Regência verbal
A regência verbal é a relação de dependência entre um verbo (o termo regente) e seus complementos (o termo regido, ou seja, subordinado ao verbo). Geralmente, os complementos são ligados ao verbo por meio de preposição. Além da regência verbal, existe a regência nominal, estabelecendo relação de subordinação entre um nome e seus complementos.
Leia também: Vozes verbais — as relações entre o sujeito do enunciado e o verbo ao qual está ligado
Videoaula sobre regência verbal
O que é regência verbal?
Na gramática, a regência verbal é a relação de dependência entre um verbo e seus complementos. O verbo é o termo regente, ou seja, o termo independente, enquanto os complementos são os termos regidos pelo verbo, ou seja, que dependem do verbo e estão ligados a ele para fazer sentido no enunciado.
Como ocorre a regência verbal?
Uma vez que a regência verbal estabelece a relação de subordinação entre um verbo e seus complementos, o verbo então pode ocorrer de duas formas. Quando ele precisa de complemento e se liga a esse complemento por meio de preposição, é chamado de verbo transitivo indireto. Contudo, se o verbo não precisar de nenhuma preposição para se ligar ao complemento, ele é chamado de transitivo direto. Observe nos casos a seguir:
Eu falarei com a minha mãe mais tarde.
Nesse caso, o verbo “falar” precisou da preposição “com” para se ligar ao complemento “a minha mãe”. Assim, a regência desse verbo é “falar com”, logo, trata-se de um verbo transitivo indireto.
Agora, veja outro caso:
Eu vi meu cachorro tomando Sol.
Nesse outro caso, o verbo “ver” não precisou de nenhuma preposição, ligando-se diretamente ao complemento “meu cachorro”. Por isso, é um verbo transitivo direto.
Importante: Um mesmo verbo pode ter regências diferentes de acordo com o seu significado. Veja o caso do verbo “assistir”:
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Assistir (sinônimo de “ver”): Eu sempre assisto a séries muito tristes... (assistir a)
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Assistir (sinônimo de “ajudar”): Eu sempre assisto pessoas em dificuldade. (sem preposição)
→ Exemplos de como ocorre a regência verbal
Agora, veja a regência de alguns verbos muito comuns.
◦ Regência do verbo “chegar”
Regência: chegar a
Exemplo: Não chegamos a lugar algum…
◦ Regência do verbo “ir”
Regência: ir a
Exemplo: Quando será que iremos à praia de novo?
◦ Regência do verbo “namorar”
Regência: namorar (sem preposição)
Exemplo: Eu namorei o Carlos por muitos anos.
◦ Regência do verbo “querer”
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Verbo “querer” com sentido de “desejar”:
Regência: querer (sem preposição)
Exemplo: Eu não queria nada, apenas descansar.
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Verbo “querer” com sentido de “estimar”:
Regência: querer a
Exemplo: Ela quer muito bem a seus entes queridos.
◦ Regência do verbo “esquecer”
Regência: esquecer (sem preposição)
Exemplo: Eu não posso esquecer esse documento!
Importante: Se preposicionado, a regência muda.
Regência: esquecer-se de
Exemplo: Eu não posso me esquecer desse documento!
◦ Regência do verbo “lembrar”
Regência: lembrar (sem preposição)
Exemplo: Ele não lembrou meu nome...
Importante: Se preposicionado, a regência muda.
Regência: lembrar-se de
Exemplo: Ele não se lembrou do meu nome...
◦ Regência do verbo “aspirar”
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Verbo “querer” com sentido de “respirar” ou de “absorver”:
Regência: aspirar (sem preposição)
Exemplo: Aspirou o perfume com muita delicadeza.
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Verbo “querer” com sentido de “ter por objetivo”:
Regência: aspirar a
Exemplo: Ela aspirava ao título de melhor jogadora de futebol.
◦ Regência do verbo “obedecer”
Regência: obedecer a
Exemplo: Obedecer à família é importante!
Veja também: Quais são os verbos intransitivos?
Qual é a diferença entre regência verbal e regência nominal?
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Regência verbal: é a regência que estabelece relação entre o verbo e seus termos subordinados. Observe os exemplos:
Eu sempre me apaixono pelas pessoas erradas…
(Regência do verbo “apaixonar-se”: “apaixonar-se por”)
Ela confia em nossa equipe.
(Regência do verbo “confiar”: “confiar em”)
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Regência nominal: é a regência que estabelece relação entre o nome (um substantivo, um adjetivo ou um advérbio, por exemplo) e seus termos subordinados. Observe os exemplos:
Sou apaixonado por doces!
(Regência do adjetivo “apaixonado”: “apaixonado por”)
Ela tem medo de altura!
(Regência do substantivo “medo”: “medo de”)
Exercícios resolvidos sobre regência verbal
Questão 1
(Ibade – Adaptado) Leia o texto a seguir e responda à questão.
A ÁGUIA E A GALINHA
Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo cativo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração própria para galinhas. Embora a águia fosse a rainha de todos os pássaros.
Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
— Esse pássaro não é uma galinha. É uma águia.
— De fato — disse o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase três metros de extensão.
— Não — retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.
— Não, não — insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:
— Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe!
A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor e as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou pra junto delas.
O camponês comentou:
— Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
— Não — tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia. E uma águia será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.
No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurrou-lhe:
— Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!
Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou e foi para junto delas.
O camponês sorriu e voltou à carga:
— Eu lhe havia dito, ela virou galinha!
— Não — respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar.
— No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha. O sol nascente dourava os picos das montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
— Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse uma nova vida. Mas não voou. Então o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.
Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou com o típico kau-kau das águias e ergueu-se soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a voar cada vez para mais alto. Voou... voou... até confundir-se com o azul do firmamento...
(História narrada pelo educador popular James Aggrey)
Quanto à regência verbal, todas as alternativas estão corretas, EXCETO em:
A) Esqueci de todos os argumentos do naturalista.
B) Todo esforço implica reação favorável a ele.
C) Não me lembro desse fato tão impressionante.
D) Custa-nos crer que tenha conseguido voar.
E) A vizinhança assistiu ao voo emocionada.
Resolução:
Alternativa A
O verbo “esquecer” não é acompanhado de preposição.
Questão 2
(Cesgranrio – Adaptado) Leia o texto a seguir e responda à questão.
É preciso voltar a gostar do Brasil
Muitos motivos se somaram, ao longo da nossa história, para dificultar a tarefa de decifrar, mesmo imperfeitamente, o enigma brasileiro. Já independentes, continuamos a ser um animal muito estranho no zoológico das nações: sociedade recente, produto da expansão europeia, concebida desde o início para servir ao mercado mundial, organizada em torno de um escravismo prolongado e tardio, única monarquia em um continente republicano, assentada em uma extensa base territorial situada nos trópicos, com um povo em processo de formação, sem um passado profundo onde pudesse ancorar sua identidade. Que futuro estaria reservado para uma nação assim?
Durante muito tempo, as tentativas feitas para compreender esse enigma e constituir uma teoria do Brasil foram, em larga medida, infrutíferas. Não sabíamos fazer outra coisa senão copiar saberes da Europa (...) Enquanto o Brasil se olhou no espelho europeu só pôde construir uma imagem negativa e pessimista de si mesmo, ao constatar sua óbvia condição não europeia.
Houve muitos esforços meritórios para superar esse impasse. Porém, só na década de 1930, depois de mais de cem anos de vida independente, começamos a puxar consistentemente o fio da nossa própria meada. Devemos ao conservador Gilberto Freyre, em 1934, com Casa-grande & senzala, uma revolucionária releitura do Brasil, visto a partir do complexo do açúcar e à luz da moderna antropologia cultural, disciplina que então apenas engatinhava. (...) Freyre revirou tudo de ponta-cabeça, realizando um tremendo resgate do papel civilizatório de negros e índios dentro da formação social brasileira. (...) A colonização do Brasil, ele diz, não foi obra do Estado ou das demais instituições formais, todas aqui muito fracas.
Foi obra da família patriarcal, em torno da qual se constituiu um modo de vida completo e específico. (...) Nada escapa ao abrangente olhar investigativo do antropólogo: comidas, lendas, roupas, cores, odores, festas, canções, arquitetura, sexualidade, superstições, costumes, ferramentas e técnicas, palavras e expressões de linguagem. (...) Ela (a singularidade da experiência brasileira) não se encontrava na política nem na economia, muito menos nos feitos dos grandes homens. Encontrava-se na cultura, obra coletiva de gerações anônimas. (...)
Devemos a Sérgio Buarque, apenas dois anos depois, com Raízes do Brasil, um instigante ensaio — “clássico de nascença”, nas palavras de Antônio Cândido — que tentava compreender como uma sociedade rural, de raízes ibéricas, experimentaria o inevitável trânsito para a modernidade urbana e “americana” do século 20. Ao contrário do pernambucano Gilberto Freyre, o paulista Sérgio Buarque não sentia nostalgia pelo Brasil agrário que estava se desfazendo, mas tampouco acreditava na eficácia das vias autoritárias, em voga na década de 1930, que prometiam acelerar a modernização pelo alto. Observa o tempo secular da história. Considera a modernização um processo. Também busca a singularidade do processo brasileiro, mas com olhar sociológico: somos uma sociedade transplantada, mas nacional, com características próprias. (...) Anuncia que “a nossa revolução” está em marcha, com a dissolução do complexo ibérico de base rural e a emergência de um novo ator decisivo, as massas urbanas.
Crescentemente numerosas, libertadas da tutela dos senhores locais, elas não mais seriam demandantes de favores, mas de direitos. No lugar da comunidade doméstica, patriarcal e privada, seríamos enfim levados a fundar a comunidade política, de modo a transformar, ao nosso modo, o homem cordial em cidadão.
O esforço desses pensadores deixou pontos de partida muito valiosos, mesmo que tenham descrito um país que, em parte, deixou de existir. O Brasil de Gilberto Freyre girava em torno da família extensa da casa-grande, um espaço integrador dentro da monumental desigualdade; o de Sérgio Buarque apenas iniciava a aventura de uma urbanização que prometia associar-se a modernidade e cidadania.
BENJAMIN, César. Revista Caros Amigos. Ano X, no 111. jun. 2006. (adaptado)
Assinale a opção em que há uso INADEQUADO da regência verbal, segundo a norma culta da língua.
A) É interessante a obra de Freyre com a qual a de Sérgio Buarque compõe uma dupla magistral.
B) É necessário ler estes livros nos quais nos vemos caracterizados.
C) Chico Buarque, por quem os brasileiros têm grande admiração, é filho de Sérgio Buarque.
D) É tão bom escritor que não vejo alguém de quem ele possa se comparar.
E) Valoriza-se, sobretudo, aquele livro sob cujas leis as pessoas traçam suas vidas.
Resolução:
Alternativa D
Para seguir a norma-padrão, seria necessário alterar a preposição para a seguinte: “É tão bom escritor que não vejo alguém com quem ele possa se comparar”.
Fontes
AZEREDO, José Carlos de. Gramática Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo: Parábola, 2021.
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 38ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
CEGALLA, Domingos Paschoal. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2020.
CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 7ª ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2016.