Contrarreforma

A Contrarreforma foi uma reação da Igreja Católica ao avanço da Reforma Protestante em meados do século XVI. O clero se reuniu no Concílio de Trento, entre 1545 e 1563, no qual reforçou a doutrina católica, tão questionada pelas novas igrejas cristãs; a infalibilidade do Papa e o investimento na formação de padres missionários para levar a mensagem católica para outras regiões do mundo.

Outras medidas da Contrarreforma foram a proibição da circulação de livros que fossem contrários ao pensamento católico e a instituição do Tribunal da Santa Inquisição, que julgou aqueles considerados hereges, sendo alguns condenados à morte na fogueira em praça pública. Tanto a Reforma como a Contrarreforma tiveram consequências na Europa e em outras regiões do mundo.

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Contexto histórico da Contrarreforma

Estátua de Lutero localizada em Frauenkirche. O reformador é representado segurando a Bíblia, pois foi ele quem a traduziu do grego para o alemão. [1]

A Europa do começo do século XIV se agitava por conta da Reforma Protestante. Quando o padre agostiniano Martinho Lutero afixou as 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, não se imaginavam as consequências daquele ato. O religioso questionava práticas do clero católico, como a cobrança de indulgências, afinal, o fiel não precisava mais se arrepender dos pecados para obter o perdão, mas sim depositar algumas moedas nos cofres das igrejas que a alma já estava absolvida. Lutero foi excomungado pelo Papa Leão X e considerado herege por Carlos V, imperador do Sacro Império Germânico.

A imprensa foi um instrumento importante na divulgação das ideias de Lutero, que traduziu a Bíblia para a língua alemã e teve na imprensa uma possibilidade de disseminar o acesso à Sagrada Escritura na língua vernácula. A Igreja Católica perdeu, com isso, o seu monopólio da leitura e interpretação da Bíblia. E o movimento iniciado por Lutero abriu espaço para que outras igrejas cristãs fossem fundadas.

A Reforma Protestante não alterou apenas os rumos do cristianismo na Europa, atingindo também a política. A formação dos Estados Nacionais fortaleceu o poder dos reis, que se tornavam absolutistas. Muitos monarcas aproveitaram o movimento religioso para questionar os poderes do Papa, pois não queriam interferência em seu reino. O poder terrestre pretendia se afastar do poder espiritual.

Nessa época, a burguesia era uma classe social em ascensão e o comércio se consolidava como a atividade econômica mais importante da Europa. A Igreja Católica era um obstáculo às práticas comerciais burguesas, pois era contra a cobrança da usura, ou seja, dos juros.

As igrejas cristãs que surgiram após a Reforma Protestante mudaram a visão sobre o comércio. Valorizavam o trabalho e não condenavam o lucro. Max Weber percebeu a relação entre a ascensão burguesa e o surgimento das igrejas protestantes no livro “A ética protestante e o espírito do capitalismo”.

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Concílio de Trento

A resposta da Igreja Católica à Reforma Protestante foi a Contrarreforma, que foi pensada entre os anos de 1545 e 1563, na cidade italiana de Trento. Um concílio foi convocado pelo Papa Paulo III para que o alto clero católico se reunisse para reagir à cisão promovida pela Reforma. O Concílio de Trento pretendia reforçar a doutrina católica, tão contestada pelas novas igrejas cristãs, e combater as heresias, mantendo a unidade dentro do catolicismo.

Nesse contexto, o concílio proibiu a cobrança de indulgências, estopim da Reforma, e a circulação de livros contrários às normas da Igreja. Com o surgimento da imprensa, a publicação de livros avançou consideravelmente, e o clero considerou isso um dos motivos para o rápido crescimento do protestantismo pela Europa. Para evitar que esses livros continuassem em circulação, a Igreja Católica criou o Index Librorum Proibitorum, uma lista com as publicações com circulação proibida. Apesar dessa proibição, os livros continuaram circulando de forma clandestina.

O Concílio de Trento ocorreu no Convento de Santo Estevão e marcou o início da Contrarreforma, a reação à Reforma Protestante. [2]

A Reforma Protestante

Depois de 1500 anos, o cristianismo no continente europeu sofreu uma ruptura. Desde o final do Império Romano do Ocidente, no século IV d.C., que a Igreja Católica era a única igreja cristã na Europa. Essa instituição atravessou mais de mil anos de Idade Média, sendo a guardiã do cristianismo. Era o único caminho para a salvação, o único meio para se chegar ao paraíso. O poder da Igreja era representado por suas imensas catedrais e, principalmente, pelo Vaticano, localizado em Roma, onde morava o Papa.

