Estado laico

Um Estado laico não pode adotar uma religião oficial, ou preterir ou privilegiar crenças, e deve garantir a liberdade para que todos cultuem ou não sua crença em divindades.
Estado laico é aquele que não adota religião oficial, promove a liberdade religiosa e protege, igualmente, aqueles que não optarem por uma crença.

Em um Estado laico, não se pode haver qualquer tipo de justificativa das ações políticas em Deus ou em qualquer divindade, levando-se em conta a vontade geral e o bem do povo, independente de crenças religiosas. A necessidade de separar a política e a administração pública da religião deu-se após diversos conflitos religiosos vivenciados pela humanidade.

Esse senso de liberdade religiosa foi bastante desenvolvido por Voltaire. Defensor da liberdade individual acima de tudo, o filósofo forneceu bases para o pensamento iluminista e para o republicanismo. A concepção republicana, surgida no século XVIII, que lutava veementemente contra o absolutismo, incorpora em sua tradição a defesa da liberdade religiosa e de uma concepção de Estado e de educação laicos.

Veja também: Secularização — processo de abandono de preceitos culturais religiosos

Como um Estado laico atua?

O Estado laico (ou Estado secular) não pode adotar uma crença religiosa e não pode privilegiar ou preterir crenças. Para tanto, é necessário que haja uma Constituição que garanta direitos iguais para todos os cidadãos, não importando a sua crença religiosa.

O poder público e seus agentes também não podem levar as suas crenças individuais para a administração pública. O Estado somente pode interferir quando há conflitos em relação à crença religiosa da população.

Assim como é assegurada a liberdade religiosa e de culto, deve ser assegurado também o direito de não acreditar em Deus ou divindades (ateísmo), de não frequentar templos religiosos e de suspender ou não emitir as suas convicções religiosas (agnosticismo).

Quando uma ação governamental (política pública, lei, decreto ou decisão judicial) acontece para privilegiar ou, de alguma forma, atingir um grupo religioso, há uma falha constitucional e reconhece-se um atentado contra o Estado laico. Nesse sentido, não há proibição de que agentes públicos cultuem ou não as suas religiões e crenças em suas vidas privadas, mas eles não podem levar tais crenças para o seu exercício profissional público.

Dessa maneira, não se pode deixar que decisões sobre assuntos importantes para a população, nos âmbitos do Legislativo, Executivo ou Judiciário, tenham interferência de uma ou outra crença religiosa. Nesses casos, deve ser respeitada a autonomia individual, e a posição adotada não pode interferir em questões religiosas, prejudicando ou favorecendo indivíduos por sua crença.

Há o consenso apenas de que alguns assuntos dogmáticos ou polêmicos dentro de algumas religiões interferem na vida da comunidade em geral. Nesse caso, deve-se pesar se a adoção da medida, mesmo contrariando um dogma religioso, será benéfica para o povo.

Estado laico ou secular é aquele que não adota uma religião oficial e não proíbe ou privilegia qualquer tipo de manifestação religiosa.

Outros tipos de Estado

Confira outros tipos de Estado, uma breve explicação de como funcionam e alguns exemplos de suas aplicações no mundo:

  •  Estado confessional

Quando um Estado adota uma religião oficial, ele é chamado de confessional. Alguns exemplos de países que adotam religiões oficiais são: Israel, oficialmente judeu; Costa Rica, declaradamente católica; Inglaterra, adotante do cristianismo anglicano; e Dinamarca, cuja religião oficial é o cristianismo luterano. 

Leia também: Estado laico e Estado religioso

  • Estado teocrático

O Sumo Pontífice da Igreja Católica é o líder do Estado do Vaticano, um pequeno território teocrático situado dentro de Roma e comandado pela Igreja Católica.

Quando há a proximidade irrestrita entre Estado e religião, de modo que a classe política legitima as suas ações por meio da figura de Deus, temos um Estado teocrático. A teocracia foi comum nos mundos antigo e medieval. Na contemporaneidade, a discussão sobre os Direitos Humanos, o Estado Democrático de Direito e as liberdades individuais traz fortes elementos para defender o fim das teocracias.

Exemplos de teocracias contemporâneas são: o Vaticano, comandado pelo Sumo pontífice da Igreja Católica (o papa); o Irã, que vive sob o regime comandado pelos aiatolás desde 1979; o Paquistão; o Afeganistão; os Emirados Árabes; e a Mauritânia.

