir as desigualdades sociais. Na vertente revolucionária, o socialismo seria um caminho de transição do capitalismo para o comunismo, operando politicamente para modificar as bases econômicas da sociedade.

A rigor não existe mercado totalmente livre de regulação. O capitalismo e os Estados nacionais emergiram juntos, e os governos são os fiadores desse modelo econômico, garantindo a propriedade privada e atuando com mais força em momentos de crise. Em princípio não existe ou existiu sociedade socialista plenamente compatível com o ideário utópico ou marxista. As experiências concretas baseadas nas ideias comunistas desembocaram em ditaduras de Estados totalitários.

Por outro lado, o socialismo democrático, ou social-democracia, foi promovido com êxito em democracias representativas, especialmente nos países nórdicos, sob propostas de:

  • serviços públicos de saúde, educação e segurança gratuitos;

  • operariado protegido por leis trabalhistas;

  • capitalismo competitivo, porém fiscalizado pelo sistema de Justiça e agências reguladoras.

Notas

|1| MARX e ENGELS. A ideologia alemã.

|2| BUARQUE, Daniel. Duas décadas após queda do muro, comunismo se mantém vivo como utopia.

Crédito da imagem

[1] aldorado / Shutterstock

Publicado por Milka de Oliveira Rezende
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