Em 1506, começou a construção da Basílica de São Pedro, no Vaticano. Para angariar recursos, os religiosos pediam ajuda financeira dos seus fiéis. Para que essas contribuições aumentassem e fossem constantes, estabeleceu-se um jogo de trocas: o fiel que quisesse ter a indulgência, ou seja, o perdão dos pecados, para si ou para algum parente já falecido, deveria depositar uma quantia para a Igreja. Os fiéis mais pobres gastavam tudo o que tinham para salvar a sua alma ou de alguém já falecido.

Martinho Lutero, que era um padre agostiniano, percebendo o absurdo que era a cobrança de indulgências, decidiu afixar na porta da Igreja de Wittenberg as suas 95 teses, nas quais ele pretendia iniciar um debate com o clero católico sobre os abusos praticados na concessão do perdão dos pecados.

Apesar das várias medidas tomadas para punir Lutero, a Reforma Protestante se espalhou rapidamente por toda a Europa. A imprensa teve grande contribuição na disseminação das ideias luteranas, pois as suas publicações eram impressas e divulgadas rapidamente. A Igreja Católica, que durante toda a Idade Média monopolizou a circulação de ideias e a publicação de livros, já não tinha mais a mesma força de controle no começo do século XVI.

Várias igrejas cristãs surgiram logo após Lutero, como a anglicana e a calvinista. Cada uma defendia a sua própria visão sobre o Evangelho de Jesus, sobre a conduta humana e sua relação com o poder.

As tensões envolvendo as novas igrejas cristãs provocaram guerras religiosas, que forçaram inúmeros europeus a buscarem outras terras para morar. A Inglaterra foi um dos reinos onde a religião causou guerras, o que levou muitos ingleses para a América recém-descoberta, onde encontraram uma nova oportunidade para refazer suas vidas e praticar seus ritos religiosos sem perseguições.

A Reforma Protestante não ficou presa apenas ao questionamento de práticas erradas do clero católico e nem de abusos relacionados às indulgências, mas se alastrou para áreas como a política, economia, sociedade e cultura. Pode-se dizer que os ecos tanto da Reforma como da Contrarreforma foram ouvidos em todos os cantos do mundo. Para saber mais sobre o início desse conflito religioso, leia: Reforma Protestante.

A Contrarreforma

O Papa Paulo III foi quem organizou o Concílio de Trento, com o objetivo de discutir estratégias para barrar o avanço protestante na Europa.

A Igreja Católica precisava urgentemente se posicionar perante o avanço das novas igrejas cristãs, dos reis que aproveitaram o movimento protestante para se opor ao Papa e da perda de fiéis. A resposta dela a todo o movimento iniciado pela Reforma foi chamada de Contrarreforma. Reunida em Trento, a Igreja:

  • estabeleceu normas;
  • reforçou seus ensinamentos; e
  • iniciou o combate a heresias e novas igrejas.

Além disso, ela retomou sua atividade missionária, avançando a catequese para as regiões mais distantes do mundo, como a Ásia e a América.

A Companhia de Jesus foi criada por Inácio de Loyola, para formar padres missionários que pudessem levar a mensagem católica para outras regiões do mundo. Os padres jesuítas, como eram conhecidos os religiosos dessa congregação, embarcaram juntamente com portugueses e espanhóis na conquista do Novo Mundo. Na América, os jesuítas tiveram como missão catequizar os indígenas e estabelecer arcebispados nesses lugares.

Outra medida tomada pela Igreja Católica ao longo da Contrarreforma foi a instalação dos Tribunais da Santa Inquisição. Os hereges, ou seja, aqueles que contestavam as doutrinas católicas, eram julgados e, caso fossem condenados, eram excomungados ou até mesmo mortos na fogueira.

No começo da Modernidade, vários cientistas começaram a estudar o funcionamento do Universo e, se a descoberta fosse contrária à concepção católica do mundo, esses cientistas poderiam ser punidos pela Inquisição. Giordano Bruno foi um dos pensadores da ciência moderna julgados pelo tribunal eclesiástico. Como ele se recusou a negar seus estudos, foi condenado à morte na fogueira.

Durante o Jubileu do ano 2000, o Papa João Paulo II promoveu uma revisão da atitude da Igreja Católica ao longo dos séculos. Ele reconheceu vários erros cometidos pelo clero durante a Inquisição, como os julgamentos de Giordano Bruno e Joana D’Arc, que morreram na fogueira, bem como de Galileu Galilei, que renegou seus estudos. Os sucessores de João Paulo II — Bento XVI e Francisco — tomaram medidas no sentido de abrir os arquivos do Vaticano para que outros estudiosos pudessem ter acesso aos documentos históricos do período da Contrarreforma e analisar a atuação da Igreja Católica naquele período histórico.