Esses cinco últimos países são teocracias islâmicas, que adotam como sistema constitucional oficial a Lei Islâmica, que obriga os cidadãos a exercerem a fé e impõem restrições às pessoas baseadas nas escrituras sagradas.

Entre essas restrições, estão a liberdade das mulheres, que são fortemente vigiadas e reprimidas, e a proibição da homossexualidade, crime passível de prisão e até de pena de morte em países como Sudão, Irã e Arábia Saudita. Caso tenha mais interesse no assunto, leia nosso texto: Teocracia.

No Irã, como em outros Estados islâmicos, as mulheres devem esconder seus rostos com o véu e, em alguns casos, usar a burca, que cobre todo o corpo.
  • Estado ateu

Quando um Estado combate a religião por meio dos poderes públicos, esse é chamado de Estado ateu. Esse tipo de organização é tão prejudicial para a liberdade e a garantia dos Direitos Humanos quanto a organização política dos Estados teocráticos.

Tomamos como exemplo as ditaduras socialistas do século XX, em especial a da China e a da União Soviética, que tentaram dissolver as crenças religiosas em seus governos por questões de interpretação dos escritos de Marx e de manipulação ideológica da população.

A República Popular da China, durante o governo de Mao Tsé-Tung, destruiu templos budistas e proibiu a prática religiosa. Nesse período, o governo chinês criou um plano de conversão das igrejas, transformando-as em prédios públicos. A liberdade religiosa na China somente começou a ser restabelecida em 1979.

A União Soviética, por sua vez, sob o comando de Josef Stalin, destruiu igrejas e perseguiu líderes religiosos, além de fechar seminários e proibir a publicação de textos religiosos. A justificativa para tais atos estava na interpretação marxista-leninista do comunismo, defendida por Stalin, que foi implantada na União Soviética desde 1922. 

Josef Stalin implantou um Estado ateu na União Soviética que destruiu templos e perseguiu religiosos.

Educação laica e educação confessional

As primeiras escolas e universidades tais como conhecemos hoje foram fundadas durante a Idade Média. Por isso, até o fim da Modernidade, as instituições de ensino eram religiosas. Ordens cristãs, como a Companhia de Jesus, surgiram para levar a educação às populações excluídas, mas essa educação era religiosa. Os iluministas foram os primeiros a defender a universalidade de uma educação gratuita e laica, a fim de garantir o conhecimento, a igualdade de direitos e o avanço social.

Hoje existem escolas que oferecem uma educação laica (a maioria das instituições de ensino oficiais e particulares) e escolas que oferecem uma educação confessional (quando a escola é administrada por uma ordem religiosa e assume um tipo de ensino voltado para os valores e crenças daquela religião).

Quando surgiu o Estado laico no Brasil

A Primeira República do Brasil trouxe consigo uma inspiração positivista e os ideias republicanos para acabar com a ideologia monarquista. Ainda no governo provisório do Marechal Deodoro da Fonseca, antes da promulgação da Constituição de 1891, foi lançado o decreto 119-A, que visava a separar de vez a religião e o Estado.

Nessa medida, o Brasil deixou de ter uma religião oficial, foi instituído o casamento civil como instituição de reconhecimento legal, e os cemitérios passaram a ser geridos por órgãos ligados ao poder público, saindo das mãos da Igreja.

Martinho Lutero e o Estado laico

Grande reformador da Igreja, Martinho Lutero percebeu erros cometidos pela instituição reforçados ou permitidos pelo Estado e vice-versa.

O grande reformador da Igreja Martinho Lutero percebeu que erros cometidos pela Igreja eram reforçados ou permitidos pelo Estado e vice-versa. Em sua visão, tanto o Estado (ao qual chamou de Reino da Espada) quanto a religião (à qual chamou de Reino de Deus) eram criações divinas. Ele defendia ter sido necessário que Deus criasse o Estado porque os homens desvirtuavam-se da visão cristã e afastavam-se do reino de Deus.

Os dois reinos estavam, para ele, desvirtuados pela corrupção humana e precisavam ser reformados. A reforma deveria dar-se pelo reino de Deus. A visão de Lutero, apesar de adotar uma concepção religiosa de Estado e justificar a existência desse em Deus, parece apresentar uma teoria avançada para a época de que a corrupção de um domínio levava à corrupção de outro domínio.

Saiba mais: Reforma protestante

Publicado por Francisco Porfírio
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