Em 1995, o Papa João Paulo II esteve em Trento para celebrar os 450 anos do concílio que ocorreu nessa cidade. Em um discurso feito na mesma catedral que, em 1545, iniciou os trabalhos da Contrarreforma, Sua Santidade disse:

“Hoje lembramos de um grande evento na história da Igreja: lembremos-nos que o Conselho, que leva seu nome da cidade de Trento, justamente porque nesta Catedral começou há 450 anos, em 13 de dezembro de 1545, e aqui celebrou seus destaques. Deste evento extraordinário, que durou 18 anos, queremos, antes de tudo, agradecer a Deus que, apesar das incertezas dos homens e das dificuldades objetivas da época, ofereceu à sua Igreja uma oportunidade inestimável de graça e renovação religiosa. Diante da crise espiritual e eclesial do início dos anos 1500, a Igreja de Trento foi capaz de encontrar a coragem da fidelidade à Tradição Apostólica, o impulso de um compromisso renovado com a santidade, a força para um autêntico renascimento pastoral, de modo que não seja exagerado ao afirmar que o Conselho marcou e moldou toda uma era da Igreja e continua a produzir efeitos benéficos.”|1|

Resumo sobre a Contrarreforma

  • A Contrarreforma foi uma reação da Igreja Católica ao avanço das igrejas protestantes durante o século XVI, reafirmando os dogmas católicos e o poder do Papa.
  • A Reforma Protestante começou logo após Martinho Lutero afixar suas 95 teses na porta da Catedral de Wittenberg, na Alemanha.
  • Lutero foi excomungado e considerado herege, e sua atitude desencadeou o cisma no cristianismo ocidental.
  • A imprensa teve um papel significativo na disseminação das ideias protestantes, ao divulgar livros e a Bíblia, que foi traduzida por Lutero do grego para o alemão.
  • Algumas das medidas adotadas pela Igreja na Contrarreforma foram a criação do Tribunal da Santa Inquisição, a fundação da Companhia de Jesus e a defesa dos dogmas católicos e da infalibilidade do Papa.
  • A Reforma e a Contrarreforma promoveram guerras religiosas na Europa, fazendo com que muitas pessoas fugissem para a América, iniciando o povoamento do continente recém-conquistado pelos europeus.

Exercícios resolvidos

Questão 1 – A Reforma Protestante promoveu a divisão no cristianismo, e a Igreja Católica deixou de ser a única igreja cristã na Europa. Assinale a alternativa que indica a principal causa da Reforma.

A) A eleição do Papa Leão X, que não foi reconhecida pela metade do clero católico.

B) A crítica de Martinho Lutero à cobrança indevida de indulgências.

C) O fim do celibato para os padres.

D) A união do Papa com os reis absolutistas.

Resolução

Alternativa B. Martinho Lutero, ao afixar suas 95 teses na porta da Catedral de Wittenberg, pretendia chamar a atenção do clero e promover debate sobre a cobrança de indulgências, mas sua atitude desencadeou uma reforma religiosa, que abriu espaço para que outras igrejas cristãs surgissem.

Questão 2 – A Contrarreforma foi uma reação da Igreja Católica ao avanço da Reforma Protestante. Reunido no Concílio de Trento, o clero decidiu adotar algumas medidas para limitar a ação das novas igrejas cristãs. Uma dessas medidas foi:

A) a manutenção da cobrança de indulgências. A partir da Contrarreforma, os padres começaram a informar os fiéis de que o dinheiro seria destinado à construção da Basílica de São Pedro.

B) o reconhecimento de que Martinho Lutero estava certo em suas críticas, assim o Concílio de Trento anulou a sua excomunhão.

C) reforçar os dogmas da Igreja Católica e a infalibilidade do Papa, bem como promover o julgamento dos hereges no Tribunal da Inquisição.

D) retomar os ideais medievais das Cruzadas e formar soldados para entrar em confronto armado contra as novas igrejas cristãs que surgiram após a Reforma Protestante.

Resolução

Alternativa C. Com a Contrarreforma, a Igreja Católica reforçou sua doutrina e o poder exercido pelo Papa. Além disso, instituiu o Tribunal da Inquisição, que deveria julgar as práticas daqueles que não concordavam e atacavam as doutrinas católicas.

Nota

|1| Leia na íntegra aqui.

Créditos das imagens

[1] lunamarina / Shutterstock

[2] Shootdiem / Shutterstock

Publicado por Carlos César Higa
Português
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